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MPES apresenta tese para 'esticar' foro privilegiado

MPES apresenta tese para "esticar" foro privilegiado

Questão de ordem foi levantada no Tribunal de Justiça, durante análise do caso Luiz Durão. Desembargador disse que análise será de acordo com cada processo

Publicado em 23 de janeiro de 2019 às 03:36

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Tribunal de Justiça do ES: sugestão da Procuradoria-Geral de Justiça foi apresentada como questão de ordem. (Divulgação)

Antes de o processo do deputado estadual Luiz Durão (PDT), acusado de estupro, ser enviado pelo desembargador Ewerton Schwab Pinto Júnior à primeira instância em virtude o crime apurado não ter relação com o mandato – desconsiderado, portanto, o foro privilegiado da função –, a Procuradoria-Geral de Justiça lançou para debate no Pleno do Tribunal de Justiça do Estado (TJES) uma proposta que poderia manter casos de autoridades investigadas por crime comum por mais tempo na segunda instância.

A sugestão foi apresentada como uma questão de ordem, em acréscimo à denúncia oferecida contra o deputado. Em síntese, a tese objetiva que a Procuradoria pretendia que fosse fixada pelo TJES estabelecia que o Tribunal seria competente para "conhecer e decidir os autos de prisão em flagrante" de pessoas com foro, como deputados estaduais, "até o oferecimento da denúncia". Isso seria necessário para que, até esta etapa da tramitação, fosse possível "aferir se a formal acusação ocorre em razão da função".

Desde 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) entende que devem tramitar nas cortes superiores apenas investigações relacionadas aos mandatos. Crimes comuns devem ser julgados pela Justiça comum. Foi com base nessa interpretação que o desembargador Ewerton Schwab enviou o caso Luiz Durão à primeira instância.

Ao decidir enviar o caso de Luiz Durão ao primeiro grau, o desembargador entendeu ser "desnecessária a manifestação" a respeito da questão de ordem. Ele avaliou que o Judiciário deve verificar "caso a caso a legalidade do auto de prisão, da prisão cautelar e assim por diante". Ewerton Schwab descartou eventual insegurança jurídica.

Ainda na segunda-feira, a reportagem pediu explicações ao Ministério Público sobre a tese suscitada. Ontem, o órgão informou que não poderia se manifestar a respeito.

A reportagem, então, colheu interpretações sobre a questão de ordem junto a professores e outros experientes profissionais do Direito, de áreas distintas.

DILIGÊNCIAS

Alguns avaliaram que, caso prosperasse a tese da Procuradoria, as investigações contra detentores de foro privilegiado nos casos de crimes em que a prerrogativa não se aplica aconteceriam no TJES. Diligências para buscas e apreensões ou prisões seriam decididas no Tribunal, ainda que robustas fossem as evidências de que o crime investigado não guardasse relação com o mandato ou fosse praticado em razão das funções dele.

"Na prática, o inquérito sempre tramitaria no segundo grau, apesar da restrição do foro", opinou uma fonte. "O risco seria ter uma ampliação do foro ou retorno ao estado anterior, de ficar tudo tramitando no tribunal", considerou um outro profissional, que transita no MPES.

Ricardo Gueiros é pós-doutor em Direito. (Matheus Zardini)

Professor da Ufes e pós-doutor em Direito, Ricardo Gueiros comentou abertamente o tema levado a ele pela reportagem.

"Eu diria que sim (pode ser interpretado como expansão do foro). Se estender demais essa prerrogativa, pode-se acabar desvirtuando a interpretação que o STF deu", disse.

O professor explica que a aplicação do novo entendimento da Suprema Corte é recente, especialmente para casos de deputados estaduais e que, possivelmente, o TJES deverá fazer o debate sobre os procedimentos no futuro.

Vale lembrar que desde dezembro, graças à Lei Complementar nº 901, o procurador-geral de Justiça pode atuar também na primeira instância em casos de autoridades com foro privilegiado que respondam por crimes comuns.

Outros especialistas e estudiosos consultados ainda fizeram uma outra leitura sobre a questão de ordem da Procuradoria. Interpretaram, também, que poderia ser uma iniciativa preventiva do órgão para evitar eventuais arguições de nulidade em casos como o de Luiz Durão. Uma situação hipotética seria a de uma autoridade julgada na primeira instância e que, futuramente, consegue provar que o crime investigado guardava, sim, relação com o mandato. Os atos anteriores poderiam ser anulados.

TRIBUNAL ENGESSADO

Professor da Faesa e mestre em Direito, Dalton Morais também comentou a questão de ordem. Ele discorda que a tese, se prosperasse, representaria ampliação do foro privilegiado no Estado. No entanto, avalia que ela "engessaria" o Tribunal.

Dalton Morais é mestre em Direito. (Acervo/Dalton Morais)

"Essa tese é interessante para situações limítrofes, como a de um parlamentar acusado de homicídio e há dúvidas sobre o crime ser relacionado ou não com o mandato. Mas é muito ruim para situações que já são plenamente verificáveis que a competência não é do Tribunal. Engessaria e não traria benefício para a Corte", opinou.

RESPOSTA DO MPES

No fim da tarde desta terça-feira (22), o Ministério Público informou que não se manifestaria a respeito da questão de ordem. A reportagem pediu mais informações a respeito dela e das motivações ainda na segunda-feira. "O MPES informa que está impedido de se manifestar em procedimentos que guardam segredo de Justiça, nos termos do Artigo 234-B do CPB", diz a nota enviada. O artigo citado diz respeito à obrigação de segredo de Justiça em processos relacionados a determinado tipo de crime.

ENTENDA O CASO

Prisão

Luiz Durão foi preso no dia 4 de janeiro após ser flagrado saindo de um motel na Serra com uma adolescente de 17 anos.

Uma semana depois

A Procuradoria ofereceu denúncia contra o deputado, afirmando que ele premeditou o estupro.

Questão de ordem

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A PGJ levantou questão de ordem sobre a análise da competência do Tribunal em casos com foro privilegiado. O desembargador relator não desconsiderou a provocação.

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