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Onde foi parar a Barsa? Entenda mais sobre o “Google físico” de quem veio antes da geração Z

Onde foi parar a Barsa? Entenda mais sobre o “Google físico” de quem veio antes da geração Z

Enciclopédia brasileira fez sucesso nas décadas de 1960 a 1980 e era sinônimo de conhecimento e poder

Alberto Margon

Residente em Jornalismo / [email protected]

Gustavo Domingos

Residente em Jornalismo / [email protected]

Sara Ohnesorge

Residente em Jornalismo / [email protected]

Publicado em 24 de agosto de 2025 às 12:40

Volumes da enciclopédia Barsa em uma estante de livros.
Enciclopédia Barsa Crédito: Alberto Margon

Vermelha, pesada, de capa dura e no topo da estante. Com letras douradas, o nome “Barsa” era escrito na lombada da principal enciclopédia nas estantes brasileiras entre os anos 1960 a 1980. Para a geração dos anos 2000, a coletânea de livros é comum apenas nos filmes ambientados em bibliotecas antigas. Já para os nascidos nas décadas de 70 e 80, ter uma Barsa em casa significava conhecimento e alto poder aquisitivo.

Lançada em 1964, a enciclopédia nasceu após a empresária e editora Dorita Barret perceber a chance de lançar um livro de conhecimentos que fosse brasileiro e trouxesse explicações aprofundadas de aspectos nacionais, como o folclore. A obra, composta por 18 volumes, foi então batizada pela junção dos sobrenomes de Barret e de seu marido, Alfredo de Almeida Sá (Barret + Sá = Barsa).

Uma relíquia para colecionadores

Com o passar dos anos e com o avanço da tecnologia, o uso e a aquisição da Barsa se tornaram raridade. Poucas pessoas sabem a relevância da coletânea em uma época em que a internet ainda não havia se popularizado. Apenas uma pequena parcela social (os colecionadores e aqueles que herdaram os livros de seus familiares) tem posse do item histórico.

O revisor de textos e jornalista Roberto Rodrigues, de 61 anos, adquiriu os livros quando veio morar em terras capixabas, na década de 90. Natural do Rio de Janeiro, Roberto comprou a edição de 1993 por um preço mais acessível direto de uma outra pessoa.

Jornalista Roberto Rodrigues mostra um volume da sua enciclopédia Barsa.
Roberto Rodrigues mostra sua Barsa. Crédito: Gustavo Domingos

Durante o período em que frequentava a escola e a universidade, Roberto utilizava da enciclopédia brasileira em quase todas as suas pesquisas, num tempo em que ainda não existia o Google.

“Na época da faculdade de jornalismo, cheguei a procurar algumas coisas na Barsa, como trabalhos sobre assuntos muito específicos em áreas como o radiojornalismo, o telejornalismo, técnicas de reportagem e áreas de esportes. Além disso, pessoas, personalidade e algumas invenções também eram coisas que eu encontrava na Barsa”, conta o jornalista.

O processo de utilização da enciclopédia era menos prático e rápido em comparação com a busca na internet nos dias atuais. O jornalista explica que além da pesquisa em volumes específicos, era preciso transcrever a próprio punho o que se encontrava para um papel, já que não havia “copiar e colar”, muito menos um arquivo on-line do Word. “Contudo, perde-se também toda aquela magia, aquela aura que hoje em dia a juventude nem chegou a conhecer, aquela questão de usar a criatividade para trabalhar no texto pesquisado” completa.

Jornalista Roberto Rodrigues posa para foto em frente à estante com sua coleção de livros.
Roberto Rodrigues e sua coleção de livros. Crédito: Gustavo Domingos

Com a estante repleta de outras obras, a Barsa possui um destaque especial na prateleira e no coração de Roberto, com um misto de emoção e nostalgia: “A enciclopédia representa lembranças de bons tempos passados, como o período escolar. Eventualmente, eu a consulto para algum item, alguma expressão que não existe mais ou que trocaram de nome, então ela ainda tem sua utilidade”.

Do luxo da Barsa à gratuidade da internet: a evolução do acesso à informação

A era digital possibilita facilidades na procura de significados de palavras ou na leitura de assuntos específicos. Em poucos cliques, conceitos mais variados estão disponíveis na palma da mão de uma sociedade que pode acessar diversos caminhos até chegar à informação - não apenas por meio das famosas ferramentas de pesquisa, como o Google.

As mudanças na maneira de obter informações já são percebidas por vários campos de estudo. Um relatório de 2024 do Aláfia Lab, denominado “Desigualdades Informativas: Entendendo os caminhos informativos dos brasileiros na internet 2024”, mostrou que 68,8% dos participantes da pesquisa apontaram o Instagram como o principal recurso para se informarem, seguidos do Youtube (55,9%) e Facebook (43,7%). Porém, antes da popularização dos computadores, celulares e redes sociais, era preciso sentar na cadeira com paciência e folhear os enormes livros repletos de conhecimentos gerais.

No caso da Barsa, a busca era mais lenta e mais trabalhosa que agora. De acordo com o historiador e mestre em Estudos Urbanos pela Universidade Federal do Espírito Santo Marcus Vinicius Sant’Ana, a organização se dava por ordem alfabética e a coletânea contava com um volume de referência, que servia de parâmetro para que o leitor localizasse qual livro possuía o assunto que procurava.

“Acho que é uma relação de pesquisa e conexão com um objeto que é completamente diferente da internet. Hoje, até dentro dos limites sociais e econômicos que a gente tem, a internet tem uma amplitude maior de acesso e acessibilidade”.

Outro fator que caracterizava a enciclopédia brasileira era o alto preço. A assistente administrativa Heluza Maria Zetum conta que a questão financeira foi um impeditivo para ela ter acesso aos livros. “Na época, as condições dos meus pais não eram boas, pra gente era muito caro”, explica.

Um material físico para entender o mundo - e o Brasil

Além da Barsa, existiam outras enciclopédias famosas que competiam na posição de principal fonte de informação, como a Miradora Internacional, a Delta La Rousse e a Britannica. Além de ser mais popular, o diferencial da criação de Dorita Barret era não ser uma simples tradução dos concorrentes de fora, mas uma autêntica obra brasileira.

“Do ponto de vista da educação, ela foi o primeiro projeto de tradução e de inclusão de temáticas brasileiras que não existiam nas enciclopédias anteriores”, afirma Marcus Vinicius.

Volume da enciclopédia aberto na mão de uma pessoa.
Barsa era a mais conhecida entre as enciclopédias da época. Crédito: Gustavo Domingos

A coleção física conta com 18 volumes e, atualmente, ainda é vendida no site oficial por R$ 999,00. Desde os anos 2000, a Editorial Planeta detém os direitos de publicação.

Além dos livros físicos, existe a versão digital da enciclopédia na plataforma educativa Barsa na Rede, que conta com textos, artigos, vídeos e outros materiais. O plano anual varia entre R$ 319 e R$ 490, mas no momento está indisponível para novos assinantes.

* Esta matéria é uma produção dos alunos do 28º Curso de Residência em Jornalismo, sob orientação da editora de conteúdo Mariana Gotardo.

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