Publicado em 21 de fevereiro de 2018 às 22:01
A verdade é mais estranha que a ficção. Isso acontece porque a ficção é obrigada a se ater às possibilidades. A verdade não. A frase escrita por Mark Twain (1835 1910) em Seguindo o Equador: uma jornada em volta do mundo se encaixa perfeitamente bem em Eu, Tonya, recorte biográfico da vida da ex-patinadora artística Tonya Harding, uma celebridade nos EUA, mas uma figura de pouca fama mundo afora, pelo menos até agora.>
Típica white trash (apelido pejorativo dado aos brancos de baixa renda nos EUA), Tonya era um peixe fora dagua no mundo da patinação, um esporte de elite, de pessoas educadas e ricas. Sua persistência e seu talento, no entanto, o colocaram na elite no esporte. A personalidade da patinadora era ainda mais explosiva ao lado do marido, Jeff Gillooly os dois, juntos com um segurança, conspiraram para tirar a também patinadora Nancy Kerrigan, a queridinha dos EUA, das Olimpíadas de Inverno de 1994. A trama culminou num ataque a Nancy e, claro, numa punição a Tonya e seus comparsas.>
Toda essa ambientação serve para atrair o leitor a Eu, Tonya, que estreia hoje no Estado. Dirigido por Craig Gillespie (Horas Decisivas), o filme acompanha, à sua forma, a vida da patinadora desde a infância problemática até o julgamento pelo ataque à rival.>
Quem não conhece a história pode ter um pouco de dificuldade em acreditar que aquilo realmente aconteceu. Gillespie, no entanto, é esperto em sua narrativa, colocando os personagens contando a história anos depois, em depoimentos, e por vezes até literalmente afirmando para o público que algumas situações absurdas são verídicas a utilização de imagens de arquivo durante os créditos só reforça esse aspecto.>
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A australiana Margot Robbie (O Lobo de Wall Street), indicada ao Oscar pelo papel, convence como a protagonista tanto nas cenas de patinação quanto nos depoimentos, com Tonya mais velha. O único problema está nas sequências que mostram Tonya e Jeff (Sebastian Stan) adolescentes; a caracterização de época até ajuda, mas são claramente dois atores adultos vivendo adolescentes.>
Quem também se destaca talvez até mais do que a protagonista é Allison Janney, que vive LaVona Harding, mãe de Tonya. Favorita ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante, Janney mostra todos os abusos físicos e psicológicos com que Tonya teve que conviver ao longo dos anos.>
Edição>
Eu, Tonya é uma aula de montagem, o que torna o filme ágil e divertido. Mas por baixo da superfície existe o drama de uma pessoa que não conhece soluções e respostas que não envolvam violência. Tonya não teve pai presente, sua mãe era incapaz de amar e seu marido, namorado desde a adolescência, só potencializou essa característica.>
O filme não é perfeito reside sobre ele a crítica de dar muita voz ao agressor (Tonya e sua trupe) e nenhuma à agredida (Nancy Kerrigan); além disso, o roteiro às vezes se perde entre o real e o romanceado, tornando a situação confusa para o espectador. Apesar disso, com a já citada qualidade na montagem/edição e com suas qualidades e atuações (Margot e Alisson Janney principalmente), Eu, Tonya mereceria estar entre os indicados a Melhor Filme no Oscar 2018 é melhor e mais completo que ao menos dois dos indicados.>
A não-indicação, no entanto, não diminui o filme de Craig Gillespie, que entrega um produto de qualidade que, com uma roupagem ágil e moderna, resgata e reconta a história de uma das mais controversas figuras americanas do século passado.>
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