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'A lenda de que a água é bem inesgotável já foi completamente desmontada'

"A lenda de que a água é bem inesgotável já foi completamente desmontada"

Presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco vai participar de encontro dos comitês capixabas, em Vitória, na quinta

Publicado em 25 de junho de 2019 às 00:58

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Mesmo depois de enfrentar uma difícil crise hídrica no país, há dois anos, a ideia de que a água é um recurso que nunca acaba ainda é muito presente na sociedade. Segundo o presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco, Anivaldo Miranda, a água é um recurso finito, sobretudo a de qualidade. À frente do comitê de uma das maiores bacias do Brasil – que atravessa três regiões do país –, Anivaldo vai participar de um debate em Vitória, na próxima quinta-feira (27) para compartilhar as boas experiências de gestão dos recursos hídricos.

O debate faz parte do 3º Encontro dos Comitês de Bacias Hidrográficas do Espírito Santo que vai ser realizado no auditório da Rede Gazeta, a partir de 8h30. Confira abaixo a entrevista com Anivaldo sobre os desafios relacionados ao uso indiscriminado da água.

Quais as principais características da bacia do Rio São Francisco?

Nossa bacia é muito grande e representa quase 8% do território nacional, com uma população de quase 18 milhões de pessoas. A bacia passa por uma parte pequena do Distrito Federal e de Goiás, além de partes significativas de Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Sergipe e Alagoas. Ao todo, são 507 municípios inseridos na bacia. Estamos em três grandes biomas: o Cerrado, a Caatinga e a Mata Atlântica, na parte mais litorânea.

Qual é o papel do comitê?

Existem diversas explorações minerárias que são bombas relógios afetando diretamente o leito do Rio São Francisco. Há mineração de ferro, de ouro e também outras barragens de rejeitos industriais. Estamos sempre preocupados porque elas possuem potencial de risco e de dano. Nossos cuidados incluem fazer um inventário de todas as barragens e deixar claro quais são seus potenciais de risco e de dano para assim exigir as medidas para torná-las absolutamente seguras. O Rio São Francisco tem uma missão única no Brasil porque é o único que atravessa nossa região semiárida e ele representa 70% da região hídrica do Nordeste. O Espírito Santo sabe o que é estar inserido na região semiárida. Não podemos admitir a possibilidade de acontecer com o São Francisco o que houve com o Rio Doce.

Mas, então, é cobrado o uso da água na região da Bacia São Francisco?

A população paga, na verdade, pelo uso da água tratada em suas residências. Essa é uma outra água. O uso da água bruta só pagam usuários de áreas como indústrias, a agricultura, navegação, hidrelétricas, companhias de abastecimento. Os comitês só tratam da cobrança da água bruta dos corpos hídricos, seja dos rios ou água subterrânea.

Qual é o valor?

Há uma linha de corte que estabelece isenção para aqueles usuários que captam menos do que quatro litros por segundo. Isso é justamente para isentar a agricultura familiar. No caso da Bacia do São Francisco, os usuários que consomem acima de quatro litros por segundo são obrigados a pagar. Esses preços são estabelecidos mediante um estudo bastante complexo. Para cada uso há uma cobrança diferente.

Como foi o processo de implementação da cobrança?

Nosso processo foi em 2010. Demoramos de dois a três anos para conseguir implementar. A cobrança foi feita conforme o sistema de outorgas da Agência Nacional de Água que cadastrou os principais usuários e a partir daí começamos a cobrança. O Brasil precisa de um choque de gestão. Existia a impressão de que a água é um bem infinito e inesgotável, mas essa lenda já foi completamente desmontada. Na realidade a água é um recurso finito, sobretudo a água de qualidade, principalmente a subterrânea.

Para onde vai o dinheiro arrecadado?

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Cabe ao comitê aprovar o plano de gestão de cada bacia e estabelecer o preço pelo uso da água bruta. O conselho nacional aprova os valores e a Agência Nacional de Água é a responsável em emitir os boletos. A agência, por sua vez, devolve o dinheiro arrecadado para os comitês. Com esses recursos podemos financiar pesquisas desde que sejam de interesse da gestão dos recursos hídricos. São feitos estudos de aquíferos, de política de vazões, e diagnósticos de corpos hídricos, também é possível financiar simpósios científicos ou reuniões institucionais ordinárias. Os comitês são espaços heterogêneos onde todos se encontram. Ao invés de cultivar a cultura do conflito, os comitês servem para que se tenha diálogo, para construir consensos e uma gestão compartilhada.

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