Publicado em 16 de abril de 2021 às 15:00
Em resposta à disparada do IGP-M, índice que reajusta o valor do aluguel, a Câmara dos Deputados aprovou regime de urgência para um projeto de lei que limita a correção dos contratos à inflação. A iniciativa, no entanto, vem sendo criticada como uma tentativa de intervir em uma relação de mercado. >
A proposta que tramita na Câmara prevê que o teto para reajuste dos contratos seja o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) ou outro índice oficial de inflação, caso ele seja extinto.>
Em março, o IGP-M acumulava alta de 31,1% em 12 meses, enquanto o IPCA subiu 6,10% no mesmo período. Assim, um aluguel de R$ 2.000 corrigido pelo IGP-M aumentaria para R$ 2.622, já pelo IPCA esse valor seria de R$ 2.122 --uma diferença de R$ 500.>
A discrepância entre o IGP-M e a inflação já fez com que algumas imobiliárias, como a QuintoAndar, mudassem o índice utilizado como referência nos reajustes.>
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De autoria do deputado Vinicius Carvalho (Republicanos-SP), o projeto permite correção do valor acima do índice de inflação convencionado apenas se o inquilino concordar.>
Na justificativa, o congressista diz que inquilinos "estão desesperados com os índices de reajuste dos contratos de aluguel neste período de pandemia". Ele destaca que a alta recente do IGP-M em 2020 respondeu a uma aceleração de variáveis como dólar e commodities.>
A aprovação da urgência no dia 7 de abril ocorreu em votação simbólica, o que dispensa o projeto de exigências ou formalidades regimentais, acelerando sua tramitação.>
A discussão expôs divergências dentro da própria Câmara, com respaldo de partidos de oposição e críticas de legendas de centro e centro-direita.>
Quem se opõe à mudança afirma que contratos de aluguel são celebrados a partir de uma relação privada, o que limita a interferência do Estado.>
Por esse motivo, o líder do Cidadania na Câmara, deputado Alex Manente (SP), afirma que o projeto é inconstitucional.>
"Precisamos amadurecer juridicamente para poder, de fato, aprovar um projeto que tenha viabilidade de ser implementado", diz o deputado.>
Também crítico ao projeto, o líder do Partido Novo na Câmara, deputado Vinicius Poit (SP), afirma que "o congelamento de aluguéis é mais um exemplo de boa intenção com efeitos extremamente negativos".>
"Berlim, na Alemanha, também achou que era solução e viu os preços dispararem e a procura por imóveis diminuir, gerando problemas de habitação", afirmou. "Precisamos parar de olhar para o que deu errado e prestar mais atenção nos bons exemplos e nas lições que essas políticas públicas executadas ao redor do mundo podem nos trazer.">
Em resposta, o deputado afirma que, apesar de fixar o IPCA como reajuste máximo, o texto deixa a porta aberta para a livre negociação. Se o dono do imóvel não concordar, poderá propor índice superior, mas caberá ao inquilino aceitar ou não.>
"Defendemos a livre negociação, mas também não podemos deixar o lado mais fraco dessa relação à mercê das regras do mercado", indica a justificativa.>
O líder do PC do B na Câmara, Renildo Calheiros (PE), está entre os que defendem a proposta. "Neste ambiente econômico em que vivemos de pandemia, não pode o Brasil conviver com os reajustes que estamos vendo", diz. "O projeto tem o mérito, ao menos, de colocar uma referência razoável para esses reajustes.">
Na mesma linha, o líder do PSB na Câmara, Danilo Cabral ( PE), afirma que a pandemia aprofundou as desigualdades no acesso à moradia.>
"Houve um claro aumento da população de rua em função da vulnerabilidade social. É preciso adequar a legislação para, onde for possível, estabelecer regras de transição que procurem preservar o direito à moradia", disse.>
No setor imobiliário, o projeto é visto como engessamento. "Isso é um absurdo. Estamos voltando ao tempo da tabela, de congelamento de preços. Essa interferência do Legislativo no acordo privado é completamente desnecessária", diz Adriano Sartori, vice-presidente de Gestão Patrimonial e Locação do Secovi-SP (sindicato da habitação).>
Segundo ele, a negociação quanto ao reajuste já está acontecendo entre as partes.>
Sartori afirma ainda que a aprovação do projeto poderia criar insegurança jurídica. "Isso afasta investidores. Eles não se sentem confortáveis com esse tipo de medida, com esse tipo de interferência", diz. "O maior problema é a interferência governamental numa relação privada.">
Ele critica também a escolha do IPCA para reajustar aluguéis, porque não seria um índice que captura a realidade do mercado imobiliário.>
"O grande desafio de desenvolver um índice de aluguéis é que tem de considerar variações regionais e o nicho de mercado. Uma coisa é relação de oferta e demanda no mercado residencial, outra no galpão e logística e uma terceira em comercial ou shopping center", diz. "Não dá para adotar um índice que capta variação de mercado olhando só para nicho ou região.">
Thiago Lins, sócio conselheiro do Bichara Advogados, destaca que a Lei do Inquilinato, de 1991, não define um índice de correção monetária.>
O texto diz ser livre a convenção do aluguel quanto a preço, periodicidade e indexador de reajuste, e proíbe que seja vinculado à variação do salário mínimo, variação cambial e moeda estrangeira.>
"O problema é que o mercado imobiliário tem como praxe usar o IGP-M, que bateu 31% em 12 meses", diz. "Gerou uma realidade que não está de acordo com a inflação brasileira.">
Segundo ele, está havendo negociação entre proprietários e inquilinos para tentar ajustar um índice que atenda as duas partes.>
"O Legislativo tem de tomar cuidado para não engessar o mercado imobiliário e prever substituição do IGP-M, que nem sequer está previsto na lei de locação, por um índice como o IPCA", diz. "Tem de tomar cuidado para não deixar as partes sem poder de negociar o índice que elas entendem ser mais adequado.">
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