Publicado em 25 de outubro de 2018 às 12:23
O cantor e compositor Caetano Veloso alertou que os brasileiros podem esperar "uma onda de medo e ódio" caso Jair Bolsonaro (PSL) seja eleito presidente no domingo, em artigo publicado no jornal americano "New York Times". No texto, intitulado "Tempos sombrios se avizinham para meu país", o artista ressalta que "forças sombrias" internas e externas arriscar um Brasil "aparentemente maduro", mas que "está longe" de ter sólida democracia.>
Caetano atribuiu o avanço da extrema-direita à decadência da vida política, mas rechaçou a ideia de que o PT seja ameaça autoritária semelhante ao do adversário. Ele criticou a violência que ceifou a vida de seu amigo Moa do Katendê, ressaltou suas memórias de exilado da ditadura e frisou que, mesmo em um eventual governo do militar, não deixará o país de novo.>
Nesta terça-feira, Caetano defendeu Mano Brown das vaias de petistas. Em comício, o rapper ressaltou que o PT "vai pagar o preço" por falhar na comunicação com eleitores. O compositor ressaltou que a fala do colega era um alerta da necessidade de alcançar o povo "hipnotizado pela onda" (bolsonarista). A análise de Caetano no "NYT" se iniciou com citação ao compositor Antonio Carlos Jobim, segundo o qual "o Brasil não é para principiantes".>
Na visão do cantor, a exemplo de outros países no mundo, o Brasil "enfrenta uma ameaça da extrema-direita, uma tempestade de conservadorismo populista". Bolsonaro, a quem classificou como "novo fenômeno político", é descrito como admirador do presidente americano Donald Trump, mas parecido com o filipino Rodrigo Duterte. O compositor criticou a proposta de automática legítima defesa a policiais que matarem "suspeitos" e a declaração do presidenciável de que prefere um filho morto a um filho gay.>
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"Nós já vimos sangue", escreveu o cantor, em referência ao amigo Moa do Katendê, mestre de capoeira esfaqueado por um apoiador de Bolsonaro após uma discussão política na Bahia. Com o cenário atual, Caetano diz que tem pensado muito sobre os anos 1980, quando os brasileiros lutavam por eleições diretas e contra 20 anos de ditadura militar. Na ocasião, ele disse que não acreditava que o país pudesse eleger, algum dia, pessoas como Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que "ajudaram milhões a escaparem da pobreza".>
Caetano ressaltou que a vida política está em declínio há algum tempo - a começar pela crise econômica, pelos protestos de 2013 e seguir com o impeachment de Dilma Rousseff (PT) e um "grande escândalo de corrupção que colocou vários políticos, inclusive Lula, na cadeia". O cenário afetou os PT e PSDB, a extrema-direita "encontrou uma oportunidade" e Bolsonaro ascendeu como "figura mítica", escreveu. Este processo, segundo ele, contou com uma ideologia reacionária de ataques a políticas progressistas como "pesadelo da Venezuela" ou supostos riscos a princípios religiosos e morais. Ele frisou que não é eleição de dois extremos.>
"Muitos na mídia mainstream ignoram o fato de que Lula respeitou as regras democráticas e que Bolsonaro repetidamente defendeu a ditadura militar de 1960 e 1970", escreveu Caetano, que ressaltou a defesa do militar ao torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra. "Nos anos 1960, a junta militar aprisionou e prendeu vários artistas e intelectuais por suas visões políticas. Eu era um deles, ao lado de meu amigo Gilberto Gil".>
No texto, Caetano contou que passou uma semana em uma cela suja. Ele acabou transferido para uma prisão militar por dois meses. No período, ele recordou ouvir os gritos de pessoas. O cantor ficou ainda quatro meses de prisão em casa e, por fim, foi exilado.>
Caetano pondera que o discurso "brutal" de Bolsonaro soa como o de muitos brasileiros, mas que, para governar o Brasil, ele deverá encarar o Congresso, o Supremo Tribunal Federal e o fato de que pesquisas mostram recorde de brasileiros que veem a democracia como melhor sistema político.>
"Várias pessoas dizem que planejam viver no exterior se o capitão vencer (a eleição). Eu nunca quis viver em qualquer outro país senão o Brasil. Eu não quero agora. Eu fui forçado a me exilar uma vez. Não acontecerá de novo. Quero que minha música, minha presença sejam permanente resistência a qualquer efeito anti-democrático que possa decorrer de um provável governo Bolsonaro", ressaltou o artista.>
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