Publicado em 5 de junho de 2019 às 15:25
Retratar a Revolução Francesa sempre foi uma espécie de obsessão para o cinema da França. Há exemplos de produções bem acima da média, como "Danton O Processo da Revolução"(1983), obra-prima do polonês Andrzej Wajda, estrelada por Gérard Depardieu; ou mesmo "Caindo no Ridículo"(1996), comédia satírica indicada ao Oscar e dirigida com o requinte peculiar de Patrice Leconte.>
Há, também, longas que ficam no meio do caminho, como "Maria Antonieta" (2006), com os exageros estilísticos (e narrativa vazia) de Sofia Coppola; e o recente "A Revolução em Paris" (2018), em cartaz nesta quinta (06) no Festival Varilux, no Cine Jardins, em Vitória. O filme também será projetado em outros dias do festival, que acontece até o dia 19 de junho. A programação pode ser conferida no site do evento.>
Um dos (muitos) problemas de "A Revolução em Paris" é o didatismo narrativo imposto pelo cineasta Pierre Schoeller, que tinha mostrado talento nos superiores "O Exercício do Poder" (2011) - seu melhor projeto - e "Versailles" (2008), fita que revelou o diretor e que ficou conhecida por ser o último trabalho do excelente Guillaume Depardieu.>
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"A Revolução em Paris" parece uma longa e cansativa aula de História do Ensino Fundamental. O roteiro (assinado por Schoeller) é didático, cheio de discursos prontos e imponentes e exageros narrativos que soam como maniqueístas e que desumanizam os personagens (o Rei Luis XVI aparece apenas como perdido e insensível e os "miseráveis" que trabalharam na luta pela revolução são "somente" miseráveis raivosos). Ou seja: um só olhar para uma história tão rica em detalhes. Parece um projeto encomendado pelo Governo Francês para comemorar os 230 anos do histórico movimento que pregava a Igualdade, Liberdade e Fraternidade.>
UM ÚNICO OLHAR>
A opção narrativa de Pierre Schoeller é de gosto duvidoso, principalmente porque tinha material para fazer uma história humana, dando um outro olhar sobre o tema. Soa estranho vindo de um cineasta que colocou o "dedo na ferida" da corrupção política francesa (com inteligencia e criatividade) com o citado "O Exercício do Poder". "A Revolução em Paris" é partidário, quase doutrinador.>
O longa, aparentemente, se preocupa em ser inclusivo, pontuando cada núcleo social que atuou para que a revolução desse certo. Se tem acertos, há um: a presença marcante das mulheres, citando uma lavadeira (a sempre expressiva Adèle Haenel) como uma das manifestantes mais atuantes na luta contra o poder de Luís XVI e a desigualdade social da França no século XVIII.>
Aliás, incomoda a necessidade de "retocar" os plebeus parisienses, dando um viço e um glamour irreal a todos eles, o que soa como um erro histórico grosseiro. Os miseráveis franceses não eram saudáveis e bem-nascidos, como Adèle Haenel e Gaspard Ulliel, que, no filme, vive Basile, um ladrão de galinha que se torna fundamental para a revolução proposta no filme. Há até um desnecessário interesse romântico entre eles.>
A trama é centrada logo após a Tomada da Bastilha, em julho de 1789, e a criação da Assembléia Nacional, um passo crucial para a formação da República Francesa. Portanto, a forma preguiçosa como Luís XVI (Laurent Lafitte, um ótimo ator desperdiçado) e Maria Antonieta (a inexpressiva Maëlia Gentil) são mostrados na tela soa incoerente. Mostrar o monarca na guilhotina e revelando a sua cabeça decepada, além de grotesco, é muito pouco para apontar a sua importância histórica.>
Claro que também há pontos positivos em "A Revolução em Paris". É uma produção com um orçamento "musculoso" (mais de 100 milhões de Euros), portanto, as requintadas direção de arte (de Thierry François, responsável pelo visual do ótimo "Pacto dos Lobos", de 2001); figurinos (Anaïs Romand, do visionário "Holy Motors", de Leos Carax) e fotografia (Julien Hirsch, de "Lady Chatterley", 2006), são um colírio para os olhos.>
Tanto requinte estético cai por terra se olharmos atores talentosos desperdiçados na história, como Louis Garrel e Denis Lavant, como Robespierre e Jean-Paul Marat, respectivamente, nomes importantes para a Revolução Francesa visto como meros coadjuvantes. Talvez isso explique o fracasso de público e de crítica de um filme tão ambicioso que acabou naufragando por ser esquemático e antiquado.>
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