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Investimento em cozinhas nos presídios quase zera queixas sobre refeições dos detentos

Investimento em cozinhas nos presídios quase zera queixas sobre refeições dos detentos

Secretário de Estado de Justiça afirmou que levar a produção das refeições para dentro das unidades reduziu tensões e reorganizou rotinas nos presídios capixabas; Estado estima economia de R$ 7 milhões com contratos

Pedro Paulo Rocha

Residente em Jornalismo / [email protected]

Publicado em 30 de setembro de 2025 às 12:46

Cozinha integrada em funcionamento no Complexo do Xuri
Cozinha integrada em funcionamento no Complexo do Xuri Crédito: Créditos: Divulgação SEJUS

É quase zero o número de queixas sobre a qualidade da alimentação servida aos homens e mulheres que hoje se encontram em unidades prisionais do Estado. Os dados, da Secretaria de Estado da Justiça (Sejus), mostram que em 2022 foram cerca de 2 mil reclamações sobre as “quentinhas” servidas a detentos, ao passo que nos primeiros seis meses deste ano apenas três reclamações foram registradas.

As informações são do secretário de Estado de Justiça, Rafael Pacheco. Na última semana, ele conversou com os alunos do 28º Curso de Residência em Jornalismo da Rede Gazeta sobre políticas de ressocialização e enfrentamento a pontos críticos do sistema penitenciário. Para Pacheco, o fator alimentação é ponto-chave para garantir que os internos tenham dignidade enquanto cumprem pena.

“O único patrimônio do preso é a comida. Quando o preso cozinha para ele e para os demais, o ambiente é diferente”, pontuou Pacheco. Segundo o titular da Sejus, além de melhorar a qualidade da alimentação nos presídios, a construção das cozinhas próprias nas unidades trouxe resultados práticos, também, aos ânimos da população carcerária: “Resolver a comida resolveu 70% das tensões do sistema”.

O caos da comida terceirizada

No início dos anos 2000, quando o Espírito Santo enfrentou uma grave crise no setor, a alimentação dos detentos era parte do problema de desorganização dos presídios capixabas. Conforme relembrou o secretário de Justiça, marmitas preparadas fora das unidades percorriam longos trajetos até chegarem às celas e, muitas vezes, eram entregues em estado impróprio para consumo. “Quando a refeição chegava estragada, o resultado era violência”, destacou.

A lembrança desse período, em que até esquartejamentos eram registrados, ajuda a entender por que a comida foi tratada como prioridade. “Você mandava comida para o presídio e voltava corpo (nas embalagens). Era a barbárie”, resgatou Pacheco. Por isso, segundo ele, resolver a questão era o primeiro passo para discutir políticas mais amplas de ressocialização.

Reorganização a partir de cozinhas internas

Atualmente, todas as 37 unidades prisionais do Espírito Santo têm cozinha própria. A adoção do modelo começou em 2022, com o objetivo de reduzir os gastos públicos e aumentar a qualidade das refeições oferecidas à população carcerária. Dois anos depois, em 2024, a Sejus concluiu o cronograma de implantação em todo o Estado. A pasta estima uma economia anual de R$ 7 milhões apenas com alimentação.

A mudança também impactou diretamente na redução de tensões. Segundo dados oficiais, desde a implantação houve queda de 75% no total de denúncias relacionadas à alimentação e redução de 82% nas irregularidades na entrega das refeições em comparação a 2022.

Cerca de 560 presos remunerados trabalham nas cozinhas, entre preparo de alimentos e limpeza. Para participar, é preciso apresentar bom comportamento e não ter punições disciplinares recentes. O trabalho é vinculado à remição de pena, cada três dias de atividade reduzem um dia de condenação, e gera renda dentro das unidades.

O funcionamento também ganhou novos padrões. Nas cozinhas, os alimentos passam por pré-preparo, cozimento e porcionamento padronizado em embalagens individuais. Os cardápios são elaborados e supervisionados por nutricionistas, que acompanham a execução e garantem as normas de segurança alimentar. Atualmente, são servidas quatro refeições diárias: desjejum, almoço, lanche da tarde e jantar, o que soma cerca de 97.920 refeições por dia no sistema prisional capixaba.

Além da economia e da pacificação, o projeto também tem relação com a formação de mão de obra. Os internos recebem capacitação em técnicas de manipulação de alimentos, higiene e panificação, podendo aplicar esse aprendizado quando retornarem ao mercado de trabalho. A Sejus ressalta ainda benefícios adicionais, como maior fiscalização do preparo, eliminação de atrasos e melhoria contínua na qualidade das refeições.

Cozinha interna no Complexo de Viana
Cozinha interna no Complexo de Viana Crédito: Divulgação SEJUS

Ainda há problemas

O Espírito Santo tem cerca de 25 mil presos para pouco mais de 16 mil vagas, o que compromete a qualidade de qualquer medida. “Dois corpos não ocupam o mesmo lugar no espaço. É a lei de Newton. E isso se aplica às prisões”, ressaltou Pacheco.

A superlotação não apenas agrava as condições de higiene e saúde, mas também ameaça neutralizar conquistas como a pacificação obtida pelas cozinhas internas: “Se eu não consigo dar um lugar para o cara dormir, como vou falar de ressocialização? A superlotação é o maior inimigo do sistema”, reconheceu Pacheco.

*Esta matéria é uma produção do aluno Pedro Paulo Rocha, do 28º Curso de Residência em Jornalismo, sob orientação do coordenador do curso, Eduardo Fachetti.

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