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Publicado em 16 de dezembro de 2025 às 11:58
A esperança para quem perdeu o movimento e hoje convive com a tetraplegia ou a paraplegia está diante de novos caminhos e possibilidades. Esse é o caso de Luiz Fernando Mozer, colorimetrista e pintor automotivo, morador de Iconha, que sofreu um acidente no dia 7 de dezembro durante um evento de motocross em Vargem Alta, município da Região Serrana do Espírito Santo, a cerca de 125 quilômetros da capital. Luiz teve uma lesão contundente na coluna e na medula, perdendo o movimento das pernas. A ele foi administrada a polilaminina, no último dia 13, no Hospital Santa Casa de Misericórdia de Cachoeiro de Itapemirim. >
Por se tratar de uma intervenção recente, as expectativas ainda são cautelosas. Em outros casos clínicos acompanhados no Brasil, a medicação — que ainda está em fase de pesquisas científicas — apresentou resultados considerados promissores. O principal entrave, no entanto, segue fora do campo médico: a falta de autorização por parte da Anvisa e, consequentemente, a não incorporação do tratamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS). >
A polilaminina é uma substância desenvolvida a partir de uma proteína extraída da placenta. Segundo as pesquisas em andamento, essa proteína apresentaria potencial para estimular a regeneração da medula espinhal - um tecido altamente sensível, cuja capacidade natural de recuperação é limitada.
Segundo o médico Olavo Borges Franco, pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a condução do trabalho é liderada pela pesquisadora Tatiana Coelho de Sampaio, também da UFRJ, responsável pelas pesquisas na área. Ambos integram a equipe que desenvolve o estudo. >
De acordo com Olavo, o caso de Luiz Fernando é o mais grave entre todos os já atendidos pelo grupo. “O caso dele é muito grave. A condição é uma lesão medular completa. Isso que se chama de lesão medular completa não é necessariamente que você tenha rompido toda a medula, mas que você tenha a completa perda funcional da medula. A função da medula é ligar o cérebro ao resto do corpo. Então, se você interrompe a passagem de informações do sistema nervoso ali, a pessoa perde as duas funções, que é a motora e a sensitiva. No caso do Luiz, a lesão foi mais grave porque ele teve uma transecção - uma ruptura - total da medula e a própria coluna. O osso quebrou. (...) Mas funções vitais dele sempre ficaram preservadas: circulação, coração, a respiração. Ele recebeu depois a medicação. Dos que receberam a medicação, todos ganharam funções motoras. (...)”.>
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Após a aplicação da medicação, o médico ainda não tem autorização para falar sobre a evolução do quadro clínico de Luiz. Em razão da gravidade, o médico aponta: “Diante de uma lesão medular completa qualquer, mesmo aquela que não tem a descontinuação anatômica da medula, as chances de retorno à função motora é muito limitada. A última meta-análise que eu vi gerava em torno de 9% de algum ganho motor, e esses ganhos normalmente são muito incipientes”. Ainda de acordo com ele, “a ideia é que seja disponibilizado no SUS e a um custo muito acessível”.>
A articulação para que o tratamento se tornasse possível partiu de dentro da família. A irmã de Luiz Fernando, Carla Mozer, enfermeira de centro cirúrgico, soube da existência da medicação e foi uma das responsáveis por viabilizar o encontro - e a cirurgia - junto à equipe de pesquisa. “A gente soube da possibilidade de usar a polilaminina no meu irmão assim que o diagnóstico real veio. Meu irmão sofreu o acidente num domingo; na segunda-feira eu tive a confirmação de que era uma lesão medular completa e irreversível. Foi um diagnóstico muito pesado de ouvir, mas me dispus a estudar também a lesão do meu irmão.”>
Carla entrou em contato com outro paciente que havia recuperado os movimentos, Bruno Drummond, que a colocou em contato com a equipe da professora Tatiana. Inicialmente, Luiz não seria contemplado com a medicação, já que a pesquisa da universidade carioca estava oficialmente encerrada. A família recorreu à Justiça, mas teve o pedido negado em primeira instância.>
A autorização judicial só foi concedida na quinta-feira anterior à aplicação do medicamento, no dia 11 de dezembro. Dois dias depois, no dia 13, a administração foi realizada. Até então, não havia previsão de tratamento para Luiz, justamente em razão da gravidade do quadro>
Carla Mozer
Enfermeira e irmã de Luiz FernandoProcurada pela reportagem, a Secretaria de Estado da Saúde do Espírito Santo (Sesa) afirma que a substância ainda não conta com o aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), condição indispensável para qualquer oferta pública em larga escala.>
“O medicamento denominado polilaminina está em fase de pesquisas e ainda não tem autorização da Anvisa para utilização com segurança; para isso, deve cumprir todas as fases de estudo necessárias até que possa ser disponibilizado em larga escala.”>
A Secretaria acrescenta que não há qualquer previsão de incorporação do tratamento à rede pública estadual. “Não procede informação sobre anúncio de incorporação do medicamento ao Sistema Único de Saúde (SUS) capixaba. O caso mencionado em Cachoeiro de Itapemirim trata-se de uma situação judicializada, conduzida sob determinação da Justiça.”>
Na sequência, o órgão ressalta: “A Sesa informa ainda que a judicialização da saúde impacta diretamente na organização dos serviços e no orçamento da gestão pública, uma vez que determina o atendimento de demandas específicas fora do planejamento, pois aquisições realizadas por meio judicial tendem a ser mais onerosas para o Estado, elevando significativamente os custos.”>
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