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'A adolescência está começando mais cedo e terminando mais tarde'

"A adolescência está começando mais cedo e terminando mais tarde"

Para o psiquiatra Ricardo Krause, os adolescentes de hoje não sabem lidar com frustrações, o que pode levar à depressão e, consequentemente, ao suicídio

Publicado em 9 de outubro de 2019 às 19:51

O psiquiatra Ricardo Krause no Encontros do Saber Crédito: Monica Zorzanelli

"A adolescência está começando cada vez mais cedo e terminando cada vez mais tarde. E deixou de ser um período de transição para ser uma escolha de vida". É o que garante o psiquiatra Ricardo Krause, que esteve em Vitória nesta quarta-feira, participando do último Encontros do Saber 2019, que teve como tema o suicídio entre os jovens. Ao lado dele, a psicóloga e comentarista da CBN Vitória, Adriana Müller. O evento é uma realização da Rede Gazeta em parceria com a Casa do Saber Rio.

Para Krause a infância geralmente vem acompanhada de todo suporte, proteção e carinho. E quando a adolescência chega, geralmente eles não estão preparados para enfrentar os desafios.  "A mudança de uma fase para outra é muito rápida. E com a adolescência vem as cobranças, desafios, frustrações... E o adolescente não está preparado para lidar com tudo isso", conta.

Além disso, segundo ele, a adolescência é uma faixa de idade erroneamente idealizada para a felicidade. Por isso, o deprimido é visto como um perdedor, num mundo onde todo mundo tem que ser fantástico, feliz e bem-sucedido. "Quem não se encaixa nesse perfil, se sente diminuído". 

A onda de violência e de suicídio que acomete jovens é algo preocupante. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), na faixa etária entre 14 e 25 anos, o suicídio é a segunda causa de morte entre eles, perdendo apenas para os acidentes de trânsito. Para o psiquiatra, é imprescindível discutir essa questão. "A gente tem uma epidemia de suicídio que só cresce. Um nível nunca visto de evasão escolar, crianças e adolescentes que não estudam nem trabalham. Mas também outros problemas que mostram  como nossa sociedade está alterada, como transtornos alimentares e de conduta", explica Krause. Ele ressaltou ainda que, entre os mitos disseminados, está o que diz que "quem quer se matar está querendo chamar atenção". "Quem quer se matar avisa ostensivamente. A questão é que as pessoas não estão prestando atenção nas outras pessoas".

A verdade é que os fatos não acontecem do nada. São resultados dos novos tempos que vivemos, das famílias que são formadas por recasamentos e das escolas que estão inteiramente modificadas. Os adolescentes estão cada vez mais carentes. "Eles estão se desenvolvendo de um modo extremamente ansioso".

Krause também alertou sobre o uso excessivo de internet. "Hoje, observamos que as crianças não têm brincadeiras presenciais, que são fundamentais para o processo de amadurecimento, além disso os pais têm cada vez menos diálogo com eles. A redução nas horas de sono para ficar conectado é outro problema", alerta.

Linha férrea

Para a psicóloga Adriana Müller, a postura que as pessoas precisam ter com quem sofre com problemas psiquiátricos deve ser como as ações indicadas em um cruzamento de linha férrea: pare, olhe e escute.

A psicóloga Adriana Müller no Encontro do Saber Crédito: Monica Zorzanelli

“Não tem como você conversar com uma pessoa que está precisando desabafar se você não parar. É preciso que você pare e olhe para ela com solidariedade. Essa pessoa é um ser humano que está precisando ser ouvido. Vamos olhar os sinais que essa pessoa está apresentando, e um dos sinais que é muito evidente é o isolamento”, observa.

Inclusive, de acordo com a especialista, as redes sociais podem ajudar a identificar quais colegas estão sumidos da web. “Se a pessoa desapareceu das redes sociais, corre! Para tudo e vá atrás dela. Outro sintoma é a falta de esperança, apatia ou agressividade, e mudanças de padrões, como no sono, na alimentação e nas notas da escola.”

Além de parar e olhar, para ajudar aqueles que estão sofrendo, é preciso também escutar o desabafo. “Não é uma escuta qualquer. É uma escuta generosa. Tenho que ir para um lugar tranquilo com essa pessoa e ter tempo para ela. É preciso fazer perguntas abertas e não perguntas que se responde apenas com sim ou não. E esse não é o momento de ficar palpitando. Não é para dar conselho, não é para dar solução. Você precisa é garantir que essa pessoa saiba onde buscar ajuda”, pontua Adriana.

Para a diretora de Transformação da Rede Gazeta, Leticia Lindenberg, é uma satisfação ter a casa cheia para discutir esses assuntos que são polêmicos, mas urgentes. “Este é um tema cheio de preconceitos, mas temos que falar porque é uma questão social. É uma forma de ajudar as pessoas”. 

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