Emar Batalha
Emar Batalha
Emar Batalha

"Não esperava ser uma das primeiras pessoas contaminadas com o coronavírus no Brasil"

Em sua primeira entrevista, após o período de isolamento, a capixaba conta como foram os 15 dias com o Covid-19, fala da situação do marido que está internado na Unidade Semi-Intensiva e da esperança de dias melhores

Emar Batalha
Publicado em 25/03/2020 às 15h22
Atualizado em 27/03/2020 às 18h43

A designer de joias Emar Batalha ainda sente cansaço ao falar. Mesmo depois dos 15 dias de total isolamento, devido ao coronavírus. Ela foi uma das primeiras pessoas a testarem positivo para o Covid-19 no país, após participar de um casamento na Bahia. "Agora estou fora da quarentena, porém ainda obedecendo a margem de distância das pessoas", conta.

Durante esse período dentro de casa, ela aproveitou o tempo para ficar com a filha Alice. "Também organizei a casa, cozinhei, lavei a louça...". Foi através de sua rede social que ela revelou que estava com o vírus. "Também estou tentando ajudar as pessoas que estão precisando de ajuda. As mães estão desesperadas. Recebo centenas de mensagens perguntando o que fazer com o filho dentro da residência".

Da sua casa de praia em São Paulo, onde está com a filha, ela conversou por telefone com A GAZETA.  Falou como está a situação do marido, ainda internado na Unidade Semi-Intensiva de um hospital em São Paulo; além do período de isolamento, dos sintomas que teve e do aprendizado que o coronavírus trouxe para a sua vida. "Espero que depois disso tudo aprendamos a lição". 

Você esteve num casamento na Bahia. Como foi essa festa?

Foi um casamento normal, como estamos acostumados. Não foi nada do que uma revista nacional noticiou, mas sim um casamento como qualquer outro, realizado na praia. Com almoço, jantar, na companhia do meu marido e de amigos de São Paulo. Lá também encontrei duas pessoas de Vitória.

O coronavírus já era assunto durante a festa?

Não foi. Na verdade o assunto coronavírus era algo distante da nossa realidade. Durante o casamento surgiu um caso positivo, de um aluno de um colégio tradicional de São Paulo, que tinha chegado de viagem. Foi a primeira vez que a gente estava ouvindo falar de um caso no Brasil.

E quando você ficou sabendo que um dos convidados estava com o coronavírus? Você ficou preocupada?

Cheguei em São Paulo no domingo (08 de março) e fui jantar num restaurante japonês com o meu marido. Na segunda fui trabalhar normalmente. Na terça, durante o expediente, senti muita falta de ar e fui para casa. Nem sonhava com a possibilidade de estar positiva para o Covid-19. Até porque naquele momento a gente não entendia direito e só se falava em febre. E eu só tinha falta de ar. Como estava voltando de uma temporada de 6 meses em Londres, tinha tomado chuva na Bahia, bebido, nem cogitei. Achava que era apenas mais uma gripe.

Os sintomas foram piorando?

Na quarta-feira senti uma leve coriza. Mas continuei com a vida, fui na dentista e depois num aniversário de uma amiga num shopping. Quando sentei, uma amiga falou: "Está sabendo? Todo mundo que esteve no casamento está no (Hospital) Albert Einstein fazendo teste para o Covid-19". Lembro que ainda falei: "Ainda bem que não estou com febre, só falta de ar". Foi nesse momento que ela me falou que febre não era requisito para o vírus. Saí imediatamente do shopping e fui para casa, onde meu marido já estava deitado e se sentindo mal. Daquele momento em diante a gente se isolou, comunicamos todos os funcionários e esperamos. A recomendação dos médicos foi não sair.

Emar Batalha

Designer de joias

"O oitavo dia foi quando tive a piora. Muita dor no corpo, cansaço e falta de ar. No nono dia eu melhorei, só que o meu marido não melhorou"

E o que aconteceu?

Na quinta-feira a minha filha Alice acordou com muita febre e não passava. Aí não teve jeito, saímos ao meio dia e fomos para o hospital fazer o teste. Depois continuamos isolados. A babá foi a única que ficou em casa, porque ela já tinha sido exposta dias antes, quando ainda não sabíamos. O resultado da minha filha deu negativo e ficamos em quarentena.

Por algum momento passou pela sua cabeça que você estava positiva para o Covid-19?

Depois que a minha amiga me alertou eu sabia que tinha grandes chances. Mas sou de obedecer as normas e muito calma. Então obedeci o que tinha que ser obedecido, como não correr para o hospital. Preferi me isolar dentro de casa, ficar quieta e esperar. Foi o que aconteceu.

Como está sendo o seu período de isolamento?

Os primeiros três dias da doença fiquei muito bem, trabalhando em casa. No quarto dia comecei a sentir mais, ficava revezando entre cama e o sofá da sala. Do sétimo para o oitavo dia foi quando tive a pior piora. Foi muito dor no corpo, cansaço e falta de ar. No nono dia eu melhorei de novo, só que o meu marido não melhorou.

Ele teve que ser internado na Unidade Semi-Intensiva...

O quadro dele foi evoluindo. Ele estava ótimo e de repente começou a ter dificuldades para respirar e muita tosse. Um quadro alarmante, uma mudança drástica e ele continua internado. Fizeram uma tomografia e 50% do pulmão está tomado pelo coronavírus. Mas ainda bem que ele não precisou ser intubado e ir para a UTI. De um dia para o outro muda muito. Tenho dois amigos entubados atualmente. É um processo de recuperação demorado. Meu marido vai ficar, no mínimo, 10 dias em isolamento no hospital.

Álbum de família

Emar Batalha em casamento na Bahia
Emar Batalha em casamento na Bahia. Reprodução/ Instagram
Emar Batalha com o marido Sérgio Davila
Emar Batalha com o marido Sérgio Davila. Reprodução/ Instagram
Emar Batalha com a filha Alice
Emar Batalha com a filha Alice. Reprodução/ Instagram
Emar Batalha
Emar Batalha. Reprodução/ Instagram
Sergio Davila e Emar Batalha
Sergio Davila e Emar Batalha. DIVULGAÇÃO
Sergio Davila e Emar Batalha
Sergio Davila e Emar Batalha
Sergio Davila e Emar Batalha
Sergio Davila e Emar Batalha
Sergio Davila e Emar Batalha

Emar Batalha

Empresária

"Metade de mim quer que todo mundo volte a trabalhar e que a vida volte ao normal. A outra metade sabe que se isso acontecer vai morrer muita gente"

Como é não poder ficar ao lado dele neste momento?

No dia que o levei para o hospital voltei chorando, porque o médico disse que devíamos ter chamado uma ambulância. O hospital está preparado, o problema é que estamos sujeitos a pegar outras doenças. Matamos a saudade pelo telefone. A gente se fala o dia inteiro porque ele se sente muito sozinho.

Te preocupa pegar outras doenças?

Sim, pois a minha imunidade está baixa. Esse é o dilema que vivo hoje. Sou empresária, tenho 30 funcionários que dependem da minha empresa, além dos de casa. Estou vivendo uma situação dentro dela. Meu maior dilema é que, metade de mim, como empresária, quer que todo mundo volte a trabalhar e que a vida volte ao normal. A outra metade sabe que se isso acontecer vai morrer muita gente. Eu vi isso de perto. Meu marido já foi removido duas vezes de quarto por que todos os dias estão precisando ampliar a área da Unidade Semi-Intensiva e da UTI.

É verdade que, quando você chegou no hospital, tinha muita gente contaminada?

Estava lotado, e muitos sendo jovens. Esse é o grande problemas que as pessoas não entendem. Meu marido está ocupando um quarto, mas se chegar um idoso como será? Os médicos falam entre 10 e 30 dias para boa recuperação.

Uma amiga sua, aqui de Vitória, que também esteve no casamento, ficou alguns dias na UTI. Você chegou a falar com ela?

Falei com ela sim. Uma mulher supersaudável, atleta, que faz ginástica todos os dias. O problema é que essa pandemia continua sendo 'vendida' como uma doença de velho e não é.

Como você administrou a ansiedade?

Muito bem. Sou muito racional, então desde o começo me apoiei nos dados. Mas não esperava que seria uma das primeiras contagiadas no país. Mas olhando pelo lado positivo, pelo menos tenho hospital à disposição, imagina como será daqui a um mês? Não sabemos se teremos. Aproveitei o tempo em casa para varrer, cozinhar, lavar a louça. Além de tentar ajudar as pessoas que estão precisando de ajuda. As mães estão desesperadas. Recebo centenas de mensagens perguntando o que fazer com o filho. As pessoas acabam se apoiando. Quero fazer marmita e mandar para a comunidade. Está na hora de quem pode, tem disponibilidade e recurso, usar isso para ajudar as pessoas que estão precisando. Parar de pensar no próprio umbigo e olhar para o lado. Muita gente vai passar fome.

Como está a sua filha com toda essa situação?

Aproveitei para ficar com ela. Essa semana saí de São Paulo porque ela piorou muito. Ela tem um quadro muito complicado, então vim para a minha casa de praia com ela, aqui em São Paulo. Um ambiente com menos poeira. Fizemos um sistema de segurança para sair do prédio e não ter contato com nenhum morador.  Agora estou fora da quarentena, porém ainda obedecendo a margem de distância das pessoas.

O que você aprendeu com isso tudo?

Espero que depois disso tudo aprendamos a lição de trabalhar a solidariedade. O Brasil está no ranking que menos doa no mundo. E eu acho que, no mínimo, a gente precisa aprender a ser solidário. A gente sempre reclamou de não ter tempo. Eu fui obrigada a ter. É uma chance.

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