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Delfim Netto: Do 'milagre econômico' aos governos do PT

Delfim Netto: Do "milagre econômico" aos governos do PT

Apontado pela Lava Jato como beneficiário de R$ 15 milhões em propina, ex-ministro da Fazenda da ditadura transita em diferentes grupos políticos

Publicado em 9 de março de 2018 às 23:46

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Delfim Netto. (Fecomércio SP/Flickr)

Ministro da Fazenda em plena ditadura militar e associado ao "milagre econômico", Delfim Netto tem uma fama que se expande para além desse período. Mesmo depois da queda do regime, a figura imortalizada em charges com postura atarracada e óculos de armação grossa continuou influente, chegando até a aconselhar os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, ambos do PT. É quase aos 90 anos de idade que ele permanece nos holofotes, desta vez apontado pela Operação Lava Jato como beneficiário de R$ 15 milhões em propina sobre a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte.

Não que Delfim tenha sofrido uma guinada ideológica, apenas passeou, imune – até mesmo a outros escândalos de corrupção – por diversos grupos políticos por décadas. Signatário do Ato Institucional nº 5, responsável período mais autoritário da ditadura, ele já disse que não tem "nada do que se arrepender". Não se fez de rogado ao endossar a Constituição de 1988, marco da redemocratização, e foi deputado federal por cinco mandatos, pelos partidos PSD, PPR e PPB (atual PP).

Aliás, PP do amigo e aliado histórico de Delfim, Paulo Maluf, agora na cadeia da Papuda. Até os dias atuais Delfim tem certa relevância. Publica artigos no jornal "Folha de S. Paulo" e na revista "Carta Capital". Nesta última, em fevereiro, defendeu a reforma da Previdência que o governo Michel Temer (PMDB) tentou implementar.

O historiador Estilaque Ferreira lembra que se Delfim atuou no milagre econômico, também foi o responsável pela derrocada da economia brasileira nos anos de chumbo. O então ministro comandou a Fazenda entre 1967 e 1974. "Até 1974, o Brasil teve taxas de crescimento espetaculares, em torno de 10%. Em 1974, a inflação volta e ele é o principal responsável por isso. O crescimento era artificial, insustentável. Aí ele camuflou a inflação. Estava em mais de 20%, em 25%, mas os índices oficiais eram de 12%, 13%", conta Ferreira. Em 11 de novembro de 2001, ao jornal "O Globo", Delfim disse que manipulou mesmo a inflação.

"Ele acreditava que o desenvolvimento deveria acontecer a qualquer custo, não importando as consequências políticas e sociais. E elevou o endividamento do Brasil", complementa o historiador.

É creditada a ele a frase "fazer o bolo crescer para depois dividi-lo", que ilustra a desigualdade de renda no país. Em 2014, no entanto, ele negou ter pronunciado tais palavras. "Disse que não se pode distribuir o que você ainda não produziu, a não ser que você tome emprestado".

O "fim do milagre" levou ao afastamento de Delfim do poder central. O presidente Ernesto Geisel o nomeou embaixador do Brasil na França. Coube a outro general, João Baptista Figueiredo, a volta do ex-ministro da Fazenda. No governo de Figueiredo, ele comandou as pastas da Agricultura e do Planejamento. 

Estilaque Ferreira tem uma hipótese sobre como Delfim conseguiu sobreviver por tanto tempo e até exercendo influência sobre forças políticas antagônicas às que o consagraram. "A ditadura e o governo de esquerda, na economia, eram ambos estatistas. Isso que explica a sobrevivência do Delfim. Ambos são favoráveis à intervenção irresponsável do Estado", afirma o historiador.

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"No Brasil o passado não quer passar. A gente tem a sensação de que o passado não está completamente morto, ele resiste, teima em não desaparecer. Uma figura como Delfim Netto, que deveria ter sido esquecida, está aí até hoje, agora com um final melancólico", define. Isso, é claro, se este for mesmo o fim de Delfim.

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