O oftalmologista Thiago Cabral  desenvolveu estudo que é um enorme passo para o diagnóstico e novas tratamentos nas doenças da retina
O oftalmologista Thiago Cabral  desenvolveu estudo que é um enorme passo para o diagnóstico e novas tratamentos nas doenças da retina
Thiago Cabral

Professor da Ufes é premiado na Academia Nacional de Medicina com estudo sobre doenças da retina

O prêmio leva em conta a originalidade do estudo e a sua contribuição para o conhecimento da área da medicina. O oftalmologista e pesquisador Thiago Cabral apresentou o estudo que é um enorme passo para o diagnóstico e o tratamento nas doenças da retina

O oftalmologista Thiago Cabral  desenvolveu estudo que é um enorme passo para o diagnóstico e novas tratamentos nas doenças da retina
Publicado em 17/08/2020 às 16h16
Atualizado em 17/08/2020 às 16h37

Estima-se que a cegueira afete 39 milhões de pessoas em todo o mundo e que 246 milhões sofram de perda moderada ou severa da visão. No Brasil, baseado em índices do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), acredita-se que 1.577.016 de indivíduos sejam cegos, o equivalente a 0,75% da população nacional, e quase 30 milhões de pessoas tenham algum grau de deficiência visual, tornando-se um grande problema de saúde pública.

Com intuito de diminuir os casos de cegueira, o doutor Thiago Cabral, que é professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e pesquisador Escola Paulista de Medicina, da Unifesp, desenvolveu o estudo "Angiogênese da retina e coroide: biomarcadores e engenharia genética", que se torna um enorme passo para o diagnóstico e novos tratamentos nas doenças da retina, responsáveis por grande parte da cegueira atualmente. Através desse estudo ele foi o grande vencedor do Prêmio da Academia Nacional de Medicina 2020, anunciado semana passada. Os coautores são Luiz Guilherme Marchesi Mello e Júlia Polido, da Ufes e da Unifesp.

O pesquisador liderou o grupo que reúne médicos da Ufes, da Federal de São Paulo e da Columbia University sobre avanços para o tratamento da principal doença oftalmológica relacionada à perda da visão em adultos maiores de 55 anos: a Degeneração Macular Relacionada à Idade (DMRI). O grupo estudou moléculas pró e antiangiogênica que podem contribuir para vascularização ocular e a aplicação dos sistemas CRISPR-Cas para edição do genoma, também conhecida como “cirurgia genômica” no campo da oftalmologia. Na entrevista ele fala sobre os avanços.

Qual a principal causa de cegueira no Brasil? E como evitar?

São duas grandes subdivisões, as cegueiras de causas reversíveis são os erros refracionais (não usar óculos) e catarata. Com óculos novos ou uma cirurgia para retirar a catarata, o paciente tem sua visão restaurada. O problema são as cegueiras irreversíveis: lideradas pelo glaucoma, doença macular relacionada à idade (DMRI) e a retinopatia diabética. Essas necessitam de diagnóstico rápido e correto pelo oftalmologista, e tratamento adequado quando diagnosticadas. Aí vem outro problema, o tratamento é caro e pouco disponível no Serviço Público de Saúde (SUS). Mais de 90% das pessoas com deficiência visual no mundo vivem em países pobres ou em desenvolvimento como o Brasil. Estudos ainda indicam consistentemente que as mulheres, em todas as idades, têm um risco significantemente maior de deficiência visual do que os homens, principalmente por causa de sua expectativa de vida maior e, nas sociedades mais pobres, por causa de sua falta de acesso aos serviços de saúde. Por isso, é fundamental procurar um oftalmologista ao primeiro sinal de baixa visão, ou até mesmo um especialista em retina se já tiver com algum tipo das doenças relacionadas em nosso estudo.

O estudo premiado contribuiu para o diagnóstico e o desenvolvimento de novas terapias para doenças responsáveis por grande parte da cegueira no mundo? De que forma isso acontece?

Há dois grandes subgrupos de cegueiras, as reversíveis: como catarata, ausência de óculos e algumas deficiências vitamínicas, por exemplo. Que corrigindo a causa, o indivíduo volta a enxergar normalmente. Contudo as causas de cegueira irreversíveis são o grande problema em relação aos tratamentos disponíveis, que muitas vezes são inexistentes ou pouco eficazes. Nosso estudo avaliou principalmente as doenças da retina relacionadas com a idade (DMRI), com o diabetes (retinopatia diabética) e as doenças dos vasos sanguíneos do olho (trombose das veias da retina). Doenças responsáveis pela maior parte dos indivíduos cegos irreversivelmente, junto com o glaucoma. Conseguimos mostrar que há muito ainda a se descobrir sobre novos tratamentos, inclusive o uso de terapia genética e modificação no DNA podem ser novas frentes de cura. Os tratamentos disponíveis hoje são ainda pouco eficazes e necessitam de múltiplas e caras injeções dentro do olho, há muita medicação nova surgindo nos próximos anos.

Thiago Cabral

Oftalmologista e pesquisador

"Se conseguirmos modificar adequadamente o DNA das células dos olhos, muitos tratamentos que são de aplicação frequente, poderão necessitar de apenas uma dose nos próximos anos"

As novas terapias vão ajudar a evitar a cegueira?

A ideia é que novos alvos de tratamento sejam encontrados. Atualmente, os tratamentos oculares para essas doenças estão focados apenas em uma molécula chamada VEGF (sigla em inglês para “fator de crescimento vascular endotelial”), e o efeito das medicações é temporário, muitas vezes são realizados mensalmente e para o resto da vida do doente. Se conseguirmos modificar adequadamente o DNA das células dos olhos, muitos tratamentos que são de aplicação frequente, poderão necessitar de apenas uma dose nos próximos anos.

Por que o estudo é um enorme passo na medicina?

Avaliamos mais ou menos 42 moléculas relacionadas a formação de vasos sanguíneos dentro do olho, e suas correlações entre si. No olho, há uma “sopa” de fatores inflamatórios e de formação de vasos sanguíneos normais que interagem para a manutenção da visão normal, entretanto quando há um desequilíbrio nessas substâncias, os vasos que levam sangue à parte nobre do olho (retina - são neurônios) se inflamam e adoecem, levando à perda visual e muitas vezes à cegueira irreversível. Muitas dessas moléculas estudadas estão já em linha de produção em grandes laboratórios do mundo. Além desses fatores relacionados com a química dos vasos do olho, propusemos usar engenharia genética para tratamentos mais eficazes e duradouros para as doenças oculares.

Como ele afeta a vida das pessoas?

Os tratamentos disponíveis hoje para DMRI, retinopatia diabética e trombose da retina não são eficazes ou amplamente disponíveis, e muitos pacientes caminham a passos largos para a cegueira mesmo tratando adequadamente, além de terem que ser aplicados todos os meses. Isso atualmente está sendo um sério problema de saúde pública com a pandemia da Covid-19. Muitos pacientes, que em sua maioria são idosos, estão com medo de ir aos consultórios e clínicas oftalmológicas para serem tratados dos olhos. Todos têm medo de pegar o coronavírus ao sair de casa, e muitos deles estão ficando cegos pela ausência da medicação adequada dentro do olho.

Thiago Cabral

Oftalmologista e pesquisador

"Muitos pacientes, que em sua maioria são idosos, estão com medo de ir aos consultórios e clínicas oftalmológicas para serem tratados dos olhos. Todos têm medo de pegar o coronavírus ao sair de casa, e muitos deles estão ficando cegos pela ausência da medicação adequada dentro do olho."

Qual a importância do prêmio da Academia Nacional de Medicina?

A história da Academia Nacional de Medicina (ANM) se confunde com a história do Brasil, e é parte integrante e atuante na evolução da medicina no país. Ela tem como objetivo contribuir para o estudo, a discussão e o desenvolvimento das práticas da medicina, cirurgia, saúde pública e ciências afins, além de servir como órgão de consulta do governo brasileiro sobre questões de saúde e de educação médica. Na edição deste ano, houve um recorde de inscritos: foram 63 candidaturas para as nove categorias, e nosso trabalho foi agraciado com o Prêmio Academia Nacional de Medicina, a principal premiação. Um enorme passo para diagnóstico e novas terapias em doenças responsáveis por grande parte da cegueira nos dias atuais. 

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