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Com juros negativos, quem aplica na poupança pode perder dinheiro

Com juros negativos, quem aplica na poupança pode perder dinheiro

Deixar até a reserva financeira para uma emergência na tradicional caderneta virou um mau negócio. Em vez de render, os recursos podem perder valor. Entenda o porquê e o que fazer

Publicado em 6 de agosto de 2020 às 12:56

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Juros
Juros estão negativos, após queda da Selic de 2,25% para 2% ao ano. (Pixabay)

A nova queda na Selic, a taxa básica de juros, anunciada nesta quarta-feira (5) pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, vai beneficiar o governo, reduzindo o tamanho da dívida pública, mas não será tão positiva para o investidor. Segundo especialistas, quem tem dinheiro aplicado em renda fixa (como poupança e tesouro direto) e antes ficava no "zero a zero", pode começar a perder dinheiro. Isso porque, uma vez descontada a inflação, o rendimento real será negativo pelos próximos 12 meses.

Cálculo da Infinity Asset mostra que o Brasil deve ter um juro real negativo em 0,71% nos próximos 12 meses. Segundo especialistas, neste novo cenário, para que o colchão financeiro não perca valor, o investidor precisa buscar aplicações que rendam acima da inflação projetada para este ano.

Pelas regras do Banco Central, quando a taxa de juros está igual ou abaixo de 8,5% ao ano, a caderneta tem rentabilidade de 70% da Selic mais a TR (zerada no momento). Com isso, o atual retorno anual é de apenas de 1,40% ao ano, sem considerar o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

Mas, ao subtrair a rentabilidade da poupança com  o percentual da inflação oficial do país, prevista para 1,63% neste ano, segundo os analistas de mercado ouvidos no Boletim Focus, chega-se a um rendimento negativo de  0,23%.

Dessa forma, quem mantém o dinheiro na caderneta pode ter perda do poder de compra. E a situação deve ficar ainda mais difícil para quem usa esse sistema para criar uma reserva. O Banco Central sinalizou que deve manter a taxa nesse patamar, mas se mostrou aberto a novos cortes para reanimar a economia, que foi bastante atingida pela pandemia do novo coronavírus.

"A Selic é o que o governo federal vai me pagar naquele título público. Se a inflação for maior, estarei tendo perda real no poder de compra. As pessoas acabam tendo que migrar para opções do mercado de renda variável, que precisa ter muito conhecimento", avalia o economista Eduardo Araújo. 

Para não errar no mercado de capitais, o especialista recomenda que quem tem dinheiro para investir procure orientação profissional antes de se arriscar.

O planejador financeiro Renan Lima, da Alphamar Investimentos, explica que neste período, com a menor taxa de juros da história, a saída é buscar a diversificação.

Segundo ele, um jeito é aumentar a exposição no mercado de ações, principalmente neste período em que a Bolsa aponta sinais de recuperação. No entanto, ainda é necessário projetar as aplicações para um horizonte de longo prazo e também ter parte dos recursos alocados em renda fixa.

"Para a aplicação de curto prazo, não tem para onde correr a não ser para uma renda fixa pós-fixada mais arriscada, com 150% do CDI, algo até difícil de encontrar. O brasileiro terá que conviver com juros baixos em aplicações com segurança e liquidez." No longo prazo, ele indica os títulos do Tesouro Direto, pré-fixado ou atrelado ao IPCA.

De acordo com o economista Daniel Vieira em um ano de crise, os investidores partem para operações consideradas mais seguras; mas ele recomenda a diversificação do portfólio.

“Nesse primeiro semestre o dólar e o ouro foram os ativos mais rentáveis no Brasil, com valorizações da ordem de 36% e 53%, respectivamente, na primeira metade do ano. Quando o Brasil teve o primeiro caso de Covid-19 confirmado, o dólar subiu 24,3% em comparação a nossa moeda, o real”, disse.

Ele ainda explica que o contrato do ouro negociado na Bolsa brasileira (de 250 gramas) disparou. "É importante frisar que esse investimento é interessante, principalmente para investidores com perfil mais conservador, já que este é um ativo de baixo risco, e que em momentos de crise como o atual, tende a se valorizar."

AMARGO PARA O POUPADOR, MAS REMÉDIO PARA AS CONTAS PÚBLICAS

Grosso modo, a Selic é a taxa de juros que o governo tem que pagar a quem empresta dinheiro para ele. E os gastos com a pandemia de coronavírus obrigaram o Brasil a tomar cada vez mais empréstimos. Por essa razão, é estimado que o endividamento alcance 98% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2020. No ano passado, a dívida estava em 76,6% do PIB.

"O impacto dessa alteração é positivo para finanças públicas, porque temos uma redução significativa da dívida pública. Isso tenta compensar um pouco a alta das despesas deste ano por conta da pandemia", afirma o economista Eduardo Araújo.

Segundo Araújo, a nova redução nessa taxa ajuda a manter um certo equilíbrio na dívida bruta do governo federal.

Outra consequência da baixa Selic é a fuga de capital estrangeiro. Como agora os juros oferecidos pelo Brasil se aproximaram aos de outros países, principalmente da Europa e os Estados Unidos, é esperado que os investidores optem por aplicar seus recursos em locais mais "seguros".  

"Antes, ele (o investidor) colocava dinheiro no Brasil porque pagava 10% e os americanos pagavam 1%. Como agora estamos muito parecidos com Europa, EUA e Ásia, ele vai pensar em ir para onde tem menos risco. E o Brasil sai dessa lista", esclarece o economista Antônio Marcus Machado. 

Ele lembra que o Brasil sempre foi conhecido por ter a taxa básica de juros mais alta, e essa é uma situação inédita. "Ninguém imaginava isso nas últimas décadas. Sempre tivemos a Selic alta para combater a inflação. Como o consumo caiu, naturalmente por conta da pandemia, do desemprego e da própria queda de demanda, ela perdeu essa finalidade", afirma.

Segundo Machado, como não vale mais a pena emprestar dinheiro para o governo e receber só 2%, os bancos ficam mais propensos a colocar dinheiro no mercado, fazendo empréstimos para pessoas e empresas. Essa seria uma boa estratégia para impulsionar a recuperação econômica, acredita o especialista.

Contudo, o economista lembra que as taxas de juros praticadas pelas instituições financeiras (cartão de crédito, empréstimo pessoal, etc) não devem acompanhar a nova queda da Selic, como não acompanharam até o momento. "O risco aumentou e o mercado é extremamente concentrado, só há quatro ou cinco grandes bancos, e que não precisam realizar lucro de imediato", diz.

Ambos economistas acreditam que a tendência de queda da Selic não deve continuar, justamente para evitar os efeitos negativos de uma taxa de juros muito baixa. Em relatório, o Copom indicou que a Selic deve seguir no mesmo patamar nas próximas reuniões, mas deixou espaço para outros cortes.

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