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Codesa deve ser privatizada?

Codesa deve ser privatizada?

Medida, que deve também desencadear a concessão de outras companhias docas do país à iniciativa privada, aparece como uma das prioridades da pauta econômica do governo federal

Publicado em 1 de fevereiro de 2019 às 17:58

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(Arabson)

Um porto público com operação privada

Ernani Pereira Pinto é presidente do Sindicato Unificado da Orla Portuária (Suport-ES), entidade que representa os trabalhadores da Codesa

A privatização dos órgãos públicos é uma das prioridades do governo de Jair Bolsonaro, mas não uma necessidade, na visão dos portuários. Entendemos que a privatização do porto público é um risco para os trabalhadores, tanto para os que são vinculados à Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa) quanto para trabalhadores avulsos, operadores portuários e pequenos importadores e exportadores que geram emprego e renda. A demissão dos mais de 300 funcionários da Codesa seria quase inevitável. A contratação de carga também pode ser submetida a tarifas mais altas, portanto, menos atraentes para o mercado — sinal de que a suposta ideia de que o desenvolvimento chegaria com a privatização não iria à frente.

Há ainda o risco da insegurança jurídica, pois quem garante que a Lei 12.815/2013, a Lei dos Portos, não seria alterada para agradar aos novos donos dos portos? Além disso, o Estado não poderia ficar refém do setor privado num momento de oscilação do mercado, pois deixaria de trabalhar para o cidadão, mas sim para um segmento privado que está a serviço das negociatas políticas.

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As companhias docas, infelizmente, tornaram-se um centro de negócios, em que políticos escolhem seus apadrinhados

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As companhias docas, infelizmente, se tornaram um centro de negócios, em que políticos escolhem seus apadrinhados para comandar as empresas, sem nenhum conhecimento técnico do assunto, sistema que não é adotado em lugar nenhum do mundo.

É certo que os portos públicos clamam por gestão profissional, técnica, responsável e que devolva para o Estado aquilo que é a sua finalidade: geração de emprego e renda, qualidade da importação e exportação. Para isso, um dos modelos de administração seria com o porto público e a operação privada, sistema conhecido como Land Lord (Senhor da Terra, em tradução livre). Ou seja, o Estado cuida de toda a infraestrutura, oferecendo área e estrutura técnica e ética, e a parte operacional, como administração de cargas e navios, fica com a iniciativa privada.

Nesse contexto, o Estado passaria a ter a maioria das ações, a União ficaria com um pouco menos, e Estados como Minas Gerais e Goiás também poderiam fazer parte da composição acionária, como forma de alavancar o escoamento de cargas do interior do país por meio dos nossos portos, além de criar também uma demanda ferroviária, restaurando o corredor de exportação Centro-Leste, com cargas que poderiam ser trabalhadas no Estado.

Para tanto, seria fundamental que o Conselho de Administração Portuária (CAP) assumisse sua responsabilidade de representar a comunidade na gestão do porto, tendo representantes de todas as áreas envolvidas no processo, inclusive da sociedade civil, municípios e governo para participar da gestão. Fica então a reflexão sobre um modelo portuário que possa resgatar a importância do porto público para o desenvolvimento do Espírito Santo.

A incompatibilidade entre “fazer” e “governar”

Marcilio R. Machado é presidente do Sindicato do Comércio de Exportação e Importação do Estado do ES (Sindiex)

No livro que lancei ano passado, “Repensando o Brasil”, abordei o tema da privatização. O assunto continua recorrente, pois o novo governo federal tem como objetivo implementar um Programa de Privatização das empresas estatais brasileiras, inclusive o da Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa).

Ao discutir esse tema é importante entender a realidade brasileira caracterizada por um número recorde de estatais. Apesar das privatizações ocorridas nas décadas de 80 e 90, o Brasil continua sendo o campeão no mundo, com um total de 418 empresas. No ano passado, o governo federal recebeu R$ 5,5 bilhões dessas estatais e desembolsou R$ 14,8 bilhões. Consequentemente, teve que cobrir um déficit de R$ 9,3 bilhões.

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Será que problemas sociais poderão ser resolvidos quando parte do nosso PIB fica comprometido com estatais deficitárias ou improdutivas?

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O Brasil apresenta também um déficit social contabilizado através de mais de 30 milhões de brasileiros carentes de saúde, alimentação, educação e justiça. Um país onde cerca de 62% de nossos municípios não possuem política de saneamento básico e cerca de 50% da população tem apenas oito anos de estudo.

Por isso, eu questiono: será que os graves problemas sociais poderão ser resolvidos quando parte do nosso Produto Interno Bruto (PIB) fica comprometido com estatais federais deficitárias ou improdutivas? Está bastante claro que o governo já entendeu o enorme desafio que temos e reconhece que é inviável manter o Estado grande e eficiente ao mesmo tempo. O papel do governo, seja federal ou estadual, é o de governar. Isso, como aprendi desde cedo, é incompatível com fazer as coisas.

Qualquer tentativa de combinar “governar” com “fazer” em grande escala acaba paralisando a capacidade de tomada de decisões. Um bom gerenciamento requer uma separação entre quem toma decisões de quem faz. E o resultado de misturar o decidir com o fazer acaba culminando em performances sofríveis. Um exemplo foi o tempo de conclusão da dragagem e derrocagem da Baía de Vitória, que demorou 19 anos.

Cabe aqui citar também os problemas recorrentes de corrupção de empresas estatais brasileiras, como Petrobras, Banco do Brasil, Caixa Econômica, cujo enorme prejuízo está sendo pago pela sociedade. Portanto, chegou o momento em que temos que parar e questionar: embora existam muitas coisas boas, novas e excitantes a serem feitas, o que será que nós podemos fazer com os recursos disponíveis?

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Privatizar ou não privatizar não é mais a questão. Os responsáveis por políticas públicas estão constatando que o maior erro é tentar fazer de tudo um pouco, sendo preferível concentrar-se em áreas onde a presença do Estado seja imprescindível. Estão constatando também que o importante não é dizerem o que querem fazer, mas o que precisa ser feito. Além disso, creio que seja preferível que os portos estejam sob o controle da iniciativa privada, pois no Estado há cases que demonstram grande excelência na administração de serviços.

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