Um bairro e duas tragédias. A comunidade de Canaã, em Viana, revive a perda de pessoas queridas em acidentes envolvendo transporte de granito. Aproximadamente 200 metros de distância separam as casas das famílias de Danielli Martins e Vanderlir Müller Estevam, mortos em diferentes batidas na BR 101 e conhecidos desde criança.
O primeiro acidente aconteceu em 10 de setembro de 2017, quando um micro-ônibus pegou fogo após bater em dois caminhões, um deles carregado de chapas de granito, na BR 101, em Mimoso do Sul. Onze pessoas morreram, entre elas, Vanderlir, que era o motorista do veículo. A maior parte das vítimas fazia parte do grupo de dança alemã Bergfreunde, de Domingos Martins.
O QUE DIZ O DELEGADO
Na manhã desta terça-feira (11), enquanto a família de Danielli sabia da morte dela, do marido e do filho caçula, os parentes do motorista Vanderlir sentiam mais uma vez toda dor da perda.
O farmacêutico Valdemir Müller Estevam, 35 anos, irmão gêmeo de Vanderlir, soube das mortes pela manhã e, à noite, fez questão de acompanhar o velório da antiga conhecida de bairro. Hoje, Valdemir mora na Serra, mas ele e os irmãos conviveram desde criança com Danielli. Nesta quarta, ele conversou com a reportagem do Gazeta Online sobre a proximidade das famílias e o sentimento de novamente ver tanta dor se repetir.
Na conversa, ele lembrou de outro acidente com granito, em Guarapari, que matou 23 pessoas em 2017.
O seu irmão também era do bairro Canaã. Como você recebeu a notícia de outro acidente envolvendo granito?
Qual foi o resultado das investigações do acidente em que o seu irmão faleceu? Chegou a alguma conclusão?
Este país que a gente vive não vai chegar a conclusão nenhuma. O meu irmão, um motorista profissional, tinha todos os cursos que podia ter para poder carregar qualquer tipo de transporte. E o motorista que provocou aquele acidente não tinha nada disso. Dizer no julgamento que não sabia que tinha que ter isso, é um absurdo um cara desse continuar solto. Isso é revoltante. E ainda ser constatado no laudo da polícia que meu irmão não era motorista profissional. Me desculpa, mas isso é errado.
Esses caras não fiscalizam. Se fiscalizassem desde 2017, quando acontecerem os outros dois acidentes, essa carreta que estava toda irregular não tinha passado várias vezes pelos postos da Polícia Rodoviária Federal e nunca foi parada. Há três anos, eu morava em Viana. Eu pegava o Contorno todo dia. Antes de três anos, direto você via carro da PRF nas BRs, radares. Hoje em dia você não vê mais. Nem rodando você vê. Cadê o Estado? Cadê a União?
Você e o seu irmão conheciam a família da Danielli?
Conhecia, desde criança. A gente tinha uns 10 anos, e ela participava da Igreja Católica. Os pais dela a gente conhecia há muitos anos, participavam de movimento comunitário com o meu pai. A gente estava junto brincando na rua da igreja, encontro de adolescente. A minha irmã estudou com a irmã dela.
Como soube do acidente envolvendo a família da Danielli?
Vocês moravam perto da Danielli?
Uns 200 metros.
Você foi ao velório ontem. Vai hoje novamente?
Não vou ao velório hoje por causa do trabalho, fiquei ontem até quase meia noite. Os primos da Danielli são amigos nossos desde a infância. Fomos lá para dar uma força, porque só sabe a dor, de fato, quem passa.
Você é irmão gêmeo. Eram muito próximos?
Silêncio seguido de choro.
Enquanto o governo do Estado ganha em cima dessas empresas de rochas, nada será resolvido. Se não rendesse para o Estado, isso já seria resolvido há muito tempo. Nunca se resolve.
Eu vi um post seu contando que vocês brincavam com embalagem de pasta de dente, como se fosse um ônibus. Ele gostava de ser motorista?
Choro. A gente fazia carrinho e carreta com caixa de pasta de dente. Fazia ônibus, a gente desenhava a bandeira do Brasil. Nosso sonho era ônibus. Ele trabalhou de carreta para pegar experiência porque o sonho dele era trabalhar com ônibus de turismo. Então quando surgiu a oportunidade desse freelancer de final de semana foi a paixão dele, porque ele sempre gostou de dirigir. Eu também sempre gostei, mas não igual a ele. A gente vivia brincando no quintal, sonho de criança, de crescer e trabalhar com ônibus. E esse sonho é interrompido (silêncio).
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