Com a não aprovação dentro do prazo pelo Congresso da Medida Provisória (MP) 808, que modificou pontos da reforma trabalhista, as alterações devem perder a validade nesta segunda-feira, 23. Com isso, a reforma volta a valer integralmente, incluindo pontos polêmicos, como permitir que empresas demitam seus empregados para, em seguida, recontratá-los como trabalhadores intermitentes, que recebem apenas por hora trabalhada, por exemplo, e que grávidas trabalhem em locais insalubres (que fazem mal à saúde), com radiação, frio e barulho.
Editada pelo governo uma semana depois de a nova legislação entrar em vigor, em novembro, a MP precisaria ser votada e aprovada pela Câmara e pelo Senado para ser sancionada pelo presidente até segunda-feira, mas não há mais tempo. A MP havia sido acordada entre senadores e o Palácio do Planalto para mudar pontos contraditórios sem que houvesse a necessidade do texto retornar à Câmara, permitindo a rapidez na aprovação.
Com a volta às mudanças originais, especialistas temem que o quadro de incertezas sobre a reforma se agrave. Para o advogado trabalhista Cristóvão Ramos Pinto, todo esse imbróglio deve acabar na Justiça.
Os empregados ficam numa situação de mais vulnerabilidade, como as grávidas, e os empresários em meio a uma grande situação de insegurança jurídica e nas relações de trabalho. Agora, será preciso uma cautela redobrada porque qualquer medida que for tomada pode ser questionada pela Justiça depois e gerar um passivo muito grande, afirma.
FALHA
Como não se sabe ao certo o que está valendo, e o Tribunal Superior do Trabalho (TST) ainda não julgou a constitucionalidade das alterações da reforma, a a insegurança que já existia passa a ser generalizada, avaliam os advogados. Para Cristóvão, faltou empenho político para evitar esse cenário. Faltou força do governo para aprovar. Hoje, vemos que foi uma falha grave aprovar o texto assim, a toque de caixa e sem avaliar as consequências e os resultados.
Diante da situação, o advogado trabalhista Adriesley Esteves de Assis, do escritório Alcure, Pereira & Puppim, aconselha que os empregadores evitem usar o texto. Minha orientação é para que não se faça nada nessa linha, porque está tudo nebuloso, com mudanças, como no caso da gestante, e menos detalhado, como o contrato intermitente. Agora, é esperar um posicionamento mais consolidado, comenta.
Já o advogado Alberto Nemer pondera que não haverão prejuízos significativos para trabalhadores e empregadores. A reforma não tira nenhum direito e a MP apenas esclarecia algumas coisas que, como na questão da validade, até já era óbvia. Pouca coisa muda de fato, ressalta.
GOVERNO DESCARTA NOVA MP
O governo decidiu não enviar, por ora, ao Congresso nenhuma proposta para substituir a Medida Provisória 808, que faz ajustes na reforma trabalhista e perde a validade nesta segunda, 23. Segundo técnicos envolvidos nas discussões, não há clima no Congresso para voltar ao assunto no momento. Assim, ficou acertado que o Executivo vai apenas editar decreto e portarias para regulamentar alguns aspectos pontuais da lei.
Os técnicos ainda estão levantando o que podem fazer por meio de instrumentos que não precisam de aval do Legislativo, mas esse escopo é limitado. Isso porque não é possível ir além ou revogar normas da reforma.
No caso do contrato intermitente, por exemplo, uma possibilidade é editar um decreto para definir regras para pagamento de férias e 13º salário, já que esses trabalhadores não dão expediente durante um mês inteiro.
Para complicar o grau de incertezas envolvendo a reforma, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) adiou por mais 30 dias o prazo do grupo de trabalho que analisa ajustes na nova lei. (AG)
O QUE MUDA
Trabalho intermitente
A MP 808 proibia que o empregador demitisse um funcionário com contrato normal para recontratação imediata como trabalhador intermitente, que ganha por horas e dias de serviço. Sem a MP, não haverá mais restrições.
Gravidez e insalubridade
Pela reforma, grávidas e lactantes poderiam trabalhar em locais insalubres de grau mínimo ou médio, a não ser que apresentem um atestado recomendando que sejam afastadas. A MP já dizia o contrário, que elas não poderiam trabalhar, a não ser que um atestado as liberasse. Agora, volta a valer o texto original: é permitido.
Jornada 12X36
A reforma permitia que essa jornada fosse acordada de forma individual entre patrão e funcionário. Já a MP determinava que a negociação deveria ser via convenção coletiva. Agora, volta a ser permitido a negociação individual.
Valor do dano moral
O valor que o trabalhador tinha para receber de dano moral foi limitado na reforma a, no máximo, 50 vezes o salário do funcionário. Com a MP, os valores iam a até 50 vezes o valor do teto do INSS (R$ 5.645,80). Agora, o cálculo volta a ser feito de acordo com o salário.
Validade
A reforma não deixava claro se as mudanças valiam para novos contratos ou para todos. A MP esclarecia que valia para todos. Agora, não se sabe como fica e esse ponto pode ser alvo de questionamentos judiciais.
Autônomos
Sem a MP, mesmo se o autônomo for subordinado a alguma empresa, ele não será considerado empregado, como previa a reforma.
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