Crítico de cinema e colunista de cultura de A Gazeta

"A História do Palavrão", da Netflix, traz diversão e cultura

Apresentada pelo canastrão Nicolas Cage, a documental "A História do Palavrão" explica as transformações culturais a partir dos palavrões da língua inglesa

Vitória
Publicado em 05/01/2021 às 18h16
Atualizado em 05/01/2021 às 18h16
Série documental
Série documental "A História do Palavrão", da Netflix. Crédito: Adam Rose/Netflix

A carreira de Nicolas Cage é um dos casos mais curiosos de Hollywood. De ator promissor em filmes de David Lynch (“Coração Selvagem”) e dos irmãos Coen (“Arizona Nunca Mais”), o sobrinho de Francis Ford Coppola se consolidou nos anos 1990 com o Oscar vencido por “Despedida de Las Vegas” (1995). Suas escolhas após isso foram bem populares; de bons filmes de ação como “Con Air” (1997) e “A Outra Face” (1997), ao meloso “Cidade dos Anjos” (1998), passando também por filmes mais ousados como “Adaptação” (2002).

Com a popularidade, vieram também a fortuna e, consequentemente, os gastos excessivos. Cage comprava casa atrás de casa (tinha quase 20), carros (22), jatinho, histórias em quadrinhos raras, fez uma dívida gigantesca e teve problemas com o fisco. Resultado: foi processado pela Receita Federal americana e por bancos com os quais financiou suas aquisições.

Para pagar essas dívidas, começou a aceitar qualquer filme que lhe era oferecido desde que o cachê fosse razoável. E por mais que ainda fizesse parte de projetos legais como “Kick-Ass” (2010) e “Vício Frenético” (2009), sua presença se tornou mais comum em filmes como os medonhos “O Sacrifício” (2006) e “O Apocalipse” (2014) - em função disso, Nicolas Cage acabou se tornando quase uma chacota, um sinônimo de filmes de qualidade questionável. O curioso é que ele assumiu essa postura canastrona (algo que sempre foi) e a incorporou até em seus trabalhos mais sérios.

Eis que chegamos a 2021, com o recém-lançado “Jiu-Jitsu”, talvez o pior filme de sua carreira, mas também com a ótima série documental “A História do Palavrão”, lançada nesta terça (5) pela Netflix. Ironicamente, Cage leva a sério seu papel no filme, mas abraça a galhofa como apresentador da série dividida em seis partes de 20 minutos, cada uma delas estudando a etimologia e os significados de palavrões na língua inglesa.

Com Cage servindo de condutor, a série ouve atores, comediantes e estudiosos da língua inglesa, cada um, claro, falando sobre o que entende. O resgate histórico funciona bem para entendermos que os palavrões fazem parte de uma cultura regional - suas origens normalmente estão ligadas a hábitos e costumes de uma época ou região.

Série documental
Série documental "A História do Palavrão", da Netflix. Crédito: Adam Rose/Netflix

Por se tratar de uma série de língua inglesa, os palavrões e suas histórias obviamente são em inglês. Em alguns casos, a tradução funciona bem, como o “bitch”, por exemplo, mas outros, como o clássico “fuck” não possui uma tradução direta para o português, ganhando significados diversos de acordo com a frase em que é originalmente utilizada. A barreira do idioma compromete também algumas piadas do ágil texto, como quando Nicolas (“Nick”) brinca com seu nome em relação ao palavrão “Dick”.

Como uma obra de comédia, “A História do Palavrão” tem ótimas sacadas que talvez não funcionem tanto para o público sem domínio do inglês. Ainda assim, a série oferece registros históricos interessantes como a explicação sobre o Código de Hays, que vigorou em Hollywood entre 1930 e 1968. O Código de Hays era um conjunto de normas morais que determinava o que os estúdios poderiam ou não colocar em cada filme - era proibido usar expressões como “disgraça” ou “maldição”, além claro, de palavrões muito mais “pesados”.

Série documental
Série documental "A História do Palavrão", da Netflix. Crédito: Adam Rose/Netflix

Ao assistir a “A História dos Palavrões”, a vontade que fica é de ver uma versão brasileira da série, até pela distinção que o nosso português desenvolveu em relação ao de Portugal. Parece exagero, mas entender os palavrões nos ajuda a entender a sociedade e suas transformações. A cada ressignificado ou reapropriação de algo que antes era ofensivo, o comportamento social se transforma muitas vezes sem que a gente perceba.

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