Paulo Hartung, Economista, ex-governador do Estado do Espírito Santo
Paulo Hartung
"Calendário eleitoral está precipitado"
O ex-governador do Espírito Santo faz uma análise do processo já iniciado para as Eleições de 2026, projetos do novo partido e apoio para o comando do Palácio Anchieta
Paulo Hartung, Economista, ex-governador do Estado do Espírito Santo
Pouco mais de um mês do lançamento do seu quarto livro, o ex-governador do Espírito Santo Paulo Hartung (PSD) conversou com reportagem de A Gazeta para falar da publicação, mas, naturalmente, a política entrou no bate-papo. Renovação do comando no Espírito Santo e no país, uso da máquina para fins eleitorais e os projetos do PSD — partido ao qual se filiou este ano — para o pleito de 2026 foram alguns dos temas abordados.
O ex-chefe do Executivo estadual ainda explica os motivos pelos quais apoia o prefeito de Vitória, Lorenzo Pazolini (Republicanos), em uma possível candidatura ao governo do Estado, mas e o futuro político de Hartung? O autor de "A política em tempos de grandes mudanças" diz o que pensa sobre a disputa no próximo ano. Confira:
O senhor é um defensor da renovação política no Brasil e no Espírito Santo. O PSD, partido ao qual o senhor é filiado, terá um projeto nessa direção para a eleição do ano que vem?
A renovação é importante. Uma das belezas e forças da democracia é a alternância de poder. Toda vez que há alternância, as relações se oxigenam. Quando um grupo fica muito tempo no poder, há uma “fadiga de material” — expressão da física que serve muito à política.
No Espírito Santo, já está na hora de oxigenar essa relação; no Brasil, também. O grupo que governa hoje já teve várias oportunidades — é a quinta vez. É hora de novas lideranças serem projetadas. Defendo a renovação em nível nacional e regional.
Como o PSD pretende conduzir essa renovação no Legislativo e, olhando para o Espírito Santo, até mesmo para o governo?
O Brasil é grande e diverso. Há, porém, um ponto positivo: estamos, aos poucos, diminuindo o número de partidos com grande representação nas Casas Legislativas. Isso é bom.
O PSD é um desses partidos em crescimento; foi bem-sucedido nas municipais e está arregimentando quadros qualificados. Cito o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite; a governadora de Pernambuco, Raquel Lyra; o prefeito do Rio de Janeiro (Eduardo Paes), um gestor respeitado; o governador do Paraná (Ratinho Jr). No Espírito Santo, temos o prefeito de Colatina, Renzo (Vasconcelos).
O partido forma uma base nacional e, na minha visão, chegará à Presidência nos próximos anos — se não agora, nas próximas eleições. Medidas como o fim das coligações proporcionais, as federações e a cláusula de desempenho ajudaram. No futuro, talvez avancemos para o distrital misto.
Temos quadros para liderar o país. Ratinho Jr. e Eduardo Leite têm cerca de 40 anos e muito caminho pela frente, além de outros nomes como a própria Raquel.
Tenho ajudado no campo das ideias e da formulação: partido precisa aglutinar pessoas, mas, sobretudo, ideias — propostas e programas objetivos para o país.
O senhor declarou apoio ao prefeito de Vitória, Lorenzo Pazolini, ventilando seu nome para uma disputa ao governo do Estado. Que características o levaram a vê-lo como bom gestor para o Espírito Santo?
É um jovem — e, para quem defende a renovação no Estado, isso importa. Está no segundo mandato como prefeito, entregando resultados: Vitória tem recebido boas notícias em comparações com outras cidades.
Resultado assim exige equipe, planejamento e execução. Não há escândalos, o que é essencial num país que precisa combater desvios e corrupção — relação pública e privada tem dois lados. Há unidade na administração.
No campo político, na reeleição dele houve um movimento de caciques estaduais para impedir a vitória em primeiro turno. Fizeram uma frente e, ainda assim, ele venceu no primeiro turno.
Naquele momento, registrei: estava nascendo uma nova liderança no Espírito Santo.
Há outros jovens prefeitos se destacando no Estado, como na Serra e Viana. Mas, no caso de Pazolini, a pressão contra ele o robusteceu: deu tração e musculatura política.
O senhor critica a antecipação do calendário político. Como enxerga movimentos de chefes do Executivo, ainda no meio do mandato, já discutindo reeleição? Qual o risco dessa antecipação para a gestão?
O calendário eleitoral está precipitado no Brasil — e isso não é exclusividade do Espírito Santo. Quem precipitou foi o próprio presidente da República. Parece que teremos eleições em três ou quatro semanas, e não teremos; serão no fim do ano que vem.
Apresentar-se como pré-candidato não é problema. O que preocupa é usar a máquina pública para isso. A máquina pertence aos contribuintes, não ao governante. Quando há uso da máquina, é crime; os órgãos de controle deveriam estar atentos.
Outra observação, da minha experiência: fazer campanha fora de hora é inútil. Você “aquece o tamborim antes do samba” e gasta energia à toa. O momento decisivo é quando o povo passa a prestar atenção, perto do pleito. Agora, as pessoas estão preocupadas com emprego, cirurgia eletiva, escola do filho, trocar a geladeira, crédito caro.
Circular pelo interior para se tornar conhecido faz parte do jogo — eu mesmo percorri o Espírito Santo inteiro. O que é criminoso é confundir público e privado. Prefeito não é dono da cidade; governador não é dono do Estado; presidente não é dono do país. O dono é o povo.
O senhor fala muito de “oportunidade” em palestras e livros. Como novas lideranças podem aproveitar a janela fora da polarização extrema, dialogando com o eleitor que não se identifica com os dois polos?
Pesquisas mostram que os extremos, de ambos os lados, são pequenos — mas barulhentos e muito conectados nas redes. Não dá para subestimar.
Há, porém, um “timão” que não se sente representado pelos extremos.
Aí, existe uma enorme oportunidade. Falta a figura que represente esse espaço no jogo nacional. Pode aparecer até o ano que vem? Pode — e também pode não aparecer. Política tem seus tempos.
Cito um caso: a eleição passada em São Paulo. De repente, surgiu Pablo Marçal. Concordando ou não com ele, criou identidade com um segmento grande, quase foi ao segundo turno. Isso mostra como fenômenos podem emergir “em cima” do processo.
Resumindo: movimentar-se para ser conhecido é normal; precipitar calendário é ruim; usar máquina pública é crime.
Promessas eleitorais de ampliar programas sociais costumam aparecer no período pré-eleitoral. Qual o risco de fazer política onerando a máquina pública?
O risco é a gastança descontrolada — algo que estamos vivendo. O impacto não vem no imediato; aparece adiante, desorganizando as contas. Nosso problema grave é o tamanho da dívida em relação ao PIB. Essa relação tem crescido e deixará uma herança ruim.
A gastança traz outra consequência: juros altos. Com taxa elevada, a economia lícita não se sustenta. E quem mais usa crédito no Brasil são os mais pobres, que parcelam liquidificador, geladeira, fogão. O juro que pesa é o que chega na ponta, ainda maior pelo intermediário.
O resultado está no aumento do endividamento das famílias. A conta chega — como em 2015–2016, quando tivemos a maior recessão da história recente. Medidas erradas hoje produzem desacertos amanhã.
Economistas de várias correntes reconhecem: os dois grandes problemas são o endividamento crescente e a taxa de juros muito alta. Em ambos, quem mais sofre é a população de menor renda.
Após o fim da novela Vale Tudo, o mistério sobre quem teria matado Odete Roitman foi solucionado, sobrando, agora, somente o enigma em torno de que papel o senhor deverá assumir na corrida eleitoral de 2026. O senhor já definiu como vai participar desse xadrez político? Será candidato a governador, senador ou presidente?
Volto a afirmar que o debate eleitoral está precipitado. O que posso dizer é que de alguma forma darei minha contribuição para esse momento tão importante para os capixabas e os brasileiros de forma geral.