Publicado em 19 de agosto de 2025 às 17:47
No final do século XIX, o Norte do Espírito Santo foi um dos principais produtores de farinha de mandioca do Brasil, graças ao trabalho realizado nas comunidades quilombolas da região, conhecida como Sapê do Norte, atual Conceição da Barra e São Mateus. Para que essas histórias de resistência e a riqueza da cultura afro-capixaba não sejam esquecidas, a Rota Quilombola está sendo estruturada como referência no turismo de base comunitária. >
O objetivo é preservar as tradições, memórias e sabores passados de geração em geração. Tudo isso com o apoio do Sebrae/ES, que atua lado a lado com a comunidade, com capacitações e impulso para que o território desenvolva suas vocações.>
“Temos trabalhado com consultorias especializadas para levantamento dos atrativos turísticos e culturais; estruturação de roteiros e definição de experiências; formação de preço dos produtos e serviços turísticos; desenvolvimento de marca e identidade visual da Rota; e orientação para o atendimento ao turista, hospitalidade e gestão dos pequenos negócios”, conta Gianni-Arley Thomazini Fagundes, coordenadora do escritório regional do Sebrae/ES em São Mateus.>
Além disso, a coordenadora afirma que estão sendo realizados encontros com foco em gestão, empreendedorismo, turismo sustentável e práticas regenerativas, como no caso das agroflorestas, para os projetos que serão desenvolvidos na região.>
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A Rota, aliás, deve contar, no futuro, com o Roteiro Negro Rúgerio, inspirado em uma figura histórica da região. Conhecido como Rei da Farinha, ele foi responsável por fundar na Vila de Santana, hoje um bairro em Conceição da Barra, o Quilombo do Morro, comunidade que reuniu cerca de 40 escravos fugitivos no passado.>
Lá, com o apoio de outros quilombos, ele montou uma casa de farinha que, de acordo com a tradição oral, produzia 50 sacas por dia. O roteiro está sendo preparado pelo Sebrae/ES e terá um passeio de barco pelo Rio Cricaré com parada no manguezal, visita a um produtor quilombola de beiju e degustação da moqueca capixaba ao pôr do sol no restaurante Casarão.>
É pelo beiju, inclusive, que os quilombolas de Sapê do Norte mantêm vivo o próprio legado. Fabricado desde o século XIX, o alimento produzido na região ganhou em 2024 um Selo de Identificação Geográfica (IG) do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi), que atesta a qualidade e a origem do produto.>
Feito a partir da goma e da massa de mandioca, o produto é de origem índigena e a receita é passada de geração em geração, sendo a principal fonte de renda para 21 famílias da comunidade. Segundo Domingas Verônica, presidente da Associação das Produtoras Quilombolas de Beiju do Sapê do Norte, o reconhecimento do selo certifica a importância cultural e histórica da tradição quilombola.>
“É uma vitória não apenas econômica, mas também uma valorização da identidade e da memória do povo quilombola. A produção do beiju remonta a tempos ancestrais e, embora não haja uma data específica de início, o Festival do Beiju, que celebra essa tradição, é realizado anualmente desde 2003. Isso mostra que a comunidade tem preservado essa tradição viva por muitos anos”, pontua.>
Vale ressaltar que a IG é concedida a produtos ou serviços que são característicos do seu local de origem, o que lhes atribui reputação, valor intrínseco e identidade própria, além de os distinguir em relação aos seus similares disponíveis no mercado.>
“É um marco de valorização territorial porque reconhece que aquele produto só existe ali, naquele lugar, com aquelas pessoas e práticas. Isso fortalece o sentimento de identidade e promove o desenvolvimento sustentável por meio da diferenciação do produto no mercado”, reforça Gianni.>
O Sebrae/ES participou do processo de reconhecimento da IG do Beiju Sapê do Norte. A partir daí, foi firmada a parceria com as comunidades quilombolas que colocou a Rota Quilombola como um dos territórios prioritários trabalhados em 2025 para a instituição. >
“Durante esse trabalho, foi identificada uma rica rede de saberes, práticas culturais e produtos tradicionais com alto potencial de valorização. A partir dessa escuta ativa e da aproximação com os produtores locais, nasceu o projeto Rota Quilombola, com o objetivo de estruturar o turismo de base comunitária como instrumento de desenvolvimento sustentável, preservação cultural e geração de renda”, relembra Gianni.>
Domingas Verônica também reforça que algumas das contribuições advindas dessa parceria foram a participação da comunidade em cursos e formações de gestão de turismo e produção de alimentos, além do acesso a uma assessoria especializada para melhorar a produção e a comercialização do beiju. “O Sebrae/ES também deu apoio na estruturação do Festival do Beiju e na promoção da comunidade como destino turístico”, completa.>
Com essas ações, os empreendedores passaram a compreender melhor o valor simbólico e comercial do produto, receberam orientações de boas práticas para produção, embalagem e precificação, assim como uma maior visibilidade por meio das ações de promoção da Rota. O resultado foi um crescimento no fluxo de visitantes, o que aumenta a renda - e a autoestima - das famílias envolvidas.>
“Receber visitantes na comunidade hoje é uma experiência enriquecedora. Eles valorizam muito o processo de produção do beiju, desde o plantio da mandioca até a preparação final. Isso mostra o interesse genuíno em entender e respeitar a cultura quilombola”, celebra Domingas.>
De acordo com a coordenadora, a previsão de lançamento dos roteiros da Rota Quilombola é para novembro de 2025. Até lá, estão projetados investimentos para tornar os roteiros mais acessíveis e seguros, com reforma das casas de farinha, construção de banheiros e melhorias nos acessos e na sinalização das rotas.>
“Enquanto isso, convido todos a viverem uma experiência transformadora no Sapê do Norte, que recebe seus visitantes com hospitalidade, afeto e histórias ancestrais”.>
A comunidade quilombola de Sapê do Norte fica na Av. Governador Jones dos Santos Neves, número 33. Para chegar lá saindo de Vitória, basta pegar a BR-101 em direção ao Norte.>
Continue por aproximadamente 150 km, seguindo a sinalização até chegar ao município de Conceição da Barra. Ao adentrar o centro da cidade, siga as placas ou utilize um GPS para localizar o endereço.>
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