A manobra pouco republicana de Erick Musso na Assembleia

Ao antecipar em 432 dias as eleições para a Mesa Diretora para garantir reeleição para 2021-2023, presidente da Casa escolheu os adversários contra os quais se quer lutar. O estratagema pode até ser legal, mas desvirtua o jogo democrático

Publicado em 27/11/2019 às 17h32
Presidente da Assembleia, Erick Musso. Crédito: Lissa de Paula/Ales
Presidente da Assembleia, Erick Musso. Crédito: Lissa de Paula/Ales

No dicionário, a primeira acepção para a palavra república é “forma de governo em que o Estado se constitui de modo a atender o interesse geral dos cidadãos”. Mas existe uma outra entrada, de uso informal, que é “associação em que há muita desordem”. A Assembleia Legislativa do Espírito Santo pulou de um sentido ao outro na sessão de quarta-feira (27), com a realização da eleição da Mesa Diretora que comandará a Casa a partir de 2021. Isso mesmo. Você não leu errado.

O plano já era costurado nos bastidores há alguns meses, mas tudo ficou mais às claras na segunda-feira (25), quando os deputados aprovaram uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para autorizar as eleições antecipadas. Com o caminho desimpedido, e menos de 48 horas depois da mudança na regra, o atual presidente da Casa, Erick Musso, convocou a votação que garantiu a sua permanência no cargo para o biênio 2021-2023.

Deputados bem que tentaram justificar a espantosa antecedência de 432 dias em relação à data originalmente prevista para a nova eleição. Mas se os discursos floreiam, mas não esclarecem, nem por isso os reais motivos da manobra deixam de ser óbvios. Como não há benefício à população, a ausência total de lógica que sustente tamanha antecipação acabou por deixar cristalinos os propósitos daqueles que a encamparam.

A força que Erick Musso claramente exerce na Assembleia hoje pode não ser mantida após as eleições municipais de 2020, quando parlamentares se ausentam para participar da disputa e a entrada de suplentes reorganiza o tabuleiro político da Casa – dos 30 deputados, 20 podem concorrer a prefeito. O cavalo-de-pau foi a tática encontrada, portanto, para não trocar o certo pelo duvidoso, algo jamais visto na história da Assembleia, nem mesmo nos sombrios anos da Era Gratz, entre 1997 e 2003.

A PEC votada na segunda-feira garantiu a legalidade da manobra, mas não escondeu a bizarria. Eleições regulares são um dos pilares de uma democracia, porque asseguram representatividade legítima, a construção contínua de diálogo entre as forças, novos acordos. Se o pleito para a Mesa Diretora fosse realizado em 1º de fevereiro de 2021, como previsto, Musso poderia sair vitorioso, como agora. Poderia também perder o cargo, mas isso faz parte do jogo democrático. Escolher os adversários contra os quais se quer lutar é que não soa nada republicano.

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