O anúncio do “habemus papam”, em 8 de maio, despertou a atenção de bilhões de pessoas, já que o papado tem um significado político global que vai além do catolicismo, ecoando também entre os não católicos.
O Papa Francisco foi uma lufada de ar fresco que sacudiu a poeira de posturas tradicionais e complacentes que estavam afastando milhões de fiéis da Igreja. Entre seus vários legados, ele resignificou a conexão entre o Homem e a Terra e alinhou-se a segmentos de várias origens que compartilham a preocupação de que o Homem está degradando a sociedade e destruindo o ambiente que lhe dá sustentação, colocando em risco sua própria sobrevivência. Saber que o Papa Leão XIV seguirá a mesma linha, embora por seus próprios caminhos, trouxe renovadas esperanças.
Esse legado está cunhado na Encíclica "Laudato Si”, dirigida a todas as pessoas de boa vontade, não apenas aos católicos. A Encíclica destaca a necessidade de cuidar da nossa irmã, a mãe Terra, que emite sinais de que está doente, como poluição e mudanças climáticas, perda de biodiversidade, deterioração da qualidade da vida humana e degradação social.
A Encíclica destaca que vivemos uma crise socioambiental complexa. Suas raízes estão numa filosofia que coloca o ser humano no centro, o antropocentrismo, ignorando o valor intrínseco das outras criaturas e tratando a natureza como um mero objeto de uso e domínio. Sua lógica só vê relevância naquilo que atende os interesses humanos imediatos e tem como dogma a capacidade da tecnologia em controlar a natureza. E suas consequências atingem principalmente os mais pobres, que são os mais afetados pela crise ecológica, escassez de água, fome, desastres climáticos e deslocamentos.
A Encíclica considera a Terra e sua natureza como um dom de Deus, cujos bens devem ser partilhados por todos, incluindo as gerações futuras. Afirma que a resposta a esta crise exige uma ecologia integral, que reconheça a relação intrínseca entre o ser humano e o ambiente natural, e a necessidade de abordar as dimensões ambiental, econômica, social e cultural da vida.
Destaca a importância da ação global para enfrentar os desafios ambientais e promover a justiça social, sugerindo diversos caminhos, fundamentados na ideia de que tudo está conectado.
A Encíclica está em sintonia com as linhas de pensamento de lideranças de diversos setores, inclusive do movimento indígena brasileiro, como Ailton Krenak, que denuncia a cultura que coloca o ser humano como senhor absoluto da criação; alerta que ao chamarmos os bens da natureza de “recursos naturais”, tratamo-los como se existissem para servir à Humanidade, e não como o ambiente que lhe permite viver; afirma que a Terra é um ser vivo, do qual fazemos parte; e critica a ideia do “homem separado da natureza”.
"Laudato Si” também foi deixada como legado ao Papa Leão XIV, cujas ações e pronunciamentos anteriores estão alinhados aos princípios nela contidos. Em 2015, por exemplo, ele compartilhou nas redes sociais imagens de uma marcha climática em Chiclayo, Peru, onde fiéis carregavam faixas com referências à Encíclica. Em um seminário em Roma em 2024, o então Cardeal Prevost enfatizou a necessidade de passar das palavras à ação no enfrentamento da crise climática, destacando que a relação do Homem com a natureza deve ser de reciprocidade.
A Encíclica chama todos a reconhecerem a Terra como “nossa casa comum” e a agirem com urgência e responsabilidade para protegê-la. O tempo de agir é agora, em nome das gerações presentes e futuras. Não se pode mais protelar as ações, para evitar o risco de que a Humanidade perca a bússola do seu próprio destino.
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