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Senadores capixabas fazem questionamentos ao ministro Sergio Moro

Senadores capixabas fazem questionamentos ao ministro Sergio Moro

A divulgação de diálogos entre o ex-juiz e o procurador Deltan Dallagnol foi o foco das perguntas dos senadores na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ)

Publicado em 19 de junho de 2019 às 22:07

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Sergio Moro foi à CCJ do Senado. (José Cruz/Agência Brasil | Arquivo)

O ministro da Justiça, Sergio Moro, participou por cerca de nove horas da sessão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, nesta quarta-feira (19), onde prestou esclarecimentos sobre o vazamento de mensagens que indicam troca de colaborações com o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato.

Os três senadores do Espírito Santo – Marcos do Val (PPS), Fabiano Contarato (Rede) e Rose de Freitas (Podemos) – fizeram questionamentos ao ministro. Do Val e Contarato participaram ainda pela manhã. O senador do PPS, que também é o relator do projeto anticrime no Senado, utilizou sua fala para elogiar o trabalho do ministro na condução da Lava Jato, e perguntar sobre o que se sabe, até o momento, sobre a autoria dos vazamentos.

Já Contarato criticou as condutas do ministro reveladas pelas reportagens do site "The Intercept Brasil". Para ele, os diálogos feriram o princípio da isonomia e da imparcialidade do juiz. Irritado, em sua resposta Moro rebateu, questionando se o senador estaria defendendo que haja a anulação de todos os processos da operação.

Já Rose de Freitas foi a última a falar, no fim da tarde, e se limitou a elogiar a postura do ministro. Ela também citou as ameaças de ataque à Ufes, postadas em um fórum da deep web.

MARCOS DO VAL

Senador Marcos do Val (PPS). (Geraldo Magela/Agência Senado)

"O trabalho dele foi um divisor de águas no país, inclusive a mudança e a renovação no Congresso, foram graças à atitude dele, eu sou fruto disso, por conta do desejo da sociedade, o seu passado já te avaliza, fique tranquilo quanto a isso. Porque a gente sabe que aqui no Congresso tem muitos políticos acusados pela Lava Jato, então você vai sofrer muitos ataques para te descredenciar. Tem uma frase que fala: para destruir um argumento, você destrói o argumentador. É o que estão fazendo com você, tentando destruir sua imagem para poder perder toda a credibilidade do trabalho feito no passado. Sendo relator do projeto anticrime, fica claro o desejo de continuar a fazer essa alteração no país, colocar igualdade nos presídios, tanto nos crimes de tráfico, como nos corruptos. Também sofri ameaças de morte, de esquartejamento."

A afirmação incomodou o senador Paulo Rocha (PT-PA). "O senador tem que dizer quem são os políticos, quem são os colegas dele." A presidente da comissão, Simone Tebet (MDB-MS), pediu que Marcos do Val pudesse se atentar aos fatos e fazer as considerações devidas ao ministro.

O senador prosseguiu:

"A pessoa que fez a ameaça teve a audácia de enviar com cópia ao Ministério da Justiça, desafiando-o. A gente que é da área sabe que para hackers profissionais, são equipamentos caros, milionários, chegam a até R$ 100 milhões, então a ideia de que são pequenos hackers, adolescentes, que estariam fazendo esse trabalho, é importante deixar claro que não é esse perfil de pessoas que entrou no seu celular. O senhor tem uma ideia de quem poderia estar fazendo um alto investimento, seja a pessoa, a instituição, para que a sua imagem possa ser desconstruída, e consequentemente os processos que você estava coordenando? Existem empresas que prestam serviços nessa área para alguns Estados, e cobram de R$ 20 milhões a 30 milhões para fazer um trabalho de interceptação de 10 a 15 celulares. A gente sabe que é um investimento muito alto, e não é apenas um adolescente atrás de um computador fazendo isso. Quem poderia estar fazendo esse trabalho de desconstrução da sua imagem? E todo trabalho que o senhor fez tem apoio dos brasileiros, o senhor não está sozinho nessa. Sei que está pagando um preço alto, a sua família, a sua liberdade acabou, você é um prisioneiro, sem estar dentro da estrutura prisional. Sei que deve ter momentos que deve dar vontade de entregar o bastão e viver sua vida tranquila, mas falo: não desista, fique firme, no Brasil, a maioria está te apoiando".

Resposta de Sergio Moro:

"Agradeço as considerações. De fato, este trabalho foi muito custoso, não foi fácil. Nunca me autodenominei com alguma espécie de protagonismo ou heroísmo em relação a isso, foi um trabalho institucional, com Ministério Público, Polícia, de outras instâncias, outros magistrados, mesmo com divergências, das várias absolvições que foram deferidas, das medidas cautelares deferidas, mas mesmo com essas divergências houve avanço com nessa quebra da impunidade da grande corrupção. Não sei quem são essas pessoas, existe uma investigação da Polícia Federal, que eu não controlo, eles têm autonomia. Eu não sugiro diligências, eles que estão realizando, eu espero que eles cheguem nos responsáveis. Os indícios são de que se trata de um grupo criminoso e organizado, e não um adolescente na frente de um computador, realizando uma espécie de estripulia. A ilustrar as iniciativas de contra inteligência verificadas nas últimas semanas. A meu ver, o objetivo desse grupo, normalmente quando se investiga qualquer crime, a indagação normal é quem se beneficia? Esse é um grupo dedicado ao interesse público e que resolveu expor malvados, procuradores, juízes, policiais, envolvidos em uma conspiração? Não. O que existe é um movimento claro para anular condenações pretéritas de pessoas que cometeram crime de corrupção e lavagem de dinheiro, impedir novas investigações, e atacar as instituições brasileiras. Não reputo trivial o fato de o meu telefone ter sido objeto de um ataque hacker. Não conseguiram acessar o conteúdo, tentaram invadir o Telegram, não existe mais esse conteúdo. Pode se informar lá tecnicamente, que quando se eliminam as mensagens do aparelho celular, ou quando se desativa, também se elimina na nuvem, e o mais ilustrativo é o fato de que o hacker não publicou mensagens minhas trocadas com outra pessoa, que não o procurador, se é que essas mensagens são de fato autênticas. O meu celular não foi de fato hackeado. Até uma situação esdrúxula, porque há uma referência a uma mensagem que eu teria trocado supostamente com o procurador Carlos Lima, mas até onde tenho presente, o meu celular, apesar da tentativa, não foi hackeado, e ontem, o procurador Carlos Lima deu uma declaração que o celular dele também não foi hackeado. Então fica uma indagação de onde surgiu essa suposta troca de mensagem. Esse site, que se diz tão amigo do interesse público, faria um serviço ao país, se apresentasse essas informações, para que fossem examinadas".

Marcos do Val:

"Agradeço a resposta, e outra pergunta. O senhor acha que há a possibilidade de que algum país que o Brasil cortou relações possa estar também envolvido nesse caso?"

Sergio Moro:

"Todas as hipóteses estão abertas. Que não é um grupo de pessoas despreparadas, e me parece ser de pessoas com muito dinheiro… Mas afirmar que haveria algum envolvimento de um poder estrangeiro, seria especulação da minha parte. Pode ser que tenha envolvido estrangeiros, não necessariamente com qualquer espécie de poder".

FABIANO CONTARATO

Senador Fabiano Contarato (Rede). (Reprodução/TV Senado)

"Quero iniciar a minha fala esclarecendo que não se trata de uma discussão se é contra ou a favor à Lava Jato. Sabemos da importância dessa operação, que foi um divisor de águas no Brasil. Infelizmente vivemos em um país de desiguais, em que se criminaliza a pobreza. E que se você traçar o perfil socioeconômico de quem está preso, são pobres, afrodescendentes, e semianalfabetos, e a Lava Jato veio como um divisor de águas. Mas tenho que fazer considerações que reputo de extrema importância. A Declaração Universal de Direitos Humanos, no artigo 10, é clara. Que todo ser humano tem o direito de ser julgado por um tribunal independente e imparcial. O Código de Processo Penal também fala, no artigo 254, que o juiz dar-se-á por suspeito, se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer das partes, e se tiver aconselhado qualquer das partes. E foi público e notório, e isso deveria fazer de ofício, mas a própria defesa, foi veiculada, que entrou com incidente de suspeição, e vossa excelência não se deu por suspeito".

Contarato acrescentou que é elementar no Processo Penal que um dos princípios que vigora é o da isonomia processual, ou da paridade entre as partes. "O magistrado deve possibilitar às partes, de forma isonômica, o direito ao contraditório e ampla defesa. O magistrado deve estar acessível às partes de igual modo, deve atuar de modo equidistante. Vamos para a Lei da Magistratura. Artigo 1º: 'o exercício da magistratura exige conduta compatível com os preceitos deste Código, dentre os princípios da independência e imparcialidade'. Reforça no artigo 8º: o magistrado imparcial é aquele que busca nas provas a verdade dos fatos, com objetividade e fundamento, mantendo-se, ao longo de todo o processo, uma distância equivalente das partes. Eu não estou entrando no mérito do diálogo. Mas contra fatos, não há argumento. Houve, segundo o que foi veiculado, várias mensagens, entre o titular da Ação Penal Pública Incondicionada, que o é o Ministério Público, que tem interesse na condenação, e não entro no mérito de quem está sendo condenado, pois todos os processos estariam maculados, violando os princípios da imparcialidade, da isonomia, da equidistância, violando o Código de Ética. Houve essa quebra, e isso tem que ser dito. Me faz lembrar o filósofo inglês John Stuart Mill, do século XIX, que para o utilitarista, o bom é aquilo que se alcança para um maior número de pessoas. Os fins justificam os meios? Lembro também a teoria do fruto da árvore envenenada, ou da prova ilícita por derivação, que é uma proibição, no Código de Processo Penal, que diz: são inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas. Se a árvore está envenenada, os frutos estão envenenados".

Ele ainda comparou a atuação de um juiz a de um delegado. "Fui delegado por 27 anos. Eu fico imaginando se fosse eu, delegado de Polícia, se mantivesse contato por Whatsapp com advogado do indiciado que eu instaurei o inquérito, e se isso chegasse ao conhecimento do titular da Ação Penal, e do Poder Judiciário. Eu acho que eu sairia preso. O juiz está para a Ação Penal assim como o delegado está para o inquérito policial. Não desmereço o mérito da Lava Jato, não podemos rasgar, violar princípios que fortalecem a democracia, o devido processo legal, em nome de um comportamento que violou aquilo que é mais sagrado no processo penal, o princípio da igualdade entre as partes. Diante disso a pergunta é: o projeto inicial das 10 medidas contra a corrupção previa a possibilidade de uso de provas ilegais, desde que obtidas de boa fé. O senhor mantém essa opinião?"

Resposta de Sergio Moro:

"Me espanta falar em mérito da Operação Lava Jato, que temos que preservar os esforços anticorrupção, mas pelo que entendi o senhor defende a anulação de tudo então? Todas as condenações, todas as denúncias, devolver o dinheiro para Renato Duque, Paulo Roberto Costa, entendi dessa forma. Fica uma defesa da Lava Jato um tanto quanto peculiar, quando se argumenta que tudo deveria ter sido anulado. O senhor que é da prática jurídica sabe que são normais conversas entre juízes entre juízes, procuradores, policiais, advogados. A questão do aplicativo, foi só uma troca de mensagens mais rápido, se é que elas são autênticas. Mas examinando aquilo que foi colocado, não tem nenhum aconselhamento, mas apenas uma interlocução, que acontece no dia a dia dos fóruns. Não tem comprometimento da imparcialidade. Foram 45 ações penais sentenciadas, o Ministério Público recorreu de 44. De todas ele discordou de alguma maneira. Foram 29 acusados, 63 absolvições. Onde está o comprometimento da imparcialidade do juiz? Seria meu, seria do tribunal de apelação, do STJ? Essa é a proposta? Vamos anular toda a Operação Lava Jato? É essa sua posição?".

E também respondeu sobre provas ilícitas. "Sobre a questão da prova ilícita, aqui há um grupo de hackers, criminoso, organizado, que invadiu terminais de autoridades públicas, e a questão da boa fé não se coloca, e não há uma demonstração da autenticidade dessas mensagens. É situação diferente daquele projeto, que não era meu, era do Ministério Público. Eu, particularmente, sou contra a introdução de provas ilícitas no processo. Mas introduzi provas ilícitas, que podem ter sido adulteradas, editadas, mudadas, e que são utilizadas aqui não para proteger o inocente, mas para minar os esforços anticorrupção dos últimos 5 anos, e que foi uma conquista da sociedade brasileira, várias instâncias de julgamento".

Fabiano Contarato:

"Com todo respeito, Vossa Excelência está colocando palavras na minha boca. Em nenhum momento defendo anulação. O que estou questionando é que houve a quebra do princípio da imparcialidade quando o juiz, que tem que ser imparcial, mantém contato por inúmeras vezes com aquele que tem interesse em uma condenação na sentença. Inclusive fui eleito enaltecendo a Operação Lava Jato, para combater a corrupção, porque sempre lutei, e fui usado pelo Estado como chicote, só para dar no lombo do pobre, afrodescendente e pobre. E foi com a Operação Lava Jato que me inspirei, porque a partir daí que políticos, empresários, passaram a ser presos. Eu defendo a operação. O que não defendo é quebra do princípio da isonomia, que é uma garantia constitucional. Temos dois fatos graves: a quebra da privacidade, isso tem que ser apurado, e a interlocução, independente do mérito, do teor, desses contatos, tem que ser revisto. Houve o mesmo tratamento com os advogados de defesa de qualquer processo? Como teve com o Ministério Público? Com todo respeito, eu entendo que não", argumentou o senador.

Sergio Moro:

"Mais uma vez, não houve nenhuma quebra da imparcialidade. O que tem, é que é comum a conversa entre juízes, procuradores, policiais, advogados, na nossa tradição jurídica. Não existe qualquer anormalidade, mesmo se for ignorado o problema da falta de autenticidade dessas mensagens."

ROSE DE FREITAS

Senadora Rose de Freitas (Podemos). (Jefferson Rudy/Agência Senado)

"Ouvi atentamente todas as falas. Um pouco aflita em todo esse tempo, porque no Estado do Espírito Santo, ontem a Universidade Federal foi invadida por ameaças. A polícia está investigando. O autor dizia que ia matar o máximo de esquerdistas, feministas, usou palavra chula sobre os gays, e negros que encontrasse pela frente. Pediam que os cidadãos não comparecessem à universidade, para saírem ilesos. E estamos convivendo com isso há muitos anos".

A senadora também defendeu que haja mais debate sobre o contencioso da segurança pública. "Tanto que lhe tira através de expedientes de comunicação, e outros. A Constituição garante o sigilo da fonte no jornalismo, ou de quem faz uma denúncia, mas tudo tem que ter um parâmetro. Se está na nuvem, vamos investigar. O que queria dizer, é que hoje, a democracia só ganha. Não acredito em mitos, acredito em pessoas de boa vontade e comprometidas, e o serviço que o senhor presta a esse país já foi para a história. Tudo que puder fazer, esteja onde estiver, o que vai ser realçado é a dignidade do propósito. E isso é inquestionável. O Senado ganhou, o senhor ganhou, e é isso que temos que preservar. Quanto aos projetos, é o tempo de cada um. O senhor faz parte do grupo de homens que querem esse país melhor. O caminho será longo", declarou.

Resposta de Sergio Moro:

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"Me voluntariei para vir aqui prestar esclarecimentos, não tenho problema nenhum com isso. Espero que possa voltar. Só questiono por ter que responder por supostas mensagens hackeadas de forma criminosa, e a autenticidade é criminosa. Mas não tenho nenhum problema em esclarecer a sociedade sobre esses fatos. Sobre essa invasão da universidade, não sabia, lamento. E sobre ameaças sofridas pelos senadores, como Marcos do Val, repudio qualquer tipo de violência e ameaça feita", disse.

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