Publicado em 4 de fevereiro de 2019 às 01:35
Se por um lado alguns municípios da Grande Vitória conseguiram fechar 2018 com uma receita própria superior à inicialmente prevista, por outro todos enfrentaram dificuldades para realizar novos investimentos. Levantamento feito pelo Gazeta Online mostra que, no ano passado, o percentual de investimentos prometidos pelas prefeituras de Cariacica, Vitória, Vila Velha e Serra ficou bem aquém do que de fato foi executado.>
Os dados foram retirados dos relatórios resumidos de execução orçamentária do 6º bimestre de 2018, que foram publicados no Diário Oficial. Entre as quatro cidades, Cariacica foi a que apresentou o menor percentual de investimento, de 28,2%.>
De acordo com a subsecretária de Finanças do município, Chymene Castro, o baixo índice é resultado da não concretização de convênios que eram previstos com o governo federal e o governo estadual. Dos mais de R$ 168 milhões que o município esperava que chegassem como receita de capital (o que inclui operações de crédito e transferências vindas do Estado ou da União), cerca de R$ 46 milhões entraram no caixa. Foram investidos R$ 55,4 milhões ao longo de 2018, enquanto a previsão era de R$ 196 milhões. Ou seja, 28,2% do previsto.>
Quando a gente elabora o orçamento no início do ano fazemos uma previsão de receita. Foram feitas várias previsões de convênios com o governo federal e estadual que não foram concretizadas. Nós não conseguimos formalizar a captação de recursos, explica Chymene.>
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Apesar disso, ela comemora o crescimento da receita corrente, que fechou 2018 em quase R$ 600 milhões, isto é, 8,9% acima do previsto. Cariacica fechou o ano passado com uma despesa corrente total de R$ 522,4 milhões, o equivalente a 93,6% do previsto. Áreas como segurança pública, administração e assistência social foram as que mais se aproximaram do volume de despesa inicialmente estabelecido. Temos a menor receita per capita do Estado. Por isso priorizamos essas áreas, diz Chymene.>
Serra Na Serra, dos quase R$ 142 milhões de receita de capital previstos no orçamento de 2018, R$ 54,9 milhões (38,7%) chegaram aos cofres. Em função disso, o município, que planejava investir cerca de R$ 220 milhões, investiu de fato R$ 110,9 milhões (50,4%).>
Ainda assim, a secretária de Planejamento Estratégico da cidade, Lauriete Caneva, aponta que importantes obras puderam ter andamento, como a da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Castelândia, a do Hospital Materno Infantil e a da recuperação do Rio Jacaraípe. No entanto, outras obras tiveram que ser jogadas para frente, como a de drenagem e pavimentação de Parque das Gaivotas e de Serra Dourada II.>
Esperávamos dois convênios, um de R$ 23 milhões e outro de 40 milhões, que não chegaram para essas obras. Também esperávamos recursos do Ministério das Cidades para a regularização fundiária, mas não chegaram, diz. Segundo Lauriete, a população perde, pois os projetos precisam ser adiados. Eram obras e investimentos que ainda seriam iniciados, então não houve perdas. Claro que a população é impactada porque ela já poderia ter sua rua asfaltada, por exemplo.>
VILA VELHA >
Em Vila Velha, o secretário de Planejamento e Projetos Estratégicos, Ricardo Santos, afirma que, na comparação com a previsão inicial, a execução das despesas correntes da cidade foi razoável (o município tinha previsão de gastar R$ 835,6 milhões e gastou R$ 789,2 milhões). Mas, assim como nas cidades vizinhas, os investimentos foram prejudicados pela não concretização de convênios que viriam do governo federal. A expectativa era de que R$ 115 milhões fossem usados, mas na realidade R$ 71 milhões foram empenhados, ou seja, 61,7% do previsto.>
Cinco unidades de educação infantil estão entre as obras que não foram iniciadas na cidade. No entanto, Ricardo aponta uma outra questão para justificar parcialmente a redução dos créditos. Quando a nova gestão entrou houve necessidade de revisar alguns projetos, sobretudo na área de escolas, e isso contribuiu para a diminuição do fluxo de recursos do governo federal, disse.>
VITÓRIA>
Em Vitória, a receita própria (cuja maior parte é destinada aos gastos fixos da administração) aumentou, fechando 2018 em R$ 1,56 bilhão, enquanto a expectativa inicial era de cerca de R$ 1,4 bilhão. Mas, do ponto de vista dos investimentos, a realidade da Capital é semelhante à da vizinhança. O orçamento inicial estimava que R$ 190,4 milhões seriam investidos, mas o valor empenhado foi de R$ 99,3 milhões (52,1%).>
Henrique Valentim, secretário da Fazenda, avalia que a execução orçamentária foi satisfatória.>
SAIBA MAIS>
Orçamento>
É um instrumento de planejamento e execução das finanças públicas.>
Receita corrente>
É a soma do que o município recebe de tributos e de transferências correntes, como repasses fixos da União e royalties.>
Receita de capital>
Não tem a mesma regularidade da receita corrente. São recursos repassados pela União ou Estados, como operações de crédito e transferência de capital (convênios).>
Despesa corrente>
Despesas de custeio de manutenção das atividades da administração pública.>
Despesa de capital>
Estão relacionadas principalmente à realização de investimentos e pagamento de dívida.>
REPASSES CANCELADOS AFETAM PLANEJAMENTO>
Com uma receita própria praticamente toda amarrada às despesas correntes aquelas indispensáveis para o funcionamento da administração e à prestação de serviços , as prefeituras acabam contando com o dinheiro que vem de outras esferas para ampliar sua capacidade de realizar novos investimentos. Mas, se os recursos de empréstimos e de convênios não vêm, o desenvolvimento local e a qualidade de vida da população acabam sendo comprometidos.>
Na avaliação do economista Juliano César Gomes este foi justamente o ponto central dos problemas dos municípios da Grande Vitória no que diz respeito à execução orçamentária do exercício de 2018.>
Na parte de receita tributária, que é a receita própria dos municípios, eles praticamente acertaram, pois houve pouca diferença entre a despesa que foi prevista e a que foi empenhada. Mas, quando avaliamos a receita de capital, que inclui a adesão de empréstimos e de convênios, a situação está longe da ideal. Quando ocorre essa frustração de os recursos não chegarem, você acaba com todo o planejamento, que precisa ser refeito, explica.>
Segundo Juliano, o problema pode ter suas raízes em dois fatores. O primeiro é quando há uma quebra de contrato entre os entes, fazendo com que o dinheiro que já estava garantido para a cidade não seja repassado.>
Um exemplo recente aconteceu este ano no Estado, quando o governador Renato Casagrande (PSB), no início de janeiro, decretou que todos os municípios que firmaram convênios com o governo estadual nos últimos três meses do ano passado (ainda na gestão de Paulo Hartung) devolvessem os recursos para que os contratos fossem reavaliados.>
Um segundo fator, ressalta Juliano, é o mau planejamento. Em algumas situações, mesmo não tendo certeza do recebimento do convênio ou do empréstimo, as prefeituras os incluem no orçamento inicial. Elas fazem isso para adiantar o processo por que, uma vez aprovado pela Câmara, o orçamento já está autorizado e isso evita embates futuros com o Legislativo, pois evita que no futuro uma nova peça tenha que ser analisada e, a depender da conjuntura política, enfrente a resistência de vereadores, diz Juliano.>
CRISE FINANCEIRA>
Para a economista e editora do anuário Finanças dos Municípios Capixabas, Tânia Villela, devido às suas próprias crises fiscais, a União e os Estados têm reduzido drasticamente as transferências aos municípios. Em 2017, foram cortados 38,1% dos recursos da União para investimentos dos municípios e 31,8% dos Estados para o conjunto dos municípios do país. No Espírito Santo, o corte do Estado foi ainda maior, da ordem de 67% nesse mesmo período, de 2017/2016, ressalta.>
Tânia avalia ainda a existência de uma grande frustração com relação à obtenção de recursos através de operações de crédito. É possível que as administrações tenham planejado obter esses recursos para serem aplicados em investimentos, porém não conseguiram. Realizar operações de crédito para investimentos é uma das alternativas para driblar a falta de recursos. Porém, as regras para que os municípios tenham acesso ao crédito são muito restritivas e acabam sendo uma grande barreira, explica.>
Mas, enquanto aumenta a dificuldade de captar recursos de fora, as cidades têm bancado cada vez mais o funcionamento de áreas importantes como a saúde, e a União tem se retirado pouco a pouco. Nos últimos 15 anos, a participação dos municípios brasileiros nas despesas totais com ações e serviços em saúde passou de 25,3% (em 2002) para 31% (em 2017). Já a da União desceu de 52,1% para 43,3%. Os Estados passaram de 22,6% para 25,7%, no mesmo período, aponta Tânia.>
PONTO POSITIVO>
Um ponto positivo é que, apesar de a recuperação financeira seguir a passos lentos, alguns municípios, como foi o caso de Vitória e Cariacica, já vêm conseguindo superar as expectativas de arrecadação própria. Para Tânia, a boa notícia pode estar atrelada a importantes transferências correntes que os municípios recebem da União e do Estado e que são muito importantes para os cofres das cidades.>
Em 2018, o FPM (que vem da União) teve um aumento real de 3,1%. Quanto à transferência do ICMS, que vem do Estado, o aumento real foi de 5,9%, afirmou a especialista.>
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