Publicado em 17 de maio de 2019 às 23:22
Você paga salários para que funcionários de deputados estaduais possam ir a aniversário, a igrejas, a festas, a feiras e hospitais ou mesmo para que percorram o interior em busca de apoio às vésperas da eleição. Essas atividades estão descritas em relatórios de trabalho produzidos pelos próprios comissionados que atuam fora da Assembleia Legislativa.>
Os documentos são apresentados aos chefes, nos respectivos gabinetes. Não passam por avaliação de nenhum outro setor. O atual controle sobre os assessores externos é falho, conforme avaliação da Promotoria Cível de Vitória publicada pela coluna Vitor Vogas em março. Abre brecha para a existência de funcionários fantasmas e para funções desconectadas do interesse público.>
Como a reportagem do Gazeta Online revelou na quinta-feira (16), gabinetes e administração da Assembleia dificultaram o acesso aos relatórios, mesmo com pareceres da Casa determinando a entrega em caráter de urgência. Os documentos foram solicitados por meio da Lei de Acesso à Informação. Apenas oito gabinetes entregaram os papéis conforme determinado.>
Antes o problema de conceder acesso aos documentos fosse o único. Apesar de vários funcionários relatarem ações no sentido de buscar e resolver demandas de grupos específicos por serviços públicos, há descrição de atividades mais voltadas a interesses privados.>
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"BUSCAR APOIO">
Na semana da eleição de outubro, um assessor do deputado José Esmeraldo (MDB), que buscava a reeleição, escreveu que fez visitas "ao povo do interior", "às famílias do interior", ao "comércio do Centro de Vila Pavão" não para colher reclamações, mas para "buscar apoio" e "levar o nome" do "nosso deputado José Esmeraldo".>
No dia seguinte à eleição, o trabalho do mesmo servidor, que recebeu R$ 4,2 mil de salário naquele mês, foi percorrer o comércio de Vila Pavão para "agradecer apoio em prol do nosso deputado José Esmeraldo".>
Outro funcionário do mesmo parlamentar teve como trabalho, no dia 3 de agosto, acompanhar um grupo católico no distrito de Piaçu, em Muniz Freire, durante "preparativos para a Festa do Galo com Macarrão". No dia anterior, a função dele foi "avisar que o secador de café" chegaria a determinada comunidade.>
Naquele mês, o servidor recebeu R$ 5,3 mil, brutos. Esse comissionado é o mesmo que ficou 40 dias sem trabalhar, sem ninguém saber o motivo.>
ANIVERSÁRIO>
A reportagem pediu acesso aos relatórios de todos os gabinetes referentes aos meses de fevereiro de 2019 e de agosto a outubro de 2018. Na sala de Esmeraldo, nem todos foram apresentados. Alguns, de acordo com a assessoria dele, haviam sido enviados para a Secretaria de Gestão de Pessoas (SGP) por "falta de espaço".>
No entanto, os arquivos tinham documentos de 2017. Um deles foi produzido por um antigo servidor do gabinete, já exonerado. Ele descreveu assim as atividades do dia 18 de fevereiro daquele ano: "Participei do aniversário do amigo Celso Corrente (52 anos) juntamente com o vereador Marquinho Bambu, oportunidade na qual lhe demos um fraterno abraço em nome do deputado José Esmeraldo".>
Na equipe externa do deputado Marcos Mansur (PSDB), funcionários relatam trabalhar literalmente dentro de igrejas, em reuniões religiosas. Um comissionado com salário bruto de R$ 4,6 mil em fevereiro deste ano descreveu um de seus dias de trabalho assim:>
"Ida a uma festividade da Igreja Assembleia de Deus do bairro Nova Carapina, para representar o deputado, e em uma fala, pude colocar o mandato à disposição de todos ali presentes e da comunidade deste bairro". Marcos Mansur é deputado e pastor.>
No dia 28 de fevereiro, um comissionado de Danilo Bahiense (PSL), contratado no fim daquele mês, relatou que a atividade dele foi atender a pedido de líder comunitário para acompanhar entrega de 150 cestas básicas a uma comunidade carente e inauguração de igreja. O servidor recebeu cerca de R$ 3,4 mil brutos em março.>
Cada gabinete formata o relatório da maneira que acha conveniente. Não existe nenhuma obrigação de detalhamento ou descrição mínima das atividades. Em geral, os relatórios disponibilizados à reportagem são digitados no computador e apenas ganham uma assinatura do responsável.>
O relato de cada dia é feito em uma linha, com cinco ou seis palavras. Todas as atividades de metade de agosto, de um funcionário externo de Erick Musso (PRB) que tem R$ 6,3 mil de salário, foram descritas em meia página.>
Uma funcionária de Luciano Machado (PV) citou uma "visita ao hospital", em 14 de fevereiro. No dia seguinte, "abertura do Festival Penha Roots", um festival de reggae no Caparaó.>
Na equipe de Alexandre Xambinho (Rede), uma servidora escreveu, sobre 18 de fevereiro: "Recebi e atendi demandas na área da saúde em Laranjeiras". As funções de um deputado estadual, bem como de seus funcionários, são legislar e fiscalizar o Poder Executivo.>
Os deputados citados argumentam que os servidores externos buscam demandas da população.>
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