Em um cenário global marcado por tensões geopolíticas sem precedentes e pela crescente urgência climática, a COP30 encerrou-se em Belém com um conjunto de decisões que muitos especialistas já classificam como emblemáticas. O encontro, considerado o mais desafiador desde a adoção do Acordo de Paris, há dez anos, conseguiu reafirmar o papel do multilateralismo e abrir uma nova etapa de cooperação internacional voltada para a ação concreta.
O pacote aprovado cumpre três metas essenciais: fortalecer o multilateralismo, aproximar o debate climático das pessoas e acelerar a implementação do Acordo de Paris. Essa tríade sintetiza um momento histórico — o de um mundo que, mesmo fragmentado, ainda é capaz de encontrar convergências em torno de um propósito comum: proteger o planeta e suas populações.
Infelizmente, nem tudo foram flores. E algumas críticas também estiveram colocadas á mesa, principalmente sobre o Brasil e o debate sobre o futuro dos combustíveis fósseis
Na dimensão política, o Brasil teve protagonismo inédito. A presidência brasileira da COP30 conduziu um debate global sobre o futuro dos combustíveis fósseis — tema que dividiu a conferência entre mais de 80 países favoráveis a uma linguagem explícita de transição e outro bloco igualmente numeroso contrário à proposta. Considero o ponto mais complexo dessa conferência a polarização em torno do que a ciência já comprovou como o maior vilão para as mudanças climáticas, juntamente com a devastação de florestas.
Considerando que a presidência do Brasil só se encerra quando der posse a nova presidência na COP31, o Brasil tomou uma posição corajosa: sem esperar consenso, a presidência da COP30 anunciou dois novos instrumentos: o Mapa do Caminho para a Transição dos Combustíveis Fósseis de forma justa, ordenada e equitativa, e o Mapa do Caminho para interromper e reverter o desmatamento. São iniciativas que colocam o país no centro da agenda climática global, reafirmando sua capacidade de articular diálogo entre norte e sul, energia e natureza, tecnologia e justiça social.
É preciso também afirmar os pontos positivos em que o consenso se deu: as decisões adotadas em Belém reforçam o Acordo de Paris em múltiplas frentes — mitigação, adaptação, financiamento, tecnologia e capacitação. Elas também ampliam o reconhecimento de grupos historicamente sub-representados, como mulheres, povos indígenas e comunidades afrodescendentes, e consolidam o papel de governos locais e subnacionais na implementação de soluções.
Colocar explicitamente no documento final a questão dos impactos diferenciados em populações afrodescendentes e mulheres é um marco histórico na agenda de justiça climática.
A escolha da Amazônia como sede da conferência não foi apenas simbólica: a COP30 deixou claro que não há fronteira entre natureza e clima, e que proteger florestas, oceanos e biomas é também proteger pessoas. O protagonismo da região amazônica elevou a consciência global sobre a interdependência entre biodiversidade, desenvolvimento e sobrevivência humana.
Aquilo que muitos viram como ponto fraco, o fato de a COP30 ser realizada em uma região sem muita estrutura logística e hospedagem, ao fim, eu e vários grupos consideramos um ponto forte. Foi possível para diplomatas e negociadores do norte global experimentarem em seus corpos a dificuldade de viver e sobreviver em um clima bastante quente e quais impactos na vida, inclusive na dificuldade de concentração e capacidade de trabalho.
Mas sem dúvida, o ponto alto da conferência foi a decisão de lançar um mutirão global contra a mudança do clima, um apelo histórico à união da humanidade em torno de um esforço coletivo e imediato. Por consenso de quase 200 países, a COP30 marcou uma transição definitiva: sai de cena o tempo das negociações intermináveis, entra o tempo das transformações reais nas economias e sociedades.
Entre as medidas aprovadas, destacam-se: o Acelerador de Implementação Global, que impulsionará ações de grande impacto, como a redução de metano e a remoção de carbono por soluções baseadas na natureza; a triplicação do financiamento para adaptação, voltado às populações mais vulneráveis; o Mecanismo de Belém para a Transição Global Justa, que busca garantir que a mudança para economias sustentáveis ocorra de forma inclusiva; e o novo Plano de Ação sobre Gênero e Clima, que amplia o papel das mulheres na liderança das decisões ambientais; e o Plano de Ação em Saúde de Belém, que historicamente cria eixos temáticos para adaptação do setor saúde e com o anúncio do aporte de 300 milhões de dólares pelos financiadores internacionais.
A COP30 também aprovou programas voltados à tecnologia, ao financiamento climático e ao diálogo entre comércio internacional e clima, consolidando um ecossistema global de cooperação.
As decisões de Belém apontam para um novo capítulo do regime climático internacional. O fortalecimento do multilateralismo, a valorização da justiça climática e a aposta na cooperação são sinais de que o mundo ainda pode reagir — se agir com rapidez, equidade e ciência. Temos que nos orgulhar da liderança que o Brasil consolidou durante o evento e que ainda permanecerá neste próximo ano.
A COP30 deixa como legado a convicção de que não há tempo a perder. A mudança climática já é uma crise de saúde, de segurança alimentar, de desigualdade. E, como toda crise global, ela exige solidariedade global.
Belém mostrou que essa solidariedade é possível — e que o futuro ainda pode ser escrito a muitas mãos.
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