Publicado em 22 de julho de 2019 às 01:06
No hospital, os médicos me chamavam de fantasma. Uma pessoa que chega lá como eu cheguei dificilmente sobrevive. O relato é de Antônio Carlos Barreiro Inácio, de 45 anos. Em 22 de outubro do ano passado, um carro cruzou a Rodovia do Contorno, em Cariacica, sem olhar para os lados e acabou atingindo a moto em que ele estava. Antônio trabalhava na construção civil e estava indo para o serviço quando aconteceu o acidente. O saldo do impacto foram oito costelas quebradas e um braço estilhaçado, que pode nunca mais recuperar os movimentos.>
A colisão no trânsito envolvendo Antônio, como todas aquelas que acontecem quando a pessoa está a caminho do serviço, contaria como acidente de trabalho. Segundo dados do Ministério Público do Trabalho (MPT-ES), as ocorrências com motos foram as principais causas de acidentes de trabalho em seis municípios, incluindo Cariacica. Por lá, foram 105 em 2018. Mas esse número pode ser bem maior: Antônio, como muitos trabalhadores que não têm carteira assinada, não entrou na estatística.>
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Por conta disso, ele não pôde requerer o auxílio financeiro e hoje a renda da família vem do trabalho da esposa dele. Muitas vezes o acidente de moto incapacita. Se o trabalhador não tem a proteção previdenciária, ele cai na indigência, afirma o procurador-chefe do MPT-ES, Valério Soares Heringer.>
No ano passado, os acidentes de moto também foram as principais causas de acidentes de trabalho em Cachoeiro, Linhares, São Mateus, Guarapari e Viana.>
Tendo carteira, a previdência paga ao trabalhador um benefício a partir do 16º dia de afastamento. Sem vínculo formal, não há garantia nenhuma, avalia o procurador. Ele explica que além de o trabalhador informal ficar sem assistência financeira, ele acaba onerando a saúde pública e a economia como um todo, já que a maioria dos incapacitados estão em idade produtiva.>
SEGURO>
Dados da Seguradora Líder, administradora do seguro DPVAT, apontam que para cada seguro pago em caso de morte de motociclista, outros dez são pagos a pessoas que tiveram invalidez permanente. Informações da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) aponta que o Centro de Reabilitação Física do Espírito Santo (Crefes), atende, em média, 200 pacientes por mês que se envolveram em acidentes com motocicletas.>
APLICATIVOS>
Mesmo que o número de mortes de motociclistas tenha se mantido relativamente estável na Grande Vitória nos últimos anos, é grande a preocupação de que eles voltem a subir com a popularização dos aplicativos de entrega.>
Só até julho deste ano, o Serviço e Atendimento Móvel de Urgência (Samu), que atende principalmente os municípios das regiões Metropolitana da Grande Vitória e Serrana, já atendeu mais de 4,4 mil ocorrências de trânsito envolvendo motocicletas. O número já representa 67% do total registrado em todo o ano passado e é maior do que todos os atendimento do tipo feitos em 2016.>
A cada dia que passa, temos mais a presença do trabalho por aplicativo, sem vínculo de emprego e que, muitas vezes, não recolhem o INSS. Quando se acidentam, ficam fora da proteção previdenciária, afirma o procurador-geral.>
JORNADAS>
Ele avalia ainda que muitos desses motociclistas acabam tendo que trabalhar além do que podem, fazendo horários longos e jornadas exaustivas pois recebem por produção.>
Essa modalidade de vínculo é precarizante, desprotege demais o trabalhador. Ele fica a mercê de uma organização que nem nunca viu, diz.>
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