Foliões do bloco Pica Pau brincando o último dia do Vital, no corredor da folia, localizado na Avenida Dante Michelini, em Camburi, em 2004
Foliões do bloco Pica Pau brincando o último dia do Vital, no corredor da folia, localizado na Avenida Dante Michelini, em Camburi, em 2004. Crédito: Ricardo Medeiros

Vital, micareta que já foi a maior do ES, pode voltar

Micareta que arrastou multidões em Camburi, Vitória, e que estaria completando 25 anos este ano se não tivesse acabado em 2006, poderá ter edição comemorativa em 2020

Publicado em 26/10/2019 às 21h35

Aline Nunes e Viviann Barcelos

Já se passaram praticamente 25 anos desde que o primeiro trio elétrico ocupou um trecho da Avenida Dante Michelini, na Praia de Camburi, em Vitória, e conduziu milhares de pessoas ao som de música baiana – o autêntico axé. Mas, para quem curtia o corredor da folia, o Vital não sai da lembrança.

A micareta marcou época e foi, por um bom tempo, um dos maiores eventos do Estado. Tão grande e tão festejado que os organizadores estão planejando uma nova edição. Essa é a quarta reportagem da seção Conexão 1928 – ano de fundação de A Gazeta – que revisita grandes coberturas feitas pelo jornal ao longo de sua história.

Os criadores do Vital estão mantendo as primeiras conversas para tirar do papel a proposta de um novo carnaval fora de época. Américo Teles, Rominho Dias e Abner Romano ressaltam que ainda hoje, 13 anos após a última edição, são cobrados para retomar a micareta e sentem que o momento é propício.

Américo Teles

Empresário (um dos organizadores do Vital)

"Existe, sim, o desejo de fazer algo que possa marcar uma reedição do Vital, com aquele espírito que mexia com a cidade inteira. O resgate de uma lembrança pelos 25 anos"
Organizadores do Vital: Américo Teles, Rominho Dias e Abner Romano. Crédito: Vitor Jubini
Organizadores do Vital: Américo Teles, Rominho Dias e Abner Romano. Crédito: Vitor Jubini

Ele diz que a ideia é fazer uma edição comemorativa, mas reconhece a dificuldade de se fechar uma avenida em Vitória como era antigamente. Então, um dos grandes pontos de discussão do grupo é encontrar um local apropriado para receber a festa, e também a busca de parceiros. “Estamos conversando e queremos realizar no ano que vem”, sinaliza Rominho.

LAVAGEM DO TRIÂNGULO

Disposição para o negócio não falta ao trio que organizou o primeiro Vital em poucos meses. Américo, que é baiano, tinha a ideia de fazer uma festa similar ao Carnaval de Salvador em Vitória, cidade que havia adotado para viver. O ano era 1994 e, também numa conversa com Rominho e Abner, criaram a Lavagem do Triângulo.

A festa foi realizada na região do Triângulo, na Praia do Canto, em maio. Mesmo com um contratempo inicial – no dia agendado, o piloto Ayrton Senna morreu e a “lavagem” foi transferida para o final de semana seguinte –, foi um sucesso de público. Desse primeiro evento, uma das passagens curiosas foi a implantação do sistema de corda para separar os blocos.

“Ninguém tinha noção do que era aquilo. Achavam que a gente ia fechar o bairro todo com corda. Depois, a proposta foi muito bem assimilada”, lembra Américo.

Com o resultado positivo, os três avaliaram que teriam capacidade de fazer uma festa maior. Em julho, foram ao Fortal – carnaval fora de época de Fortaleza – e ali tomaram a decisão de fazer o Vital, nome escolhido a partir da junção de Vitória com carnaval. Em novembro de 1994, colocaram os blocos na Avenida Dante Michelini.

Mais uma vez, o desconhecimento do público com o modelo de festa provocou uma cena inusitada. Rominho conta que, na primeira edição, havia dois trios: um para o bloco, outro para a “pipoca”, como são denominadas as pessoas que brincam o carnaval sem os abadás e fora da corda. “O primeiro trio que começou a tocar foi o da pipoca, e todo mundo foi atrás. E a gente começou a falar para o pessoal do bloco: ‘volta, volta, é lá no outro’.

SUCESSO

Famosos hoje, muitos artistas que se apresentaram no Vital estavam praticamente em início de carreira. É o caso de Saulo Fernandes, cantor que esteve à frente do bloco Mukeka - o primeiro a ser criado para a micareta. Ele até morou por um tempo na casa de Rominho antes de voltar a Salvador. O furacão Ivete estreou no terceiro ano do Vital ainda no comando da Banda Eva, que era a atração principal do Bloco Pica-pau.

Cícero Ribeiro

Produtor de eventos

"Algo que me marcou muito foi no Vital de 1998, quando ela (Ivete) passou mal e, mesmo assim, cantou tomando soro no braço. Lembro que estava desesperado, as pessoas perguntando ‘cadê a mulher?'. Quando estava subindo o trio, me disse: ‘Só vim por causa de você’. Foi um show incrível"

CRESCIMENTO

Ano a ano, o Vital tomava proporções ainda maiores de estrutura, público, de presença de artistas – no trio e para curtir a festa. Para se ter uma ideia, na primeira edição havia 20 camarotes; na última, 500. De 60 mil foliões, chegou a 700 mil.

“Era um mês de montagem. A gente quase se mudava para Camburi no período. Aqui chegou a ser, por três anos, a maior estrutura do país. O trabalho era tão profissional que serviu de referência para criar uma legislação para fiscalização de eventos”, ressalta Abner.

Rominho destaca também a geração de empregos e de renda. “O movimento financeiro na Grande Vitória chegou a R$ 23 milhões, reunindo rede hoteleira, restaurantes e transportes.”

“E a imagem de Vitória ia para o Brasil inteiro. Muitos turistas vinham para cá nesta época”, acrescenta Américo.

Mas o crescimento da festa também gerou incômodo. A moradores, que criticavam o fechamento da Dante Michelini, e a alguns outros segmentos que apontavam problemas de segurança.

De toda maneira, acredita Américo, o Vital teve uma evolução natural e acabou como outras micaretas pelo país. Algumas que duraram um pouco mais de tempo, diz Abner, não aconteciam na rua. A última edição, em 2006, foi realizada na Praça do Papa, mas já tinha perdido a força do começo.

NOSTALGIA

Marcella Gomes Surlo Amaral,45 e Paulo Fernando Rabelo Amaral,47, se conheceram no Vital e se casaram . Crédito: Fabio Vicentini
Marcella Gomes Surlo Amaral,45 e Paulo Fernando Rabelo Amaral,47, se conheceram no Vital e se casaram . Crédito: Fabio Vicentini

A nova edição que está nos planos dos fundadores do Vital já tem foliões com presença garantida. Marcella Gomes Surlo Amaral, 45, e Paulo Fernando Rabelo Amaral, 47, se conheceram na micareta e, hoje, são casados e têm três filhos. “Ia ser muito bacana. A gente iria, com certeza”, diz Marcella. “O Vital era incomparável”, completa o marido.

O servidor público André Bertollo Ferreira, 38, é tão fã que, ainda hoje, guarda os abadás das 13 edições do Vital. “Era um lugar que a gente ia para se divertir muito.”

André Bertollo Ferreira é fã do Vital e ainda tem os abadás de todas as edições da micareta. Crédito: Acervo pessoal
André Bertollo Ferreira é fã do Vital e ainda tem os abadás de todas as edições da micareta. Crédito: Acervo pessoal

Organizador do bloco Nana Banana, o produtor Pablo Pacheco está convicto de que os fãs do Chiclete e de Bell Marques iriam curtir muito reviver os tempos do Vital. Assim como a produtora Lilian Moussallem, do Mukeka, que ainda é abordada na rua por pessoas que gostariam da volta da micareta. “Chega o mês de novembro e todo mundo lembra. Era tudo muito bom”, recorda.

Para o investigador de polícia Vicente de Paulo Alvarenga Silva, 51, o Vital era a melhor festa que o Estado já teve. “Participei de todas as edições, do Triângulo até a Praça do Papa. Era apaixonado, organizava camarote, tenho muitas lembranças boas. Tenho fitas de vídeo que guardo até hoje!”

PREFEITURA

Questionada sobre a possibilidade de realizar a micareta na Dante Michelini ou em outro espaço da Capital, a Prefeitura de Vitória não fez nenhuma menção de proibição.

Por nota, informou que ainda não recebeu solicitação sobre o assunto, mas que o pedido deverá ser encaminhado à Comissão para Regulamentação de Eventos que, “além de analisar o requerimento, é responsável pelo desenvolvimento de estudos e apresentação de propostas relacionadas à autorização e fiscalização para a realização de eventos.” 

A Gazeta integra o

Saiba mais

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.

A Gazeta deseja enviar alertas sobre as principais notícias do Espirito Santo.