Publicado em 28 de maio de 2018 às 00:41
Com as recentes altas do dólar e do preço do barril de petróleo, a gasolina e o diesel no Brasil ficaram mais caros nos últimos meses, uma vez que a Petrobras repassa esse custo integralmente ao consumidor, sem se preocupar com a concorrência, afinal, ela praticamente inexiste. O cenário de preços em disparada, que culminou na greve dos caminhoneiros, acende o alerta para uma importante discussão: a do monopólio da Petrobras no refino de combustíveis.>
Até 1997 a Petrobras era a única que podia explorar, produzir e refinar petróleo no Brasil. No entanto, naquele ano, a chamada Lei do Petróleo determinou que esse mercado seja aberto para outros concorrentes. De lá para cá, algumas empresas até chegaram para atuar ao lado da estatal na extração e produção de petróleo. Já no refino, no entanto, quase ninguém apareceu.>
Hoje, segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP), das 17 refinarias em operação no país, 13 são da Petrobras e só quatro são privadas: Manguinhos, Univen, Riograndense e Dax Oil. Mas a capacidade delas é minúscula. Juntas, produzem menos de 5% do total da gasolina nacional, enquanto a Petrobras 95%.>
De acordo com a pesquisadora da FGV Energia Fernanda Delgado, mesmo com a abertura de direito, a empresa ainda possui hegemonia no setor, controlando toda a cadeia de produção. Para ela, o gigantismo da Petrobras e a concorrência com o governo são as principais receios para novas empresas entrarem no refino.>
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Tínhamos uma Petrobras monopólica, muito grande. Além disso uma política nacionalista forte até pouco tempo, que dava medo de concorrer com o governo. Com um mercado sem concorrência, não é possível haver preço competitivo e justo, afirma.>
INSEGURANÇA>
Além do peso da Petrobras, o diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE), Adriano Pires, pontua como empecilho para entrada de empresas no setor o ambiente regulatório.>
O problema maior é regulatório porque até pouco tempo a gente tinha tradição de controlar o preço do refino. Sem definições claras sobre isso, não há investidor que arrisque, comenta Pires, que lembra ainda que boa parte da pouca concorrência da Petrobras hoje no Brasil vem da importação de combustíveis.>
O economista e presidente do ES em Ação, Aridelmo Teixeira, ressalta que toda essa situação se reflete numa insegurança jurídica que impede o livre comércio. Não há segurança para as empresas entrarem nesse mercado e isso precisa ser construído porque nessa área os investimentos são muito grandes. Não dá para investir com incerteza.>
Para Aridelmo, a abertura efetiva do mercado é a única saída para a crise dos combustíveis. Pode reduzir o imposto para conter a alta de agora, mas se o barril de petróleo subir mais não vai ter onde cortar, ressalta.>
PROJEÇÃO>
Fernanda Delgado, da FGV Energia, acredita que finalmente o setor de petróleo começa a ter uma abertura no Brasil. Há esse entendimento acompanhado de desinvestimentos da Petrobras, com a venda de ativos e mudança da política de preços. Tudo isso aponta para um mercado mais justo, avalia.>
Já Pires, do CBIE, vê esse imbróglio como um alerta para necessidade de privatizar refinarias da Petrobras. Vender 100% de algumas refinarias e terminais seria a solução para termos mais concorrência. O que traria um maior conforto até para a Petrobras. A concorrência é a melhor forma de proteger o consumidor, com preços mais justos.>
A ANP refutou que haja monopólio e informou que a exclusividade da Petrobras foi extinta por lei em 1997. A Petrobras foi questionada, mas não se manifestou.>
DESVIOS E POLÍTICA DE SUBSÍDIOS AINDA PESAM >
Não bastasse o mercado quase hegemônico da Petrobras no país, outros fatores ainda impactam a empresa. Depois de uma verdadeira sangria nos cofres da estatal com o petrolão nos últimos anos, com desvios que estimam-se em R$ 88,6 bilhões, e de anos de uma política de controle de preços pelo governo, a companhia amargou prejuízos e viu seu valor de mercado cair.>
Diante desse cenário, para recuperar as perdas, desde julho passado a empresa adotou uma política de preços mais liberal, sem controle governamental, e levando em conta o cenário internacional. Pela nova metodologia, os reajustes são quase diários, o que faz o consumidor ser penalizado pelos anos de desmandos e má administração, na avaliação dos especialistas.>
A empresa mudou a forma de reajuste por erros que começaram lá atrás, o que agora tem um impacto muito forte na economia e para o consumidor. A questão que tem que se ver agora é a solução. Se corta impostos por aqui, mas lá fora o barril do petróleo subir mais, não vai adiantar nada, afirma o economia Sebastião Demuner, que defende uma reformulação da política da preços.>
Para a pesquisadora da FGV Energia Fernanda Delgado, a redução da carga tributária dos combustíveis seria uma medida paliativa, mas não resolutiva. Qualquer redução de imposto é bem-vinda para a sociedade, mas ainda não vai ter um impacto que se espera. Isso só teríamos com uma concorrência mais efetiva no setor de refino, avalia.>
Fernanda explica que essa concorrência faria o preço cair. Quanto mais empresas explorando, refinando e competindo, esse preço será menor. É um caminho acertado essa abertura de mercado do ponto de vista técnico e econômico, já que além da queda do preço, também geraria mais empregos, comenta a especialista.>
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ENTENDA >
CRIAÇÃO >
A Petrobras foi criada em 1953, no governo de Getúlio Vargas, concentrando todas as atividade de exploração, produção e refino.>
FIM DO MONOPÓLIO >
A lei do petróleo, de 1997, quebrou a exclusividade da Petrobras e permitiu a entrada de outras empresas nas atividades exercidas por ela. De lá para cá, companhias chegaram para atuar ao lado da Petrobras na extração e produção.>
PRÉ-SAL>
Em 2016, o Congresso aprovou também o fim da exclusividade da empresa na exploração do pré-sal.>
20 ANOS DEPOIS >
Apesar do fim do monopólio por lei, no refino de combustível quase nenhuma empresa apareceu. A concorrência com uma empresa gigante e com apoio governamental é um dos fatores que levam a esse receio, além da insegurança jurídica, segundo especialistas.>
REFINO HOJE >
Das 17 refinarias em operação no país, 13 são da Petrobras e só quatro são de concorrentes privadas: Manguinhos, Univen, Riograndense e Dax Oil. No entanto a estatal é responsável por 95% do combustível produzindo nacionalmente.>
IMPACTOS>
Sem concorrência, a Petrobras pode cobrar o preço que quer, sem haver pressão por preços mais competitivos, o que pesa no bolso do consumidor.>
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