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2020, um ano distinto: nova fase eleitoral, de grandes transformações

As mudanças efetivas no regramento eleitoral são anteriores e nada tem a ver com a pandemia que vivemos neste período

  • Flávio Fabiano
Publicado em 08/10/2020 às 10h00
Urna eletrônica usada nas eleições brasileiras
Urna eletrônica usada nas eleições brasileiras. Crédito: Nelson Jr./Ascom/TSE

Em razão do dinamismo que a sociedade evolui, ou involui, como em muitos casos, com a criação de novos meios de comunicação e de divulgação de dados, também se torna necessário que a legislação eleitoral esteja no mesmo ritmo, posto que o sistema de 20 ou 30 anos atrás não é o mesmo da atual era digital, em que há predomínio de redes sociais e de aplicativos de troca diretas e indiretas de mensagens.

Os aplicativos de trocas de mensagens e as redes sociais elevaram o alcance, o volume e a velocidade com que o eleitor recebe informações, ou melhor, com que é “bombardeado” por propagandas, que visam influenciá-lo, sendo algumas dessas de fatos reais e outras por notícias falsas, as fake news.

A Legislação Eleitoral, especialmente a Lei dos Partidos Políticos e a que rege as eleições, a partir de 2017 trouxe grandes e profundas modificações para as campanhas, o que em 2020 foi potencializado em razão da pandemia do coronavírus. Inclusive, a própria Constituição Federal foi objeto de Proposta de Emenda a Constituição (PEC) para alteração da data que serão realizadas as eleições.

As reformas são muitas!

Em 2020 a janela partidária, ou seja, período para troca de partido sem risco de perda do mandato por infidelidade partidária, encerrou-se dia 3 de abril de 2020, seis meses antes das eleições, diferentemente do que estabelece o inciso II, do artigo 29, da Constituição Federal.

Pelo novo regramento, o domicílio eleitoral pode ser registrado até 6 meses anteriores a eleição, sendo que antes era de um ano do dia da primeira votação.

Uma grande e considerável mudança se deu em relação à coligação partidária, que foi extinta na proporcional, ou seja, para o Legislativo (para os cargos de vereadores e deputados). Anteriormente, cada coligação partidária (aliança) poderia disputar as eleições com 200% do número de candidatos ao montante de vagas nas Câmara Municipais.

Com as mudanças, esse percentual se torna em 150% do número de vagas, porém para cada partido, excetuando-se nos casos de municípios com até 100 mil eleitores, onde poderão ser registradas candidaturas no total de até 200% do número de vagas a ser preenchido.

Com o fim das coligações proporcionais também se encerra o ciclo dos “puxadores de votos”, uma vez que cada partido terá que apresentar bons nomes em suas fileiras.

Para melhor explicar o fenômeno causado pelos “puxadores de votos” na coligações, num município com 500 mil habitantes, em que a Câmara Municipal pode ter até 25 vagas, com um total de somatório de votos válidos de 200 mil, o quociente eleitoral seria de 8 mil votos (200.000 votos/25 cadeiras), em que uma coligação alcançasse 50 mil votos, teria direito a 6 vagas no Legislativo, com sobras.

O reflexo dessas transformações é que partidos maiores terão mais chances dos que os menores, inclusive em razão dos recursos financeiros de que poderão lançar mão.

CLÁUSULA DE BARREIRA

Outro grande e fatal ponto de transformação foi o estabelecimento da cláusula de barreira, como forma de limitar os partidos políticos que não alcançaram um determinado número de vagas para a Câmara Federal e para o Senado, ou seja, para o Congresso Nacional. Mas o que isso significa?

No período anterior às alterações na legislação eleitoral bastava que o partido político tivesse uma bancada na Câmara Federal que teria direito ao fundo partidário e tempo de propaganda nos meios de comunicação (horário eleitoral gratuito).

Mas isso mudou, passando a obrigatoriedade de atingimento de desempenho mínimo nas eleições, de forma que os partidos políticos devem alcançar, minimamente, 1,5% dos total de votos válidos em pelo menos nove Estados, bem como, no mínimo, 1% dos votos válidos em cada um dos nove Estados ou eleger nove deputados federais por cada ente federado.

Destaca-se que pessoas jurídicas não podem mais fazer doações a partidos políticos para financiarem campanhas, ficando apenas permitido pessoas físicas, com limitação de até 10% dos rendimentos brutos que tiveram no ano anterior ao das eleições e arrecadar também via financiamentos coletivos individuais, as famosas “vaquinhas virtuais - crowdfunding”, nos termos da Lei nº. 13.488/2017, cujos requisitos estão determinados nos artigos 22 ao 25, da Resolução nº. 23.607/2029, do Tribunal Superior Eleitoral.

E como forma de equilibrar a disputa eleitoral e tentar impedir abusos de poder econômico por parte de partidos e candidatos, em tese, para privilegiar a isonomia entre os concorrentes, o financiamento das campanhas também ocorrerá via patrocínio com dinheiro público, pelo Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC, verba oriunda do Orçamento Geral da União.

A divisão do FEFC é realizada através de uma parcela pequena, que é dividida entre todos os partidos, e o seu excedente é rateado através de votação das legendas e de sua representação no Congresso Nacional, que terá destinação, entre outros, para o pagamento de honorários contábeis e advocatícios.

E, buscando criar mecanismos que criem condições que não privilegiam apenas pessoas que se declarem homens, as mulheres terão direito a 30% de FEFC em suas campanhas políticas

Outra transformação muito importante e que poderá trazer transtorno a muitos partidos políticos, mas especialmente aos candidatos, é que um ponto polêmico decorrente dessa reforma permite que todos os votos e suas percentagens sejam divulgados, inclusive daqueles com registros indeferidos, ou cassados, ou que estejam em caráter sub judice ou definitivo.

Preteritamente, o candidato que tinha o registro indeferido, não conhecido ou cancelado não constava nem em pesquisas eleitorais.

Entre as novidades, também haverá auditoria do sistema eletrônico de votação, que será realizado pelo Conselho Nacional de Justiça, pelo TCU, pelas Forças Armadas e pelos Institutos Estaduais de Criminalística.

Então, 2020 será um ano distinto, inaugurando uma nova fase para a política brasileira, de grandes transformações pelo dinamismo do regramento jurídico eleitoral.

Aliás, transformações essas que são anteriores e nada tem a ver com a pandemia que vivemos neste período, e tudo isso, graças às evoluções advindas dos famosos “caixa 2”, dos “abusos” de poder econômico, das doações e dos interesses de grandes conglomerados empresariais, das “trocas de favores”, das pessoas que se tornavam afortunadas de um dia para o outro para fins de “doarem” para seus “políticos de estimação”, dos avanços, alcance e poder que as redes sociais e os aplicativos de trocas de mensagens têm sobre os eleitores.

Mas as transformações legislativas não podem trazer mudanças profundas e reais na política brasileira, quem faz isso é a lei eleitoral.

O autor é advogado eleitoral e criminalista

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