Publicado em 1 de janeiro de 2022 às 14:04
O presidente Jair Bolsonaro (PL) omitiu fatos e distorceu informações relacionadas ao combate à pandemia e às ações do governo nos últimos anos durante o pronunciamento de seis minutos que foi ao ar em rede nacional de rádio e TV na noite desta sexta-feira (31).>
Durante a fala, panelaços foram registrados em capitais como Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro e Florianópolis e também em Vitória. >
Na capital do Espírito Santo, a manifestação aconteceu em bairros como Jardim Camburi, Jardim da Penha e Praia do Canto. Na cidade vizinha, Vila Velha, panelaços também foram registrados. No vídeo abaixo, é possível ouvir palavras de ordem como 'Fora Bolsonaro' e 'Genocida'. A gravação foi feita no bairro Praia das Gaivotas.>
Numa tentativa de justificar o atraso da imunização contra a Covid-19 no país, que começou em janeiro apenas em grupos prioritários, Bolsonaro afirmou que em 2020 "não existia vacina disponível no mercado".>
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Ele não comentou, no entanto, a decisão do governo brasileiro de rejeitar, naquele ano, uma proposta da farmacêutica Pfizer que previa 70 milhões de doses de vacinas a serem distribuídas ao longo de 2021.>
A oferta estipulava o início de imunização em dezembro de 2020, com 1,5 milhão de doses e mais 3 milhões no primeiro trimestre de 2021. O Ministério da Saúde só firmou acordo com o laboratório em março de 2021, quando adquiriu 100 milhões de doses.>
Somente no fim do discurso, Bolsonaro falou sobre a situação da Bahia e do norte de Minas Gerais, locais atingidos pelas fortes chuvas.>
"Lembro agora dos nossos irmãos da Bahia e do norte de Minas Gerais, que neste momento estão sofrendo os efeitos das fortes chuvas na região. Desde o primeiro momento, determinei que os ministros João Roma [Cidadania] e Rogério Marinho [Desenvolvimento Regional] prestassem total apoio aos moradores destes mais de 70 municípios atingidos", disse.>
Ao longo da semana, o chefe do Executivo foi criticado por manter o descanso em Santa Catarina no momento em que os baianos enfrentam os prejuízos provocado pela tragédia.>
Ainda no contexto da pandemia, o presidente destacou como um dos feitos do Planalto a criação do auxílio emergencial, mas não citou as mudanças feitas pelo Congresso na iniciativa, que ampliaram o valor do benefício.>
"Para aqueles que perderam sua renda, criamos o auxílio emergencial, onde 68 milhões de pessoas se beneficiaram. O total pago em 2020 equivale a mais de 13 anos de gasto com o antigo Bolsa Família", afirmou.>
No início da crise provocada pelo coronavírus, em março de 2020, a equipe econômica pretendia distribuir R$ 200 aos trabalhadores informais. Somente após críticas, Bolsonaro começou a defender o valor de R$ 600, que foi aprovado pelos parlamentares.>
No pronunciamento, ele ainda voltou a criticar o passaporte da vacina e a imunização de crianças de 5 a 11 anos de idade, ambos recomendados pela Anvisa (Agência de Vigilância Sanitária).>
"Não apoiamos o passaporte vacinal nem qualquer restrição àqueles que não desejam se vacinar. Também, como anunciado pelo ministro da Saúde, defendemos que as vacinas para as crianças entre 5 e 11 anos sejam aplicadas somente com o consentimento dos pais e prescrição médica. A liberdade tem que ser respeitada", disse.>
A postura do presidente sobre esses assuntos tem sido considerada inadequada por especialistas, que avaliam que a Anvisa já forneceu todas as informações técnicas necessárias para justificar a necessidade do comprovante de vacinação e de se vacinar os mais jovens.>
Bolsonaro também repetiu o ataque aos governadores e prefeitos pelas restrições adotadas durante a pandemia com o objetivo de conter a disseminação do vírus.>
"Com a política de muitos governadores e prefeitos de fechar comércios, decretar lockdown e toques de recolher a quebradeira econômica só não se tornou uma realidade porque nós criamos o Pronampe e o BEM, programa para socorrer as pequenas e médias empresas, bem como fomentar acordos entre empregadores e trabalhadores para se evitar demissões.">
Nos outros trechos do pronunciamento, o presidente citou ações realizadas pela gestão desde 2019 e disse que completa "três anos de governo sem corrupção".>
A realidade, porém, é outra. O combate à corrupção, enaltecido por Bolsonaro, é tratado de maneira pouco enfática no governo. Sempre que confrontado com suspeitas envolvendo aliados, amigos e familiares, o presidente critica imprensa, Ministério Público e Judiciário, enquanto alvos são mantidos nos cargos.>
Em novembro de 2018, após eleito, Bolsonaro afirmou que ministros alvo de acusações contundentes deveriam deixar o governo, o que não se concretizou na prática.>
O ministro Marcelo Álvaro Antônio (Turismo), por exemplo, seguiu no governo após ter sido indiciado pela Polícia Federal e denunciado pelo Ministério Público de Minas sob acusação de envolvimento no caso das candidaturas laranjas do PSL.>
Desde que assumiu a Presidência, Bolsonaro contesta ações de órgãos de controle para investigar seu núcleo familiar.>
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) é investigado em um esquema de "rachadinhas" na Assembleia do Rio. E o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) é suspeito de abrigar funcionários fantasma na Câmara Municipal do Rio.>
Ao comentar sobre a saída de ministros do governo, Bolsonaro afirmou que "alguns nos deixaram por livre e espontânea vontade. Outros foram substituídos por não se adequarem aos propósitos da maioria que me elegeu".>
Ele omitiu, porém, o caso do ex-ministro Sergio Moro, que pediu demissão do Ministério da Justiça, em abril de 2020, não por esses motivos, mas por alegar interferência do presidente na Polícia Federal.>
Bolsonaro também afirmou que levou "tranquilidade ao campo" e citou as medidas de flexibilização de posse e porte de arma de fogo no Brasil.>
Dados divulgados pela CPT (Comissão Pastoral da Terra), braço da Igreja Católica que atua junto a minorias em zonais rurais e publica cadernos sobre o tema anualmente desde 1985, contradizem o presidente.>
De acordo com a comissão, até o início de dezembro, foram registrados 103 óbitos por conflitos no campo neste ano, segundo dados preliminares adiantados ao jornal Folha de S.Paulo e divulgados pela comissão. O número pode ser ainda maior, uma vez que o levantamento só estará consolidado para publicação no ano que vem.>
Em relação à economia, Bolsonaro apresentou dados imprecisos ao afirmar que o Brasil termina 2021 com "um saldo de 3 milhões de novos empregos".>
De janeiro a novembro, foram abertas 2,99 milhões de novas vagas. Porém, o resultado de dezembro ainda não foi divulgado. Os números do último mês do ano costumam ser negativos e devem reduzir esse saldo.>
Ele também destacou que o país tem um saldo positivo de 5 milhões de empresas abertas, mas não esclareceu que dentro desse número estão incluídos os MEIs (microempreendedores individuais).>
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