Reprise de "Viva o Gordo" mostra um país parado no tempo

Homenagem a Jô Soares na última sexta-feira (5) serviu para confirmar como os problemas brasileiros - inflação, corrupção, burocracia, mau uso do dinheiro público - continuam os mesmos

Publicado em 09/08/2022 às 02h00
Jô Soares
Jô Soares à frente do "Viva o Gordo", nos anos 80. Crédito: Reprodução/TV Globo

Com a morte do polivalente Jô Soares na última sexta-feira (5), foram inúmeras as homenagens ao humorista nas redes sociais e na TV. Um desses tributos foi uma oportunidade dada às novas gerações, que acompanharam primordialmente o talento dele à frente do maior talk show brasileiro durante 30 anos, de conhecer a verve cômica nos esquetes do "Viva o Gordo", humorístico dos anos 1980 reprisado naquela noite, após o "Globo Repórter".

Jô Soares fez do humor a embalagem para a crítica política enquanto a democracia brasileira renascia, a duras penas. Nada foi fácil naqueles anos. A seleção dos quadros presentes na reprise-tributo deu prioridade a materiais produzidos e exibidos em 1987. E ficou evidente a correlação entre aquele Brasil que começava a preparar sua Constituição democrática, consolidada no ano seguinte, e o Brasil que em 2022 ainda precisa confirmar seu compromisso democrático e institucional.

A inflação estava lá, galopante, protagonizando um número musical no qual funcionários de um supermercado exibiam, orgulhosos, pistolas remarcadoras de preços. Resultado da política econômica daquele ano, com o descongelamento. Em 2022, os preços também estão em disparada, em contexto diferente. Mas as dificuldades encaradas pelas famílias para garantirem seu sustento são as mesmas. 

Corrupção, burocracia, mau uso do dinheiro público: o Brasil satirizado por Jô Soares em 1987 não é muito diferente deste de 2022. Em um dos esquetes mais emblemáticos, a democracia grega é parodiada para apontar as grandes demagogias brasileiras, com a encenação da Assembleia Constituinte diante do povo, personificado pelo próprio humorista, reagindo a tudo o que é dito pelos deputados com descrédito. 

A sensação ao assistir a "Viva o Gordo" é a de um país parado no tempo, atolado nos mesmo contratempos de sempre. A genialidade de qualquer humorista é a de ser atemporal. No caso de Jô Soares, ninguém contesta o seu talento. Mas é fato que a circunstâncias nacionais contribuíram para sua obra permanecer tão atual. Os anacronismos são pontuais. "Viva o Gordo" se beneficia de um país que teima em não avançar.

Jô Soares faz a apresentação do programa com um aviso que se encaixa perfeitamente em 2022. "Antes de mais nada, neste meu programa, eu quero tranquilizar a população. Tem muita gente aí preocupada, achando que o Brasil vai acabar. Mas o Brasil não acaba. Aliás, neste país nada acaba. Nunca!"

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