Publicado em 22 de março de 2019 às 17:18
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PERGUNTA: PROFESSORA DE ESCOLA PÚBLICA, 36 ANOS>
"Tenho escutado críticas sobre a educação sexual nas escolas. O que você pensa sobre esse assunto?">
Cara leitora, a educação sexual no Brasil remonta as décadas de 70 e 80. Foi necessário em função do grande número de gravidezes indesejadas em adolescentes, além das doenças sexualmente transmissíveis (DST) antes mesmo do advento da AIDS.>
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Ainda estudante de graduação, participava dos primeiros debates, pesquisas e trabalhos da Sociedade Brasileira de Sexualidade Humana (SBRASH), com o grupo de Brasília. Sem conotação política, afinal estávamos em plena ditadura militar, o único foco era a saúde e o bem estar das pessoas. Programas de rádio e televisão proliferaram com a temática, tentando transformar o tabus, preconceitos e repressões sexuais em algo mais natural, pertencente a vida comum de todos nós. Conseguimos, nesse período, muito sucesso. Com o aparecimento da AIDS, a educação sexual tornou-se ainda mais necessária, pois apareceu uma DST que matava, e mata.>
Nosso grupo sempre foi contra a Disciplina Curricular por entender que não teríamos professores capacitados para ministrar aulas dessa temática sem o cunho moralista ou religioso. Era necessário uma grande capacitação de todos os professores do Brasil, o que requereria muito dinheiro, o que não era possível.>
Fizemos o que pudemos, com cursos, palestras para professores, material adequado para as idades dos alunos e o resultado de tudo isso foi uma maior liberação da informação em jornais, novelas, programas de TV... Hoje com a internet uma infinidade de informações adequadas ou não inundam nossos lares. Outrora os pais tinham um controle maior do que se via, hoje isso não existe mais.>
Pais participantes do processo de educação são raros nos dias de hoje. Criticam a escola que tem essa preocupação, mas não fazem nada com seus próprios filhos, nem apontam soluções para a consequência da prática sexual.>
Reprimir, trancar os filhos, já não é mais uma solução. Não temos tempo para cuidar, estamos cansados de nossos trabalho e vida, e muitos fazem de conta que o silêncio dos filhos é o sinal de que está tudo bem. As estatísticas mostram um aumento das DSTs que há 25 anos estavam quase erradicadas, como a Sífilis e a Gonorreia.>
O programa de prevenção e cuidados com a AIDS diminuiu o número de soropositivos e a morte dos contaminados, e, segundo informes atualizados, a contaminação pelo vírus HIV voltou a crescer assim como as outras doenças.>
Não estou falando de partido político, pois tanto a direita como a esquerda tiveram avanços e retrocessos. Mas impedir e dificultar o acesso à informação é um grande risco para a população, principalmente as de baixa renda, com pouco acesso à saúde e à medicação preventiva adequada.>
Trabalho como terapeuta de casais e sexualidade e recebo em meu consultório uma infinidade de conflitos oriundos de desinformação, abusos e ignorância no trato com a sexualidade. Mais importante que a informação, que se obtém facilmente no Google, é a emoção que decorre dela.>
Precisamos conversar, falar de sentimentos, falar a verdade sobre nossas experiências de vida com nossos filhos. Usar um preservativo, por exemplo, não deve ser ensinado como uma prática isolada e sem graça, mas sim como uma forma de respeito ao corpo, à vida.>
Banalizar o sexo como algo sem afeto é tão perigoso como cercá-lo de uma mística inalcançável. Transar é muito bom, mas fazê-lo gostando de alguém é muito melhor.>
Criticar e impedir a educação sexual nas escolas é um retrocesso perigoso, o adolescente não é um ser partidário. Não podemos querer que a repressão resolva nossos problemas de tempo e amor com nossos filhos e alunos. Não creio ser esse o caminho.>
Carlos Boechat Filho é psicólogo e sexólogo>
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