Publicado em 4 de outubro de 2019 às 08:36
AGÊNCIA FOLHAPRESS - Quando pediu licença do cargo de secretário da Casa Civil do governo João Doria (PSDB), ainda em dezembro do ano passado, antes de assumir a função, Gilberto Kassab (PSD) afirmou à imprensa que o afastamento por causa de uma acusação de corrupção seria "o mais breve possível".>
Nove meses depois, no entanto, Kassab, que é presidente do PSD, continua licenciado e sem receber salário. O cargo é exercido na prática pelo secretário-executivo da pasta, Antonio Carlos Rizeque Malufe, aliado do titular e também filiado ao PSD.>
Mesmo fora do governo, Kassab mantém a fidelidade a Doria, com quem conversa frequentemente. O ex-ministro atua na articulação política do governo paulista e chega a receber deputados estaduais e federais para conversas.>
São atribuições da Casa Civil o relacionamento com os deputados e a aprovação dos projetos de lei de interesse do governo na Assembleia Legislativa. A pasta cuida ainda da ponte com as prefeituras, o governo federal e o Congresso Nacional.>
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Em 19 de dezembro, Kassab foi alvo de operação de busca e apreensão da Polícia Federal no âmbito de um inquérito baseado em delação da JBS. Executivos disseram que ele e o diretório nacional do PSD receberam R$ 58 milhões da JBS de 2010 a 2016.>
Kassab diz não ter cometido irregularidades. Após a ação da PF, ele pediu licença para preservar o recém-eleito governo Doria e para cuidar de sua defesa.>
Em nota à reportagem, Kassab afirmou que "tem atuado na organização de sua defesa, que comprovará, no tempo da Justiça, a lisura de seus atos". Completou que "tem exercido a presidência nacional do PSD e segue apoiando o governador e oferecendo suporte a suas demandas no campo político".>
Nada indica que essa situação irá se alterar. O governo Doria não cogita um prazo. O plano se mantém tal qual foi combinado no fim do ano passado, de que o ex-ministro e ex-prefeito permaneça licenciado até que prove sua inocência, conforme espera o governador tucano. >
Demitir Kassab não é uma opção, segundo membros do governo consultados pela reportagem. Isso, eles dizem, daria a impressão de que o ex-prefeito é considerado culpado.>
Kassab é investigado por suspeita de corrupção passiva e falsidade ideológica eleitoral. O caso, contudo, não avançou nesses nove meses ?segue na fase de inquérito. O procedimento foi instalado em fevereiro de 2018 no Supremo Tribunal Federal, já que o ex-prefeito ocupava o cargo de ministro do governo Michel Temer (MDB). >
Com a perda do foro especial, a então procuradora-geral da República, Raquel Dodge pediu, em fevereiro deste ano, que o STF remetesse o inquérito para o Tribunal Regional Federal em São Paulo.>
No mês seguinte, o STF decidiu que crimes comuns, como corrupção e lavagem de dinheiro, devem ser julgados pela Justiça Eleitoral se estiverem relacionados a caixa dois de campanha, como é o caso de Kassab. Em maio, o ministro Alexandre de Moraes enviou o inquérito para o TRE-SP.>
No Tribunal Regional Eleitoral, o caso também pouco avançou ?não houve arquivamento ou oferecimento de denúncia. O inquérito foi enviado para a 1ª Zona Eleitoral de São Paulo e, desde o fim de agosto, está com a Polícia Federal.>
Segundo a apuração da Procuradoria-Geral da República, Kassab recebeu da JBS uma mesada de R$ 350 mil de 2010 a 2016, totalizando R$ 30 milhões. Nesse período, ele foi prefeito de São Paulo, de 2006 a 2012, e ministro do governo Dilma Rousseff (PT), de 2015 a 2016.>
Ainda de acordo com a PGR, os pagamentos tinham o objetivo de contar com a influência do político a favor dos interesses da empresa e eram feitos por meio de contratos falsos entre a JBS e uma empresa do ramo de transportes, ligada a Kassab e sua família.>
O ex-ministro argumenta que os serviços da empresa eram de fato prestados e que a relação comercial existe desde antes de a JBS adquirir o negócio. A Polícia Federal rastreou pagamentos de R$ 23 milhões da JBS a empresas ligadas a Kassab.>
Em 2014, afirma a PGR, a JBS pagou R$ 28 milhões ao diretório nacional do PSD para garantir que o partido apoiasse o PT na eleição presidencial daquele ano. Os pagamentos teriam sido feitos por meio de doações de campanha, dinheiro vivo e quitação de notas fiscais falsas.>
A busca e apreensão na casa de Kassab encontrou R$ 300 mil em dinheiro. Ele justificou a quantia em espécie pelo fato de seus bens estarem bloqueados no âmbito de outra ação, sobre repasse de caixa dois da Odebrecht.>
No dia 1º de janeiro, dias após a operação, Kassab não compareceu à posse de Doria e seus secretários. Ele foi empossado e teve a licença determinada por um decreto de 3 de janeiro assinado pelo governador.>
O documento autoriza o afastamento "com prejuízo dos vencimentos e sem quaisquer ônus para o Estado" para "tratar de assuntos de interesse particular". Kassab afirma que "sua decisão foi tomada com o objetivo de permitir que órgãos internos e externos avaliem os fatos com absoluta independência".>
Fora do governo, a atuação de Kassab se dá principalmente em Brasília, defendendo os interesses de São Paulo junto ao governo de Jair Bolsonaro (PSL) e em projetos como o da reforma da Previdência e da reforma tributária.>
Malufe, que atua como chefe da Casa Civil, foi secretário de Relações Governamentais de Kassab na prefeitura e articulou a criação do PSD. Também foi secretário do ex-governador Mário Covas (PSDB).>
Kassab afirmou, em nota, que Malufe é "extremamente qualificado" e atua "sob a lógica coordenação do governador".>
Apesar de não ter abandonado o barco de Doria, Kassab tem concentrado sua atividade no comando do PSD. Com a aproximação das eleições de 2020, começa a articular alianças e montar estratégia para lançar candidatos nas principais cidades do país. Em São Paulo, o pré-candidato do PSD é Andrea Matarazzo.>
Além do inquérito da JBS, Kassab foi delatado por Odebrecht, CCR e Léo Pinheiro, da OAS. Ele teve R$ 21 milhões bloqueados em setembro de 2018, que seria o valor repassado pela empreiteira via caixa dois entre 2008 e 2014. Nesse caso, ele se tornou réu sob acusação de improbidade administrativa.>
Kassab também é réu sob acusação de improbidade por irregularidades na licitação da inspeção veicular quando era prefeito. Ele nega as acusações.>
Em relação ao caso da JBS, Kassab afirma em nota "sua confiança na Justiça brasileira, no Ministério Público e na imprensa". Diz "estar à disposição para quaisquer esclarecimentos que se façam necessários e ressalta, mais uma vez, que todos os seus atos seguiram a legislação e foram pautados pelo interesse público".>
Procurado, o governo Doria não quis se manifestar.>
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