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Quilinhos a mais na quarentena: o que dizem os especialistas

Quilinhos a mais na quarentena: o que dizem os especialistas

Menos disposição para exercícios físicos, mais carboidratos, delivery e uma alimentação menos regrada. Mas afinal, já é o momento para pensar em emagrecer?

Publicado em 10 de julho de 2020 às 19:01

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O isolamento social e o ganho de peso
O isolamento social e o ganho de peso. (Pexels)

Para muitos, já são quatro meses em casa. Devido ao isolamento social imposto pelo crescimento de casos do novo coronavírus, a rotina mudou e os quilinhos a mais bateram à porta: menos disposição para exercícios físicos, mais carboidratos, delivery e uma alimentação menos regrada. Mas afinal, já é o momento para pensar em emagrecer? 

Segundo a psicóloga clínica, mestre em Psicologia e especialista em Análise do Comportamento, Livia Maulaz, para a maioria das pessoas, engordar será uma consequência natural do isolamento social e este não é o melhor momento para pensar em tentar emagrecer. Isso porque abrir mão de um dos poucos prazeres disponíveis pode ser perigoso e também pode acabar afetando a saúde mental.

"Esse não é um momento bom para emagrecer. Estamos engordando e indo para o quarto mês de isolamento, sem previsão das coisas voltarem ao normal. Mudamos bruscamente o ritmo, a vida social, estamos ficando em casa, a gente acaba se alimentando de outra forma, fica mais exposto à cozinha, à geladeira, fazendo um doce gostoso também. Esse não é o momento de tirar um dos poucos prazeres que temos, que é o de comer coisas gostosas e interagir com as pessoas da nossa casa. Se a gente tira isso, a gente anula outra fonte de prazer, além de todas as outras que não estamos podendo ter agora", explica.

Apesar disso, o ideal não é o exagero. "Não é para se entupir de coisas não nutritivas, mas a restrição alimentar é perigosíssima nesse contexto. Permita-se comer uma coisa gostosa uma vez ou outra, se preocupe em fazer uma alimentação minimamente semelhante ao período anterior à quarentena, com almoço saudável, café da manhã, comendo frutas e legumes. Mas não entre em restrição alimentar, porque a gente não está falando somente sobre estética, estamos falando sobre saúde mental e uma restrição pode gerar mais tensão, mais ansiedade e até desencadear uma depressão", alertou.

INSATISFAÇÃO

A dona de casa Renata Lira, de 37 anos, que mora em Vitória, conta que sempre brigou com a balança, mas que se manteve ativa nos últimos anos, praticando musculação e luta. "Tenho um filho de 6 anos e, desde que ele tinha 1 ou 2 anos, eu comecei a cuidar de mim. Mantive uma dieta low carb, perdi aproximadamente 15 quilos na época e foquei em atividade física regular. Antes de começar a pandemia, eu havia voltado na nutricionista e cheguei a emagrecer 4kg. Depois disso, já ganhei 6kg", iniciou.

História semelhante é contada pela secretária Ingrid Porto Nascimento, de 37 anos. Ela afirmou que, desde março, engordou 8kg. "Eu atribuo esse peso mais à ansiedade em estar dentro de casa, fora das minhas atividades diárias, com uma completa mudança na rotina. Acho que a preocupação em não contrair o vírus, preocupação em especial com os familiares, desencadeou isso. Eu fazia atividade física, mas com a quarentena voltei a ficar sedentária", disse.

Ingrid Porto Nascimento conta que ganhou 8kg desde março
Ingrid Porto Nascimento conta que ganhou 8kg desde março. (Arquivo pessoal)

Com um ganho mais significativo de peso, o gastrônomo Eduardo Romanello, de 32 anos, explicou que ficar parado em casa, sem trabalhar, testando receitas e comendo mais do que de costume, o levaram aos 12kg a mais. "No meu trabalho como cozinheiro, a gente sempre estava ativo, então ajudava a queimar calorias. Em casa, sem poder fazer nada, fico ocioso e acabo testando receitas e comendo muito. Ocasionalmente, com a falta de trabalhar, larguei a academia também", contou.

ANSIEDADE

Seja qual for o caso, um fator chama à atenção: tanto Renata, quanto Ingrid e Eduardo afirmaram se sentir ansiosos diante do novo contexto em que vivem. Nesse sentido, a psicóloga clínica, mestre em Psicologia e especialista em Análise do Comportamento, Livia Maulaz, explica que o momento de isolamento dos amigos e da família acaba por causar a restrição das fontes de prazer a que os indivíduos tinham acesso e que isso pode acentuar a ansiedade e fazer com que as pessoas "descontem" na comida.

De acordo com ela, comer também é uma importante fonte de prazer. "O isolamento restringe demais as nossas fontes de alegria, como sair com os amigos, tomar uma cervejinha, ir a festas, bares, cafeterias, variadas situações que fazem parte do nosso cotidiano. Então a gente acaba comendo mais, já que essa também é uma fonte de prazer, fora a questão da possibilidade de exercício físico, já que mudamos muito a nossa rotina", afirmou.

Como sugestão, a especialista traz a possibilidade de tentar ter um controle maior sobre a alimentação, mas tudo isso sem cobrança em excesso. 

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Na verdade é difícil falar em aliviar a tensão, porque estamos com o repertório bastante reduzido de formas de prazer. Sugiro tentar dosar, ter um controle maior, não comer chips ou lanche todos os dias, mas se permitir fazer isso de vez em quando. Pedir um lanche uma vez por semana ou a cada 15 dias, se permitir um dia em que você vai comer sem culpa, relaxar, fazer receitas gostosas, é uma forma de passar o tempo na quarentena

Livia Maulaz
Psicóloga clínica, mestre em Psicologia e especialista em Análise do Comportamento
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A especialista conta ainda que tem recebido reclamações no consultório, sobre o ganho de peso. No entanto, quando os pacientes tentam uma dieta mais rígida, acabam sentindo frustração e, somado a isso, quando não conseguem se manter no programa alimentar mais restritivo, acabam ficando ainda mais frustrados e piorando a forma como se relacionam com a comida.

ROTINA ALIMENTAR

De acordo com a nutricionista e comentarista da CBN Vitória, Roberta Larica, a comida, em tempos de isolamento social, tem sido encarada como o conforto que faltava. "Acredito que, no período inicial do isolamento, as pessoas relaxaram na alimentação como uma maneira de buscar o conforto que faltava, já que a comida tem vínculo afetivo para algumas pessoas e para outras acaba também servindo como válvula de escape para o estresse e para a ansiedade", disse.

Junto ao isolamento social vem a falta de rotina e muitos pacientes que têm sido atendidos pela nutricionista apresentam dificuldades em relatar a própria rotina alimentar. 

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Em geral, estão acordando tarde, dormindo de madrugada e fazendo refeições em horários totalmente fora da rotina. A falta de planejamento muitas vezes vem acompanhada de escolhas não saudáveis, pois muitas vezes as pessoas comem o que tiver na geladeira ou pedem algo nada saudável no delivery

Roberta Larica
Nutricionista e comentarista da CBN Vitória
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Outro fator que Larica enumerou foi o de as pessoas, em casa, estarem mais sedentárias. "Estamos mais parados, mais sedentários e isso gera um menor gasto energético, o que por si só já poderia gerar um aumento de peso. Então, se unir a comidinhas mais calóricas, como pães, bolos, doces, massas e bebida alcoólica, o resultado será de fato alguns quilinhos a mais no final do mês. Agora que essa situação vem se estendendo já para o quarto mês, muitos pacientes têm me procurado com foco em emagrecer e cuidar da imunidade, já que a obesidade é um fator de risco para complicações de saúde, então não podemos abrir mão desse cuidado", reforçou.

DICAS DA NUTRICIONISTA

Para Roberta Larica, o segredo para passar por esta fase sem grandes insucessos na dieta é construir uma nova rotina, com o planejamento das compras, incluindo variedades de alimentos saudáveis em casa, além da opção de congelar alimentos para aumentar a praticidade e manter uma alimentação saudável ao longo da semana.

Além disso, a nutricionista também recomenda a prática de atividades físicas. "Construir uma rotina em casa que inclua atividade física, nem que seja na varanda ou pela internet, de exercícios de meditação ou respiração, que ajudam a combater o estresse e a ansiedade com as obrigações profissionais e domésticas. É importante ter um momento para fazer algo que você goste e respeitar os horários de dormir e acordar. Isso já é um enorme passo! E não se esqueça, cuidar da saúde é a melhor arma que você pode ter contra esses inimigos invisíveis", concluiu.

Resumindo, as sugestões são:

  • 01

    Construir uma nova rotina;

    Aposte em uma alimentação equilibrada, com horários definidos, e em exercícios em casa

  • 02

    Planejar as compras de supermercado;

    Inclua variedades de alimentos saudáveis na lista

  • 03

    Congelar refeições

    Desse modo, é possível garantir a praticidade, economizando tempo

  • 04

    Manter hábitos saudáveis durante a semana

    Incluindo a prática exercícios de meditação ou respiração, que ajudam a combater o estresse e a ansiedade

RELATO DE UMA MÃE NA QUARENTENA

Renata Lira conta que o grande desafio nesta quarentena tem sido o de ajudar o filho nas atividades escolares, que agora são realizadas online. Com isso, sobra menos tempo para se cuidar. "Antes eu estava fazendo massagem redutora, atividade física mais intensa e focando na alimentação. Justamente quando eu consegui um peso legal para voltar à nutricionista e fazer os exames, caímos na pandemia. Meu filho está só nas matérias online, então, como meu marido trabalha muito, fico por conta da casa e do Bernardo".

Renata Lira havia emagrecido 4kg antes da pandemia
Renata Lira havia emagrecido 4kg antes da pandemia. (Arquivo pessoal)

Ela disse que na primeira semana do distanciamento social ainda conseguia manter atividade física em casa, como pular corda ou ver aulas online, mas com o tempo, veio o misto de ansiedade e tristeza, somados à incerteza da duração da pandemia. "Eu tentei segurar da melhor maneira. Estudo com meu filho na parte da tarde toda, fazendo as atividades da aula dele. De manhã eu fico por conta da casa, faço a comida, mas não estou tendo tempo para fazer exercício em casa e não tenho ânimo. Não consigo pegar uma corda, fazer aula de 15 minutinhos gravada, não tenho gosto pra isso, dentro de casa não dá. E não estou indo ao calçadão, estamos praticando isolamento social de verdade aqui em casa", afirmou.

Renata diz que também passou a consumir alimentos que não comia antes. "Não estava comendo massas e passei a comer, pizza tinha muito tempo que não comia, doces também. E acabei pedindo muito no delivery. Comecei a comer mais até para ajudar estabelecimentos. Nem estou pesando regularmente porque estou ficando estressada com isso. Eu vou emagrecer, tenho certeza, mas infelizmente sei que não vai ser agora. Enquanto meu filho não voltar para estudar, tiver a vida mais ou menos normal de ir para a escola e eu ter a tarde para mim, eu não vou conseguir praticar atividade nenhuma", finalizou.

PROJEÇÕES PARA O FUTURO

Eduardo Romanello contou que apesar de agora ter engordado, em pouco tempo, cerca de 12kg, sempre esteve acima do peso. "Sou bastante compulsivo. Mas como trabalhava bastante e fazia exercícios, conseguia manter meu peso. Não emagrecia, mas também não engordava mais. Agora eu pretendo correr atrás do prejuízo. Não estou satisfeito com meu peso atual, principalmente porque minhas roupas não cabem mais, mas também não vou parar de comer. Pretendo tentar fazer algum tipo de exercício para perder o que ganhei: andar no calçadão, por exemplo", relatou.

Eduardo Romanello é formado em Gastronomia
Eduardo Romanello é formado em Gastronomia. (Arquivo Pessoal)

Assim como Eduardo, Ingrid Nascimento também se considera compulsiva. "Essa compulsão acontece quando me vejo em situações de preocupação, até porque, tenho um filho de 7 anos e, junto com ele na quarentena, foi difícil manter uma rotina mais saudável. Eu já tive problemas para manter o peso antes, mas nunca foi tão difícil como agora. Estou insatisfeita, não só pela estética, mas pela qualidade de vida também. Como voltei com a minha rotina de trabalho, após três meses em casa, pretendo reeducar a minha alimentação. De início será isso, pois ainda não me sinto segura em voltar à academia e até mesmo em fazer uma caminhada no calçadão", ponderou.

FAZER DIETAS DURANTE A QUARENTENA PODE AFETAR O SISTEMA IMUNOLÓGICO?

A pandemia do novo coronavírus trouxe à tona maior preocupação com a nossa imunidade, que pode ser decisiva durante o tratamento de doenças, além da Covid-19. A preocupação gera uma busca por revigoramento da saúde. Mas afinal, fazer dietas durante a quarentena pode afetar de forma negativa o sistema imunológico? Nutricionista e comentarista do quadro Boa Mesa CBN, da Rádio CBN Vitória, Roberta Larica ressalta que o sistema imunológico pode ficar fraco por desequilíbrios causados por medidas drásticas durante a dieta.

Larica afirmou que existem várias formas de executar uma boa dieta e que alterações mais acentuadas na rotina alimentar devem ser acompanhadas por um profissional. "O que deve ser feito é reduzir no geral. Tudo com equilíbrio. Mudanças mais leves não precisam de acompanhamento de profissionais, muitas vezes", disse.

Ela deu ênfase ao equilíbrio durante a dieta. "A gente pode emagrecer, mas isso precisa ser devagar, de forma equilibrada. Sair cortando frutas e outros grupos de alimentos não é o melhor caminho. Corte aos poucos as calorias, evoluindo. E tenha cuidado ao promover reduções".

Um dos hábitos mais populares é o jejum, que propicia a privação de refeições durante um período do dia. Segundo a nutricionista, a atitude, feita de forma desequilibrada, pode causar a tão temida queda na imunidade.

Roberta Larica ainda explica que corte de frutas não deve ocorrer, já que são fontes de substâncias que provocam benefícios anti-inflamatórios. De acordo com a nutricionista, você pode preferir determinadas frutas, conforme a quantidade de açúcar, mas precisa realizar a ingestão desse grupo de alimento.

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