Publicado em 19 de janeiro de 2019 às 13:03
Com um discurso que prega mudanças radicais nas universidades, o presidente Jair Bolsonaro poderá escolher o reitor de 11 instituições federais neste ano.>
As indicações serão feitas após a edição de um documento, nos últimos dias da gestão Michel Temer (MDB), que reduz o poder dos estudantes e funcionários nas eleições internas. Trata-se de uma nota técnica do Ministério da Educação assinada no dia 13 de dezembro de 2018, durante o processo de transição.>
O documento diz que são ilegais consultas internas para escolha de reitor nas quais o peso do voto dos professores é menor do que 70%.>
A proporção contraria a prática de muitas universidades federais, que adotam processos de escolha nos quais o voto de cada categoria (alunos, professores e funcionários) tem peso de um terço do total.>
>
Mapeamento da UnB (Universidade de Brasília), de 2012, mostrou que 37 das 54 federais usavam esse sistema, chamado de paritário.>
Para evitar questionamentos legais, as universidades tratam a votação paritária como uma consulta informal. A eleição oficial é feita por colegiados que seguem o peso de 70% dos votos para os docentes, como está previsto na lei. Esses órgãos costumam referendar o resultado das consultas paritárias.>
O processo tinha o aval de uma nota técnica de 2011 do MEC com o seguinte teor: "a realização (...) de consultas informais à comunidade universitária com a configuração dos votos de cada categoria da forma que for estabelecida, inclusive votação paritária, não contraria qualquer norma posta". Já a nota de 2018 diz que "votação paritária ou que adote peso dos docentes diferente de 70% será ilegal" e que isso se aplica a consultas formais e informais.>
A nota também impede, como por vezes ocorre, o envio de listas com menos de três nomes ao presidente, a quem cabe a escolha final. Desde o governo Lula, o primeiro colocado tem sido o indicado.>
Não se sabe que conduta adotará Bolsonaro, que muitas vezes atacou um suposto viés de esquerda nas instituições. Questionado, o MEC afirmou apenas que a atual gestão está estudando as ações e programas da área.>
Uma das universidades que faz consultas informais paritárias é a UFRJ (federal do Rio de Janeiro). Em 2014, o atual reitor Roberto Leher ficou em segundo lugar por pequena margem entre os professores no processo, mas venceu com folga entre os alunos. Acabou em primeiro da lista tríplice.>
Filiado ao PSOL, ele é alvo de críticas de apoiadores de Bolsonaro. Procurada, a universidade afirma que seu colégio eleitoral tem pelo menos 70% de representação docente e que a consulta prévia é uma "pesquisa eleitoral de caráter informativo", sem vinculação com a escolha final.>
Com pleito em 30 de abril, a universidade é uma das dez federais que têm reitor com mandato para vencer neste ano, segundo dados da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior).>
As outras são a UFC (federal do Ceará), UFGD (Grande Dourados), UFMA (Maranhão), UFPE (Pernambuco), UFRB (Recôncavo da Bahia), UFRN (Rio Grande do Norte), UFV (Viçosa), UFVJM (Vales do Jequitinhonha e Mucuri) e Unirio (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro).>
No caso da UFRN, a eleição já ocorreu, em 2018. A instituição fez consulta prévia paritária, mas diz entender que a nota do MEC não se aplica à sua eleição, pois foi assinada após o envio da lista tríplice.>
Caberá a Bolsonaro ainda a escolha do reitor da UFTM (Triângulo Mineiro), cuja eleição ocorreu em agosto. Uma minuta com a nomeação do primeiro colocado chegou a ser redigida pelo governo Temer, mas a indicação não saiu, e a universidade está sob comando interino. Parecer da AGU diz que a consulta interna da universidade é válida.>
A UFC, a Unirio e a UFMA dizem não fazer consulta paritária. A UFGD diz que sim e que irá mantê-la com base em parecer da sua Procuradoria. A UFVJM diz que fazia, mas que o Conselho Universitário irá avaliar a nova nota técnica. As demais não se pronunciaram.>
A Andifes afirma seguir a Constituição, que garante a autonomia, e a lei que já regula o processo de escolha de reitores. "Assim tem ocorrido nos últimos anos e isso tem possibilitado direções plurais, legítimas e competentes", diz.>
Secretária-geral do Andes, sindicato dos docentes, a professora Eblin Farage classificou a nota do MEC como um ataque à autonomia universitária. "Os três segmentos que compõem a universidade devem ter o mesmo direito de escolher seu gestor", afirma.>
Ela diz temer que a nota técnica seja usado como justificativa para intervenções nas universidades. A UNE foi procurada, mas não se manifestou.>
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta