Apaixonada por vinhos, Nádia Alcalde é jornalista, sommelière e consultora. Escreve sobre o universo da bebida, antenada com lançamentos, tendências e notícias.

Conheça 6 desafios para a produção de vinhos finos no ES

A falta de competitividade perante os vinhos importados e a carência de profissionais qualificados tecnicamente para consultoria estão entre os entraves citados por viticultores capixabas

Publicado em 25/09/2020 às 09h00
Uvas cultivadas na vinícola Tabocas, em Santa Teresa
Uvas cultivadas na vinícola Tabocas, em Santa Teresa. Crédito: Tabocas/Instagram

“Grandes vinhos requerem um doido para cultivar, um sábio para vigiar, um poeta para fazer e um apaixonado para beber”. Não sei de quem é a frase, mas é uma das que está na ponta da língua de qualquer enófilo, e ela traduz bem o que é produzir uvas e elaborar vinhos.

Quanto mais nos aprofundamos no assunto, mais claro fica que a tarefa não é mesmo para qualquer um, e de fato é necessário um misto de loucura e muito amor para fazer dar certo.

São muitos os desafios dos produtores de vinhos finos, e para você entender um pouco mais sobre essa "insanidade" toda, listei abaixo os seis principais enfrentados pelos vitivinicultores no Espírito Santo:

1 - CRIAR ASSOCIAÇÕES E COOPERATIVAS

Na produção de vinhos finos, o terroir conta, e muito. Reconhecer e estudar territórios para a produção de uvas viníferas é necessário e envolve muito investimento para que a região se desenvolva profissionalmente e com seu potencial máximo. Tem que ter também “dindin” no bolso, pois todas as fases de estudo, inovação tecnológica e campo oneram em custo. 

Para Levi Loretti, um dos produtores de uvas finas do Espírito Santo, faltam ainda associações e cooperativas. “As associações nos ajudam a trocar conhecimentos sobre práticas de produção, e seria ótimo poder realizar um trabalho conjunto de melhoria futura”, explica.

2 - IDENTIFICAR A UVA EMBLEMÁTICA DO ES

Toda região produtora tem sua uva emblemática, a que mais se adaptou e a que produz vinhos com características que expressam bem o terroir. No Espírito Santo é tudo muito novo ainda e não temos tantas castas plantadas para identificar com precisão qual seria essa uva.

São vários os clones que se adaptam aos mais diferentes tipos de clima e solo onde são cultivados. Alguns apostam na Cabernet Sauvignon, mas temos também a Syrah surgindo aí e parece que ela gostou do território capixaba.

3 - OBTER PARCERIAS LOCAIS PARA CONSULTORIA TÉCNICA

Rodolpho Carrereth, viticultor da vinícola Carrereth, em Pedra Azul, sinaliza a carência de profissionais habilitados tecnicamente para consultoria no cultivo de vitis vinífera

“Hoje nosso projeto está sendo desenvolvido com a consultoria de uma empresa mineira com alta capacidade técnica no sistema de dupla poda, mas seria ótimo se pudéssemos contar também com técnicos do Incaper (Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural) com conhecimento em viticultura ou enologia", afirma.

4 - GANHAR COMPETITIVIDADE FRENTE AOS IMPORTADOS

Muita gente acha o vinho nacional caro. Pois há um porquê chamado tributação. Metade do valor de uma garrafa de vinho produzida aqui no Brasil é composta por impostos como PIS, Cofins, ICMS e IPI, entre outros. E o preço elevado é sem dúvida um dos principais entraves para o aumento do consumo no país, que hoje gira em torno de 2,3 litros per capita.

Estamos bem atrás se compararmos com a Argentina, onde são consumidos em média 25 litros per capita, segundo a Organização Internacional do Vinho (OIV).

Eliton Stanger, da Cantina Mattiello em Santa Teresa, ressalta a competitividade com os importados. “Países europeus muitas vezes recebem subsídios para a produção, e o Brasil é um país que importa muito, principalmente do Chile e da Argentina, e muitos desses rótulos já são encontrados nas prateleiras a preços mais baratos que os similares de produção local”, destaca.

5 - INCENTIVAR O CONSUMO DE VINHOS NACIONAIS

Como agradar o consumidor e não ser só mais um rótulo na prateleira? O tal do “não gostei desse vinho” tem muito mais a ver com o paladar de cada um do que com a qualidade do produto. O consumidor é quem dita o mercado, e diante disso é preciso que o produtor mostre o seu diferencial e exerça também um papel de educador.

Posicionar-se frente a um público que consome pouco vinho e ainda tem preconceito em relação a marcas nacionais não é nada fácil. Entusiasta do vinho brasileiro, o publicitário Ubirajara Pinto comercializa o produto no ES e reforça que o trabalho é de formiguinha. “Vamos encantando um a um. Às vezes realizo degustações às cegas com pegadinhas para que as pessoas se permitam surpreender com o vinho nacional”.

6 - OBTER UM SELO DE INDICAÇÃO GEOGRÁFICA

Quanto mais se descobre a vocação vitivinícola de uma região, mais atraentes se tornam os negócios inseridos nela. O selo de Indicação Geográfica de uma área produtora faz toda a diferença, com benefícios à organização coletiva dos produtores e estímulo à economia local, aumentando até o potencial para a atividade do enoturismo.

Ubirajara Pinto

Publicitário e enófilo

"Às vezes realizo degustações às cegas com pegadinhas para que as pessoas se permitam surpreender com o vinho nacional."

Para Vinicius Corbelini, viticultor da vinícola Tabocas, em Santa Teresa, uma IG seria a consolidação do trabalho. “Pouco a pouco nós já estamos chegando  à personalidade e à identidade do vinho fino capixaba, mas tem todo um caminho ainda de Indicação Geográfica e Denominação de Origem Controlada para estabilizar esse trabalho", pontua.

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Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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