Publicado em 19 de setembro de 2021 às 18:00
O ministro Marcelo Queiroga (Saúde) levou sua esposa e seus filhos, além de parentes de outras autoridades, em pelo menos 20 voos oficiais feitos com aeronaves da FAB (Força Aérea Brasileira). >
Os dados foram extraídos de registros de 68 voos do Ministério da Saúde de 25 de março a 8 de agosto, obtidos pelo jornal Folha de S.Paulo por Lei de Acesso à Informação (LAI). Todos os deslocamentos serviram para agendas oficiais de Queiroga, que assumiu o cargo em 23 de março. >
A médica Simone Queiroga acompanhou o ministro, seu marido, em 11 destes trajetos. Em duas ocasiões o destino foi João Pessoa, onde o casal tem residência. >
O ministério não quis informar se os parentes de Queiroga e de outras autoridades participaram das agendas ou por qual razão usaram as aeronaves da FAB. A pasta disse apenas que o ministro tem liberdade para preencher as vagas ociosas nas aeronaves. >
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Outros três filhos do ministro também estiveram em 8 voos diferentes. O advogado Marcelo Antônio Cartaxo Filho, por exemplo, voou ao lado do pai, no mesmo dia, de Brasília para São Paulo, depois ao Rio e retornou à capital federal. >
O estudante Antônio Cristóvão Araújo fez viagens de ida e volta de Brasília para Maceió em 1º de julho. No dia seguinte, viajou para Porto Alegre com o pai em voo da FAB. >
Já a médica Daniela Araújo acompanhou Queiroga em viagem do Rio de Janeiro para Brasília em 3 de agosto. Ela voltou à capital carioca no dia 7 do mesmo mês. >
Adriana de Souza Leão Coelho esteve com o marido, o senador Fernando Bezerra (MDB-PE), em voo do Ministério da Saúde de Petrolina (PE) para a capital, Recife. >
Esposa de Gilson Machado (Turismo), a médica Sarita Pessoa usou aeronave da FAB para seguir de Brasília para João Pessoa. O deslocamento também era para agenda de Queiroga. >
O Ministério do Turismo disse que a presença da esposa do ministro no voo "está em acordo" com decreto que regulamenta o uso das aeronaves por autoridades. Procurada, a assessoria do senador Bezerra não se manifestou. >
Poucos dias antes de assumir o Palácio do Planalto, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) distribuiu uma cartilha com normas e procedimentos éticos. No capítulo sobre voos oficiais, o documento afirmava que somente o ministro e a equipe que o acompanha no compromisso podem utilizar as aeronaves. >
Em março de 2020, Bolsonaro também mudou decreto sobre uso das aeronaves oficiais para, em tese, tornar as regras mais rígidas. >
A medida foi tomada após exoneração de José Vicente Santini do cargo de secretário-executivo da Casa Civil por usar voo oficial para ir da Suíça à Índia, onde encontraria Bolsonaro. O mesmo trajeto havia sido feito em voos comerciais por ministros. >
Na ocasião, Bolsonaro chamou de inadmissível e imoral o uso do voo oficial, mas Santini voltou ao governo meses mais tarde. No mês passado, Santini se tornou secretário Nacional de Justiça. >
Apesar do ato pontual para responder, Bolsonaro também usou voos pagos com dinheiro público para dar carona a parentes. >
Em maio de 2019 um helicóptero da Presidência da República levou convidados para o casamento do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), no Rio de Janeiro. O governo alegou "razões de segurança" para autorizar o voo e Bolsonaro chamou de "idiota" pergunta sobre o deslocamento. >
Em 2019, a Folha de S.Paulo revelou que a mulher do então ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, pegou carona para passar férias em Paris, na França, onde o chanceler participaria de encontro da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). >
A esposa de Ernesto, que foi e voltou com a aeronave oficial, ficou em Paris como turista, sem pagar passagem e compartilhando o quarto com o marido. A hospedagem foi custeada pelo governo, uma vez que Ernesto estava em missão oficial. >
Bolsonaro chegou a considerar "nada de mais" que uma autoridade do Poder Executivo conceda carona em uma aeronave da FAB após o caso do chanceler. >
"Se um avião presidencial nosso vai para algum lugar a serviço, não vejo nada de mais levar alguém no avião. Não vejo nada de mais nisso aí. Agora, se está errado, se tiver alguma norma dizendo o contrário, eu vou conversar com ele", disse o presidente em setembro de 2019. >
O decreto publicado após o voo de Santini, em março de 2020, afirma que a comitiva que acompanha a autoridade na aeronave "terá estrita ligação com a agenda a ser cumprida, exceto nos casos de emergência médica ou de segurança". >
Questionado sobre esse ponto do decreto, o Ministério Saúde apenas mencionou outro artigo do mesmo texto que abre margem para dar a carona até para quem não relação alguma com a agenda. >
"Ficarão a cargo da autoridade solicitante os critérios de preenchimento das vagas remanescentes na aeronave, quando existirem vagas disponíveis além daquelas ocupadas pelas autoridades que compartilharem o voo e por suas comitivas", afirma o trecho citado pela pasta. >
Bolsonaro ainda usou recentemente voos da FAB para trazer para perto aliados políticos. >
O presidente de Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, veio ao Brasil em agosto para visita oficial. O deslocamento foi feito em avião da Força Aérea. >
Em resposta via Lei de Acesso à Informação, o Ministério da Defesa disse que o governo brasileiro pagou US$ 3,6 mil (cerca de R$ 19 mil) em diárias e taxas alfandegárias e aeroportuárias para buscar Embaló. >
A pasta alegou sigilo e não informou valor de manutenção, gasolina e outros custos envolvidos no deslocamento. >
Em 9 de setembro Bolsonaro mandou um jato da FAB a São Paulo para buscar o ex-presidente Michel Temer (MDB). Juntos, já em Brasília, eles escreveram a nota de recuo para esfriar ações de raiz golpistas e desdobramentos das manifestações de 7 de Setembro. >
O uso das aeronaves para caronas a parentes e outras pessoas sem relação com agendas dos ministros não foi inaugurado no governo Bolsonaro. A Folha de S.Paulo mostrou, em 2017, que ministros de Temer levaram parentes, amigos e lobistas nas aeronaves da FAB. >
Em 2015 a então presidente Dilma Rousseff (PT) impediu voos de ministros em jatos da FAB para voltar para casa. Anos antes, como mostrou a Folha de S.Paulo, Fernando Haddad, então ministro da Educação, fez 129 deslocamentos de Brasília a São Paulo com familiares. >
Autoridades de outros Poderes também usam as aeronaves. >
Em 2019, o então presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Dias Toffoli, usou aeronave da FAB para ir a um evento em uma cidade de pouco mais de 10 mil habitantes numa sexta-feira, emendando a estadia por todo o fim de semana em um resort de luxo na região. >
Já Renan Calheiros (MDB-AL) devolveu R$ 27,4 mil aos cofres públicos em 2013, quando era presidente do Senado, por usar voo oficial para viagem de Brasília a Recife, onde fez implante capilar.>
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