É escritora de ficção e professora de cinema. Escreve às terças-feiras sobre livros, filmes, atualidades variadas e fatos contemporâneos

Como ficaria o senhor Foucault na era do falso?

A humanidade está mergulhada em uma onda avassaladora das mais estapafúrdias suposições. Aliás, a história humana sempre esteve repleta de mentiras postas a serviço de interesses escusos.

Publicado em 16/08/2022 às 02h02

A sabedoria popular diz que de boas intenções o inferno está cheio. Boas intenções não faltam, a voejar por aí sobre nossas cabeças, como moscas em volta de um bolo de aniversário. E nem sempre são tão boas assim. Em termos de boas intenções, existem mais coisas entre o céu e a terra de que sonha a vã filosofia da gente.

Como veem, estou virada para a paródia. Que não seja paródia fiel ao sentido da frase famosa de Shakespeare, em "Hamlet". Porém penso que é digna de empréstimo ao bardo. Isso se considerarmos o caso de certas palavras, postas a serviço das boas intenções.

Nesta era do falso, a humanidade está mergulhada em uma onda avassaladora das mais estapafúrdias suposições. Aliás, a história humana sempre esteve repleta de mentiras postas a serviço de interesses escusos. Desde a pré-história, todas as tribos fazem o possível para que milhões de pessoas acreditem nas mentiras inventadas em favor do poder.

Com o advento da internet, é tanta coisa falsa disseminada que já nem sabemos em que acreditar. As redes sociais estão afundadas nas falsas notícias, ou fake news, como preferem os apaixonados por termos em inglês. Para provar que não desistiram de prestigiar a verdade, instalam mecanismos de busca para vigiar e punir, no estrito sentido que Michel Foucault examina.

“A invisibilidade de tais mecanismos empregados por poderosas companhias de tecnologia tem seu design destinado a retratar a própria bolha de desejos e crenças... Embora haja um efeito democratizante destas buscas (...), elas também são classificadas por conteúdos parciais (de algoritmos, softwares e inteligência artificial) e baseadas na popularidade para fins mercadológicos”, ensina Lucia Santaella, em “A pós-verdade é verdadeira ou falsa? “

Talvez como resultado disso tudo, uma postagem de fotos que punha em evidência dois representantes do poder, envolvidos em guerras distanciadas no tempo, foi classificada como “parcialmente falsa”, pelo Facebook. Em primeiro lugar, seria preciso que os caçadores da rede explicassem o que entendem por “parcialmente”, e de que ponto de vista se situam os algoritmos (ou os investigadores) para emitir essa opinião. Em segundo, seria útil que fossem apontados (e provados), com clareza, os itens capazes de evidenciar essa falsidade parcial, dentro do todo exibido.

Fica evidente que a boas intenções das “caçadas” virtuais podem ser comprometidas. Como confiar que os “justiceiros”, que vigiam e punem as inverdades, não estejam a serviço de “verdades” suspeitas? Como não desconfiar da veracidade dos avisos, se eles mesmos também podem ser falsas notícias?

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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