Publicado em 12 de fevereiro de 2025 às 11:44
Um dos setores mais tradicionais na economia e no comércio exterior brasileiro, a indústria de aço e alumínio enfrenta um futuro incerto desde que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou tarifa de 25% sobre os produtos brasileiros deste mercado. >
As tarifas impostas pelos EUA, um dos mais importantes destinos das exportações brasileiras de aço e alumínio, devem entrar em vigor em 12 de março. >
De acordo com um relatório do Itaú BBA publicado na segunda-feira (10/02), produtoras nacionais sem capital aberto — responsáveis por mais de 80% das exportações, no caso do aço — e que têm boa parte de seus negócios voltado para a exportação podem ser prejudicadas nesse novo cenário. >
É o caso das operações brasileiras das multinacionais ArcelorMittal e Ternium, que produzem aço — ambas citadas no relatório como exemplos de empresas que "provavelmente" seriam as "mais impactadas negativamente".>
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Já siderúrgicas brasileiras de capital aberto como Gerdau, Usiminas e CSN provavelmente não seriam tão prejudicadas, pois as exportações não são tão significativas para seus negócios, segundo explicou à BBC News Brasil Daniel Sasson, analista do Itaú BBA para o setor de mineração e siderurgia. >
A Gerdau, inclusive, pode até se beneficiar do novo cenário, por ter parte significativa da sua produção nos próprios EUA — apesar de ter sido fundada no Brasil, no Rio Grande do Sul. >
Segundo Sasson, o relatório focou mais no aço por este ser um mercado maior do que o alumínio. Mas ele cita que outra gigante deste segmento com capital aberto, a Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), tampouco deve ser fortemente afetada pelas tarifas americanas por não ter as exportações para os EUA como tão centrais para seu negócio.>
Entretanto, o analista alerta que "ainda é cedo" para fazer uma análise de eventuais impactos.>
"O aumento das tarifas não foi efetivado ainda, vai ser no começo de março. Então, muita água vai rolar até lá, negociações podem ser feitas", diz Sasson. >
"Até porque se de repente as empresas conseguirem redirecionar volumes para outros lugares, não precisariam necessariamente reduzir a produção e mandar gente embora.">
Diferente de outras empresas brasileiras, a Gerdau, na verdade, poderia se beneficiar do aumento das tarifas — já que ela tem produção nos EUA, de cerca de 3,8 milhões de toneladas por ano, segundo o relatório do Itaú BBA.>
"Uma das potenciais implicações dessa medida de Trump é o aumento de preço de aço no mercado americano. E a Gerdau, sendo produtora americana, se beneficiaria desse movimento", aponta Sasson.>
A ArcelorMittal produz e vende "muito aço" no Brasil, explica o analista. >
Mas, em 2023, ela comprou a Companhia Siderúrgica do Pecém (CSP) — e essa operação pode ficar mais vulnerável agora. >
"[Ela] tem uma capacidade de produção de mais ou menos 3 milhões de toneladas de placas [de aço] por ano, e boa parte desse volume vai para os Estados Unidos. Uma parte das operações da Arcelor no Brasil, especificamente referentes a esta planta, é que fica mais sob risco.">
Já a Ternium comprou, em 2017, a Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA), com capacidade de produção de 5 milhões de toneladas de placas de aço por ano — boa parte da qual vai para os EUA. >
As tarifas de Trump não afetam apenas as empresas do setor de aço e alumínio.>
Segundo a Câmara Americana de Comércio do Brasil (Amcham), que possui mais de 3,5 mil empresas associadas, com as tarifas, há o risco de redução das importações brasileiras de produtos americanos.>
Em 2024, as empresas brasileiras importaram US$ 1,4 bilhão em carvão siderúrgico americano, utilizado para a produção do aço no Brasil.>
"A indústria siderúrgica brasileira possui significativo grau de integração com os EUA", diz nota da Amcham divulgada na terça-feira (11/2).>
"Além disso, o aço brasileiro é um insumo estratégico para a indústria americana. O Brasil, por sua vez, importa um volume relevante de bens fabricados com aço nos EUA, incluindo máquinas e equipamentos, peças para aeronaves, motores automotivos e outros bens da indústria de transformação.">
Um dos argumentos de Trump para impor tarifas foi de que a balança comercial americana tem déficit — ou seja, que os americanos compram mais do que vendem aos demais países, gerando prejuízo para o lado americano.>
Mas a Câmara Americana de Comércio no Brasil ressaltou que os EUA têm saldo positivo em sua relação com o Brasil.>
"A Amcham Brasil espera que os governos do Brasil e dos EUA busquem uma solução negociada para preservar o comércio bilateral, que tem registrado recordes nos últimos anos, com ganhos para ambas as economias e expressivo superávit para o lado americano", diz a entidade.>
Os Estados Unidos registraram superávit de US$ 7,3 bilhões com o Brasil em 2024, um aumento de 31,9% em relação a 2023. Esse valor representa o sétimo maior saldo dos Estados Unidos com um parceiro individual em 2024, segundo a Amchan.>
O governo brasileiro ainda não decidiu se vai responder às tarifas anunciadas por Trump. Outros países já anunciaram retaliação.>
"A avaliação é de que medidas unilaterais desse tipo são contraproducentes para a melhoria da economia global. A economia global perde com isso, né?", disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.>
"O MDIC (Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio) está fazendo essa avaliação para levar ao presidente o quadro geral, e nós vamos avaliar conjuntamente.">
O próprio Brasil também pratica protecionismo no setor do aço. Em outubro, após mais de um ano de análise, a Câmara de Comércio Exterior (Camex) elevou para 25% o imposto de importação para 11 tipos de produtos de ferro e de aço. Antes disso, esses produtos pagavam de 10,8% a 14% para entrarem no país.>
O pedido foi feito pelo Sindicato Nacional da Indústria de Trefilação e Laminação de Metais Ferrosos (Sicetel), que acusava "concorrência desleal dos produtos importados".>
Na terça-feira, os setores de aço e alumínio se posicionaram sobre as medidas de Trump.>
A Associação Brasileira do Alumínio (Abal) manifesta preocupação com os impactos da nova medida.>
"Os efeitos imediatos para o Brasil serão sentidos primeiramente nas exportações e na dificuldade de acesso dos produtos brasileiros a esse mercado", afirma a Abal.>
"Apesar de os produtos de alumínio brasileiros terem plena condição de competir em mercados altamente exigentes como o americano, seja pelo aspecto da qualidade ou da sustentabilidade, nossos produtos se tornarão significativamente menos atrativos comercialmente devido à nova sobretaxa.">
A participação do Brasil no total de importações americanas de alumínio é pequena — menos de 1%. Mas do lado brasileiro, os EUA são importantes: representam 16,8% das exportações brasileiras de alumínio.>
Os EUA representam US$ 267 milhões do total de US$ 1,5 bilhão exportado pelo setor em 2024.>
A entidade também ressalta outro problema. O alumínio de outros países que também perderão acesso ao mercado americano buscará novos destinos, incluindo o Brasil, "podendo gerar uma saturação do mercado interno de produtos a preços desleais", segundo a Abal.>
O Instituto Aço Brasil — que representa as siderúrgicas nacionais — manifestou "surpresa" com as tarifas de Trump.>
O instituto afirmou que o Brasil já cumpria cotas de exportação aos EUA — algo que foi negociado pelos dois países. A nota ressalta que o Brasil não ultrapassou em momento algum as cotas negociadas. Industriais americanos que apoiam as tarifas acusaram o México de descumprir essas cotas, exportando volumes acima do negociado.>
A entidade brasileira destacou que os EUA dependem de aço importado.>
"Os EUA importaram, em 2024, 5,6 milhões de toneladas de placas por não dispor de oferta suficiente para a demanda do produto em seu mercado interno, das quais 3,4 milhões de toneladas vieram do Brasil.">
Em sua nota, o Instituto Aço Brasil defendeu o protecionismo praticado pelo Brasil.>
"Cabe ressaltar que o mercado brasileiro também vem sendo assolado pelo aumento expressivo de importações de países que praticam concorrência predatória, especialmente a China", afirma a nota.>
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