Publicado em 19 de julho de 2019 às 11:50
"Minha vida é alegria/ À tristeza não dou bola/ Se surgir algum problema/ Com o samba resolvo na hora". Poucos versos da música brasileira representam tão bem seu autor como o trecho deste samba de Riachão.>
Aos 97 anos de idade, Clementino Rodrigues vive a cantar e a distribuir sorrisos. Para o sambista baiano, sua música é mais que uma forma de oração: "O samba é alegria, é amor. O samba é Deus.">
Esbanjando a vivacidade que o samba lhe dá, Riachão apresenta no teatro do Sesc Pompeia, nesta quinta (18) e sexta-feira (19), o espetáculo "Se Deus Quiser Vou Chegar aos 100". As apresentações contam com a participação de Martinho da Vila e o acompanhamento dos Bambas de Sampa.>
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Com sua indefectível indumentária, que inclui boina, lenço no bolso, toalha no pescoço, correntes e anéis, Riachão recebeu a Folha em sua casa, no Garcia, em Salvador.>
Ele mantém o bom humor e a simpatia que lhe deram fama, mas se ressente um pouco das dores nas pernas, próprias da idade, que o afligem. "Lugar de malandro é em pé, sambando", reclama.>
Mas ele logo se põe a cantar e sorrir. São raras as perguntas que não responde sem cantarolar um samba. Foi assim quando questionado sobre sua amizade com Martinho da Vila. >
"É meu grande amigo. Eu sinto meu coração alegre quando penso nele e me lembro da música que Jesus me mandou em sua homenagem: 'Cadê, cadê Martinho da Vila? Está na Vila'. Que momento feliz!", alegra-se.>
Autor de clássicos como "Cada Macaco no seu Galho" e "Vá Morar com o Diabo", o sambista baiano estima ter mais de 500 composições e, embora tenha lançado apenas três álbuns individuais, teve músicas gravadas por Jackson do Pandeiro, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Gal Costa e Cássia Eller, entre outros nomes.>
Suas criações fazem referência a cenas, situações e personagens da vida cotidiana da Bahia --não à toa, foi apelidado de Cronista Musical da Cidade em seus tempos de cantor de rádio.>
Riachão recorda que compôs a música para Martinho no final dos anos 1960, quando o samba estava em baixa. "O nosso samba que estava morrendo/ Quem não tem despeito pode afirmar/ Chegou Martinho com 'Pequeno Burguês'/ O samba veio reabilitar", canta.>
Martinho José Ferreira, o Martinho da Vila, se emocionou ao escutar o samba, na ocasião em que recebeu o título de Cidadão Baiano na Assembleia Legislativa da Bahia, em 2006.>
"Eu sou fã do velho. Ele é um artista fora de série", afirma o autor de "Pequeno Burguês". "Ele tem essa idade toda, mas tem uma lucidez incrível. É muito alegre e tem uma energia muito forte. Ele é capaz de cantar mais horas do que eu. É impressionante.">
Além de Martinho, outro convidado de Riachão nos shows será seu amigo Clarindo Silva, grande figura da vida cultural soteropolitana e proprietário da Cantina da Lua, patrimônio cultural e gastronômico do Pelourinho, que servirá de cenário para as apresentações no teatro do Sesc Pompeia.>
Paulo Leal, o Paulinho Timor, diretor musical do espetáculo, avalia ser de "extrema importância" oferecer "flores em vida" aos grandes mestres da cultura brasileira. O músico, integrante dos Bambas de Sampa, conjunto que acompanha Riachão desde 2013, afirma que a idade avançada do sambista baiano justifica esse empenho.>
"Há, inclusive, um projeto de gravação de um novo disco dele para ser lançado no ano que vem", afirma.>
Riachão sabe que "o dia da morte vem aí para todo mundo". Mas ele não pensa muito nisso. "É um assunto que não me interessa, porque meu caso é brincar, é alegria", diz, sorrindo. "Meu negócio é viver.">
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