Problema de saúde cuja incidência no Brasil é a maior do mundo, atingindo 9,3% da população, o transtorno de ansiedade é apontado como o mal do século. Mas engana-se quem pensa que essa é uma condição que afeta somente a vida adulta: cada vez mais crianças e jovens são acometidos e alguns especialistas chegam a afirmar que há uma epidemia da doença também nessa parcela da população.
Sobrecarga de compromissos, alta expectativa por desempenho acadêmico e exposição exagerada nas redes sociais são alguns dos fatores que podem contribuir para o desenvolvimento de ansiedade com características patológicas. Isso porque todas as pessoas têm, como componente biológico, um grau de ansiedade, mas que torna-se problema quando é um limitador ou quando impede a realização de atividades no dia a dia por preocupação desmedida, medo ou sensação de incapacidade.
A universitária Pâmela Hérika Araújo de Oliveira, 21, diagnosticada com ansiedade, disse que os episódios começaram por volta dos sete anos de idade. Morando no interior do Estado, ela lembra que, toda vez que a mãe anunciava que a família viajaria para Vitória, ela passava mal. Minha expectativa era tão grande por aquele momento que eu vomitava e tinha febre até chegar a data da viagem. No começo, minha mãe me levava ao hospital, mas sempre diziam que não era nada, conta a jovem.
O tempo passou, e os sintomas ganharam outra dimensão. Fortes dores de cabeça, marcas roxas pelo corpo e, quando em crise, uma sensação de que todos a sua volta a olhavam de modo estranho, como se tivessem sido atacados por ela. A cabeça faz você acreditar em coisas que não existem, ou se preocupar com o que não precisa, observa Pâmela, que apenas neste ano começou um tratamento para amenizar o transtorno.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) revela que um em cada cinco adolescentes enfrenta desafios de saúde mental, e estima que metade de todas as doenças dessa natureza, entre as quais está a ansiedade, começa aos 14 anos. Para o psiquiatra da infância e adolescência Fausto Amarante, o aumento dos casos de transtorno pode ser equiparado a uma epidemia.
As crianças e jovens estão perdendo a noção de convivência, a capacidade de comunicação. São grandes entendidos em computador e, na hora da vida real, não sabem lidar, são até ingênuos, avalia Amarante, também vice-presidente da Associação Psiquiátrica do Espírito Santo (Apes).
Doutora em Educação, membro do Conselho Regional de Psicologia (CRP) e psicóloga do Ifes, Suzana Maria Gotardo Chambela aponta outro problema. Há uma exigência permanente de ser melhor do que o outro, de que as coisas que faz não são suficientes. Então, a sensação é de que não se pode descansar nunca, senão fica para trás. Resumindo: tudo é competição.
Esse espírito competitivo, afirma Suzana, muitas vezes é estimulado desde bastante cedo dentro das famílias. É o filho que, aos dois meses, já levanta o pescoço enquanto outras crianças não conseguem; ou que aos dois anos sabe todas as cores porque os pais ficaram repetindo insistentemente até que aprendesse.
O modo como nós, adultos, estamos lidando com a vida, as expectativas em relação aos filhos e a nós mesmos, também acaba transmitindo para as crianças a ansiedade, acrescenta.
O papel dos pais é fundamental, reforça Adriana Muller, psicóloga e comentarista da Rádio CBN Vitória. Ela afirma que, na educação, não faz bem às crianças nem que sejam permissivos, nem rigorosos demais.
O primeiro grupo porque não permite que os filhos se frustrem e, assim, não desenvolvem habilidades para lidar com as dificuldades que vão encontrar pela vida. O segundo grupo porque gera uma expectativa alta e a frustração é exagerada, proporcional ao desejo criado. Eles frustram o tempo todo e impedem os filhos de desenvolver a superação. Eles criticam muito, julgam e essa criança vai crescendo achando que não dá conta de nada, destaca Adriana.
Bullying e a dificuldade de integração nos grupos também contribuem para quadros de ansiedade, segundo explica o doutor em Psicologia e professor da Ufes, Elizeu Borloti.
O adolescente está construindo sua identidade e o fato de ser excluído de um grupo, ou rejeitado, gera uma crise de identidade: se não sou mais aquilo, a quem eu pertenço, qual a minha turma?. Esse é um fator estressante, ressalta.
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