Publicado em 1 de janeiro de 2020 às 14:11
Em novembro, um político da oposição de Singapura fez uma postagem em seu Facebook com críticas a investimentos feitos pelo fundo soberano local. Dias depois, Brad Bowyer se tornou a primeira pessoa do país a ser enquadrada em uma nova lei contra fake news. >
Assim como a cidade-Estado asiática, outras 15 nações do planeta também criaram nos últimos anos legislações próprias para combater a disseminação de desinformação nas redes sociais, segundo levantamento feito pelo americano Instituto Poynter, que pesquisa o assunto. >
O alcance e as regras de cada uma dessas leis, porém, varia bastante. Na Alemanha, por exemplo, o projeto aprovado em 2017 estabelece que redes sociais com mais de 2 milhões de usuários (o que inclui plataformas como o Facebook e o Twitter) têm até 24 horas para retirar do ar postagens com conteúdo "obviamente ilegal" --a definição inclui, por exemplo, ameaças de crimes ou acusações infundadas contra uma pessoa.>
Devido ao grande número de postagens já bloqueadas pelo mecanismo, o país debate uma revisão da lei. >
>
O foco é bastante diferente da regra aprovada na Tailândia, que vive sob o comando de uma junta militar desde 2014. No país, quem fizer acusações contra as Forças Armadas ou a família real que sejam classificadas como fake news pode ser preso.>
Para Cristina Tardáguila, diretora-adjunta da IFCN (Rede Internacional de Fact-Checking) e fundadora da Agência Lupa, uma das maiores dificuldades nesse tipo de legislação é conseguir definir com precisão o que é uma fake news.>
No caso de Singapura, por exemplo, Bowyer (que nasceu no Reino Unido, mas tem a cidadania local), teve que mudar seu post para acrescentar uma mensagem avisando que a afirmação não era verdadeira com um link para um comunicado do governo após receber uma ordem do Ministério da Fazenda local de que estava divulgando uma informação errada.>
Uma grande inscrição com a palavra "false" (falsa) em letras vermelhas também foi incluída em cima da publicação. Ele corria o risco de ser preso se não cumprisse a ordem. O país tem um governo considerado autoritário, e o mesmo partido está no poder desde a independência da Malásia, nos anos 1960.>
O caso chamou a atenção porque a Ásia é o lugar do planeta na qual as leis contra fake news têm ficado mais comuns. Vietnã, China, Mianmar e Sri Lanka, entre outros, já têm legislações do tipo.>
Para Tardáguila, a região entrou em um caminho sem volta. Na Índia, onde a divulgação de boatos via WhatsApp causou uma série de confrontos étnicos, a população tem demonstrado apoio a essas regras desde que elas sejam utilizadas sem fins políticos.>
Esse é um dos grandes desafios dessas leis, de acordo com o advogado Björnstjern Baade, que pesquisa o tema na Universidade Livre de Berlim.>
"O dilema da legislação legítima de fake news é que ela busca proteger a liberdade e a integridade do discurso democrático o restringindo", afirma.>
Assim, ele considera que em alguns casos as leis podem ser úteis, principalmente em países democráticos como a Alemanha e a França (onde a norma de 2018 obriga as plataformas a aumentar a transparência de anúncios eleitorais).>
"Com certeza é legítimo que Estados proíbam a disseminação em larga escala de afirmações falsas através de contas falsas de Twitter", afirma Baade. "Obrigar as mídias sociais a ajudarem a resolver essa questão é uma forma sensata de fazer com que as obrigações legais sejam implementadas na prática".>
Por outro lado, muitos regimes autoritários têm usado as novas leis para perseguir a oposição e jornalistas que tentam investigar e denunciar os governos locais.>
O maior exemplo disso é no Egito, diz Courtney Radsch, diretora do CPJ (Comitê para a Proteção dos Jornalistas). O país, que vive sob a ditadura comandada por Abdel Fattah el-Sisi desde 2014, tem usado uma nova lei contra fake news para ordenar a prisão de opositores.>
Segundo o CPJ, dos 30 jornalistas atualmente presos no mundo por disseminar notícias falsas, 21 estão no Egito. A entidade registrou a primeira detenção do tipo no planeta apenas em 2012 e desde então o número vem aumentando todos os anos.>
"Então, quando as pessoas me perguntam se essas leis têm funcionado, eu digo que depende", diz Radsch. "Como forma de conter a disseminação de fake news, elas não têm sido eficientes. Mas se o objetivo é permitir que os governos controlem a discussão online e ataquem a liberdade de expressão, elas tem funcionado muito bem.">
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta