É engenheiro de produção, cronista e colhereiro. Neste espaço, sempre às sextas-feiras, crônicas sobre a cidade e a vida em família têm destaque, assim como um olhar sobre os acontecimentos do país

Um papa, um presidente, um amigo: as perdas de abril e maio

“Com tanta gente ruim, com tanto homem safado pra morrer, por que tinha que ser papai, homem tão correto e trabalhador?”

Publicado em 16/05/2025 às 03h00

Na semana retrasada, achei por bem divulgar o texto que escrevi em 2012 sobre meu pai, Bolivar de Abreu, publicado na edição de 05 de maio no Caderno Pensar deste jornal, há exatos 50 anos de sua morte. Nele falo das lembranças que guardo sobre algumas de suas características pessoais, sobre seus gostos e sua maneira de viver, de criar filhos e de se divertir.

Também cuidei de relatar um pouco do que ele fez como homem público, destacando a criação e operação de um Centro de Saúde exemplar, que hoje leva seu nome, em Cachoeiro, e a construção de mais de 260 escolinhas, em muitos grotões do Estado. Como Secretário de Educação, ele mobilizou prefeitos, padres, fazendeiros e pais de crianças sem escola para darem sua contribuição efetiva. Resultando de esforços conjugados, foram todas inauguradas com festas concorridas.

Para além das emoções de adolescente de 14 anos pela perda do pai, um pensamento ficou martelando na minha cabeça e me voltou agora, ao sentar para escrever sobre a morte de três pessoas, nos meses de abril e maio, que ainda vai pela metade: “Com tanta gente ruim, com tanto homem safado pra morrer, por que tinha que ser papai, homem tão correto e trabalhador?”

Começo por Francisco, o papa argentino, homem das mais elevadas qualidades, pessoa alegre, gentil e amorosa. Seu sorriso franco tinha o poder de desarmar caras feias e quebrar resistências. Com apertos de mãos e abraços gentis, saudava quem estivesse ao seu redor. Atento ao que acontecia no mundo, interferia com sua opinião e seu apoio em favor dos mais fracos.

Após longa permanência no hospital, sempre irradiando bom humor, a sua inesperada presença diante de uma multidão emocionada, consolidou de vez sua condição de uma criatura plena que se despede. Depois disso, ao longo de uma semana inteira, as imagens de milhares de pessoas pesarosas reforçaram a sua importância neste mundão de Deus, como se diz.

Como se não bastasse, nesta semana perdemos mais um homem de primeira linha, da mais elevada condição humana, senhor de convicções pessoais como pouco se vê por aqui nem por ali nem acolá. Pepe, nosso vizinho mais querido, também se foi sabendo que seu tempo entre nós estava no fim. Morreu convicto de seus valores e de suas ideias.

José Pepe Mujica, ex-presidente do Uruguai
José Pepe Mujica, ex-presidente do Uruguai. Crédito: AP

Por todo lado, suas reflexões, próprias dos melhores sábios, que sempre expunha com simplicidade e clareza, ganharam presença maciça na imprensa e nas redes. Todas as palavras que li e ouvi, ditas por ele e por alguém sobre ele, atestam que perdemos um ser especial, um mestre generoso. Admiro Pepe Mujica desde muito antes de saber que ele, presidente, voltava pra casa dirigindo seu fusca já bem surrado.

Pra agravar a tristeza por essas duas perdas de pessoas relevantes pra mim, registro aqui a partida, esta totalmente inesperada, de Renato Magalhães, um grande amigo que nasceu e viveu em Cachoeiro e que adorava passar o verão, bestando, em Marataízes. Eu o conheci durante a primeira feira de mármore e granito que organizamos por lá, em 1988. De lá pra cá, foram muitas as trocas de mensagens, umas poucas conversas de trabalho e dezenas de outras, frouxas e descontraídas, próprias de quem prefere viver de bem com a vida. Renato era um tipo moleque, generoso e acolhedor.

Confesso que não sei bem o que poderá acontecer quando eu chegar em Cachoeiro sem saber a quem procurar primeiro.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

A Gazeta integra o

Saiba mais
Papa Francisco Crônica Mortes José Mujica

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.