Publicado em 30 de julho de 2021 às 18:34
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) convidou um líder africano acusado de promover uma guinada autoritária em seu país para uma visita oficial ao Brasil. >
A informação foi revelada pelo próprio Bolsonaro em conversa com apoiadores na noite de quarta-feira (28). Porém, na ocasião ele não se lembrou do nome de seu convidado ou do país governado por ele. >
"Eu vou receber, final de setembro se eu não me engano. Lá da África, qual o país da África? Eu conversei com ele", disse o presidente aos simpatizantes. >
"Ele é conhecido como Bolsonaro da África. Ele por acaso é general de Exército", afirmou. >
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De acordo com interlocutores, Bolsonaro se referiu ao presidente de Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló. >
O presidente brasileiro conversou por telefone com Embaló na semana passada. O compromisso não constou da agenda oficial. >
No telefonema, o presidente realizou o convite para que Embaló venha ao Brasil. >
Apesar de o presidente ter dito que espera receber o guineense em setembro, pessoas que acompanham o tema disseram à reportagem que ainda não há planejamento para a visita. >
O líder guineense é um admirador de Bolsonaro e partilha com o brasileiro um passado militar. >
Na Guiné-Bissau, ele é criticado pela indicação de militares para postos-chave da estrutura do Estado, em detrimento de servidores civis, e por apoiar a repressão policial contra uma greve de professores e profissionais de saúde. >
Embaló também tem defendido uma reforma da Constituição do país. Segundo críticos, a mudança constitucional tem por objetivo concentrar poderes nas mãos do presidente. >
O autoritarismo do líder guineense faz com que opositores o acusem de tentar implementar uma ditadura no país. >
Militar da reserva, Embaló disse em entrevista recente ver Bolsonaro como uma inspiração. >
"O vice-presidente do Brasil [Hamilton Mourão] disse-me durante a cimeira [cúpula] da CPLP [Comunidade dos Países da Língua Portuguesa], em Luanda, que o Jair Bolsonaro decidiu candidatar-se à Presidência brasileira por entender que o Brasil não podia correr mais riscos. Porque os civis não se entendem", afirmou Embaló em 20 de julho, segundo o serviço em português da Deutsche Welle, rede pública de comunicação da Alemanha. >
Guiné-Bissau é uma ex-colônia portuguesa, que faz parte da CPLP. >
"Então, [Bolsonaro disse:] vamos concorrer às presidenciais e, se ganharmos, vamos pôr ordem no Brasil", disse o presidente guineense ainda de acordo com o portal alemão, Embaló afirmou feito a mesma coisa em seu país. >
A cúpula da CPLP ocorreu em meados de julho, na capital de Angola. >
De acordo com Alexandre dos Santos, professor de África no Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), Embaló usa a associação com Bolsonaro para defender suas ações de política interna. >
Ele citou o presidente brasileiro para justificar a militarização de seu governo, ao afirmar que os fardados estão preenchendo diversos cargos no Estado para lidar com problemas para os quais os civis não encontraram solução, como a corrupção. >
Além do mais, disse Santos, Embaló usou a retórica de Bolsonaro ainda na campanha presidencial, ao se apresentar como um postulante contra a "velha política". >
Se a visita se concretizar, Embaló deve encontrar em Brasília um cenário diferente do que o descrito por ele para a população guineense. >
Acuado por uma crise de popularidade e com sua reeleição ameaçada, Bolsonaro selou uma aliança com o centrão, que, na prática, reduziu o poder da ala militar do governo. >
Na avaliação de Santos, a eventual visita a Brasília representará um ganho político expressivo para Embaló e deve ser explorada pelo guineense. >
"Para o Bolsonaro não vai fazer diferença alguma, porque ele vai receber alguém com quem apenas tem proximidade ideológica. Quem vai ganhar muito é o Embaló, porque vai usar a viagem para defender suas posições ideológicas internamente, o que é muito ruim para a democracia de Guiné-Bissau", afirmou. >
O convite ao líder guineense ocorre na mesma semana em que Bolsonaro foi criticado por ter recebido no Palácio do Planalto a líder de ultradireita alemã Beatrix von Storch. Ela é neta de um ex-ministro das Finanças do governo do nazista Adolf Hitler. >
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