Perereca-Pixinguinha: espécie nova foi encontrada em Santa Teresa
Perereca-Pixinguinha: espécie nova foi encontrada em Santa Teresa. Crédito: Domínio público / Acervo Arquivo Nacional

Conheça a perereca-Pixinguinha, nova espécie descoberta no ES

Espécie foi encontrada na área de Mata Atlântica de Santa Teresa, região serrana do Estado; o macho muda de cor à noite, o que a diferencia de outras pererecas encontradas no mundo

Vitória / Rede Gazeta
Publicado em 29/06/2021 às 19h32

Uma nova espécie de perereca foi descoberta no município de Santa Teresa, região Serrana do Espírito Santo. O animal, cujo nome científico é Scinax pixinguinha, foi carinhosamente batizado como perereca-Pixinguinha, como homenagem a um dos expoentes do chorinho, tradicional ritmo musical brasileiro derivado do samba. A perereca é exclusiva da Mata Atlântica e, mais precisamente, é encontrada apenas em Santa Teresa, até então.

Um dos pesquisadores que descobriram a nova espécie foi João Victor Lacerda, do Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA) e membro do Projeto Bromeligenous, focado exclusivamente na conservação de anfíbios que vivem nas plantas Bromélias. Ele explicou que Santa Teresa é uma região que possui grande diversidade de sapos, rãs e pererecas, sendo referência mundial neste grupo de animais.

"O capixaba não se dá conta da riqueza que Santa Teresa representa. É um dos municípios no planeta inteiro que tem maior número de espécies, maior diversidade de sapos, rãs e pererecas. Então, tem um histórico de pesquisa desse grupo há algum tempo, pesquisadores visitantes ou aqui da região visitam Santa Teresa para tentar descobrir espécies. Há dois anos estou aqui desenvolvendo um projeto, vim fazer uma parceria com o projeto Bromeligenous e sou pesquisador pelo INMA", contou.

Espécie encontrada apenas no ES homenageia um dos expoentes do chorinho
Espécie encontrada apenas no ES homenageia um dos expoentes do chorinho. Crédito: João Victor Lacerda

João Victor explicou que os pesquisadores do projeto fazem muito trabalho de campo, para procurar entender melhor sobre as espécies de anfíbios encontradas na região de Santa Teresa. Por isso, segundo o pesquisador, é comum se deparar com animais os quais não são possíveis de serem identificados de imediato. Quando isso acontece, os pesquisadores passam a ter um dever de casa.

"A gente visita coleções científicas para comparar esse exemplar com outros exemplares, para tentar identificar. A gente teve dificuldade de identificar, vimos que as características que estávamos observando nesses indivíduos que coletamos em campo não batiam com as descrições das demais espécies que a gente sabe que ocorrem em Santa Teresa. E a gente também não achava nenhuma outra espécie exatamente igual a essa", disse.

A principal dúvida dos pesquisadores era se aquela não seria uma espécie que está presente em outra área da Mata Atlântica, mas que nunca havia sido vista em Santa Teresa. A partir disso, João detalhou que a equipe começou a relacionar o animal coletado com outras espécies de diferentes áreas.

"A gente tem uma série de ferramentas que a gente usa pra comparações, que vão desde medições, comparação de estruturas morfológicas, a gente compara o canto também, que tem uma série de parâmetros físicos que servem para identificar uma espécie... mesmo assim, a gente não estava conseguindo enquadrar esse achado nosso na descrição de nenhuma outra espécie que ocorresse na Mata Atlântica ou de nenhuma outra espécie que ocorresse no Brasil", contou.

João Victor Lacerda

Pesquisador do  Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA) e membro do Projeto Bromeligenous

"Então, começamos a suspeitar: talvez estejamos diante de uma nova descoberta. Um novo registro para o planeta inteiro, para a ciência. E foi exatamente o que aconteceu"

Depois das pesquisas, João contou que a equipe voltou a campo e encontrou mais indivíduos da espécie. Para ele, isso foi positivo, pois foi possível tirar fotos dos exemplares para permitir a publicação do registro da nova espécie. A catalogação na revista internacional Copeia (Ichthyology & Herpetology), publicação oficial da Sociedade Americana de Ictiologia e Herpetologia, saiu na manhã desta terça-feira (29).

MUDANÇA DE COR À NOITE

João Victor argumentou que o que credencia o animal como uma nova espécie é uma combinação de características. A principal delas é a mudança de coloração durante a noite: a perereca-Pixinguinha é cinza, mas, quando escurece, o macho adota uma coloração amarelada, o que a diferencia de todas as outras espécies no mundo.

"Isso serve pra diferenciá-la de todas as espécies. Somado a isso, ela tem, na região da virilha, uma coloração verde esbranquiçada, que é diferente de todas as demais. O canto dela também é bastante diferente, dá pra distinguir da maioria das espécies. Os machos possuem os braços hipertrofiados, mais inchados, fortes e muitas das espécies parecidas com ela não possuem essa característica. O tamanho dela também", descreveu.

Espécie encontrada apenas no ES homenageia um dos expoentes do chorinho
O macho da espécie muda a cor para amarelo durante a noite. Crédito: João Victor Lacerda

O pesquisador ainda apontou outro fator interessante da espécie: a perereca-Pixinguinha habita, majoritariamente, uma área mais próxima ao perímetro urbano. Ela foi descoberta no Parque Nacional de São Lourenço, que fica próximo à cidade de Santa Teresa, e também foi encontrada em alguns terrenos já dentro da área urbana, mas que fazem limite com a mata.

AFINAL, POR QUE PIXINGUINHA?

Além da bela homenagem a um dos grandes nomes da música brasileira, o motivo para a escolha do nome da nova espécie tem um lado reflexivo. João Victor explicou que Pixingiunha era conhecido por transformas notas de choro, em referência ao chorinho, em lágrimas de alegria. E, para os pesquisadores, encontrar uma nova espécie em meio à destruição da Mata Atlântica é motivo de alegria em meio à tristeza pela perda do bioma.

"A gente fala que Pixinguinha era São Pixinguinha, um santo, mágico que fazia um ritmo chamado chorinho ser tocado em momento de festa, de celebração. Ele era um mágico que convertia notas de choro em lágrimas de alegria", afirmou.

João Victor Lacerda

Pesquisador do Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA) e membro do Projeto Bromeligenous

"A gente está vivendo um momento tão complicado em relação ao meio ambiente, a Mata Atlântica já não existe mais, foi devastada. Então, se a gente está achando hoje um bicho inédito, faz a gente supor que muitas dessas espécies foram extintas antes mesmo de serem descobertas, o que traz uma grande tristeza. Porém, quando se constata que este restinho que sobrou de Mata Atlântica ainda reserva grandes surpresas, isso serve de ânimo pra gente"

"Uma descoberta como desta pererequinha, assim como Pixinguinha fazia, converte nosso choro em um momento de alegria", afirmou o pesquisador. Ele ainda fez um apelo: para que novas espécies continuem sendo descobertas no Espírito Santo, é importante que a Mata Atlântica seja preservada.

João Victor pede que a ciência também seja valorizada, para que as pesquisas possam continuar e novos animais sejam encontrados no Estado.

"As pessoas se espantam que a gente ainda descubra espécies novas em pleno 2021 e o que a gente faz para descobrir novas espécies. Para a gente seguir conhecendo nosso planeta, a gente precisa da mata de pé, da figura do cientista e de apoio para coleções e instituições científicas. A gente deve seguir valorizando cada vez mais estes três pontos, isso é fundamental", finalizou.

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