O que antes funcionava como um verdadeiro cheque em branco nas transferências de recursos federais para estados e municípios acaba de ganhar regras mais rígidas. As chamadas "emendas Pix", criadas em 2019, revolucionaram a forma como parlamentares enviam dinheiro para seus redutos eleitorais: como sugere o apelido, sua principal característica era a simplicidade — o recurso chegava diretamente às contas dos entes federativos, sem necessidade de convênios com a União. Agora, com a Lei Complementar nº 210, esse modelo passa por uma transformação com maior controle do destino.
A relevância dessas transferências fica clara quando olhamos os números. Para 2025, o Congresso aprovou R$ 39 bilhões em emendas parlamentares individuais e de bancada. Para se ter uma ideia da magnitude, apenas esse valor supera o orçamento anual do Espírito Santo para 2025, estimado em R$ 29 bilhões.
Dados da Instituição Fiscal Independente (IFI) mostram que, até setembro de 2024, as emendas já consumiram R$ 45,7 bilhões dos R$ 153 bilhões em despesas discricionárias do governo federal — quase 30% dos gastos não obrigatórios.
Diante desse volume expressivo de recursos, a Lei Complementar nº 210 estabelece três mudanças principais no modelo. A primeira, e mais importante, é que os recursos não chegarão mais sem destino definido: cada transferência precisará indicar previamente qual política pública será financiada.
A segunda é a exigência de que, após receber o dinheiro, estados e municípios apresentem em 30 dias um plano de trabalho detalhado aos órgãos de controle. Por fim, a lei cria mecanismos de controle preventivo, definindo claramente situações que configuram impedimentos técnicos, como incompatibilidade do projeto com as atribuições do órgão executor.
Para prefeitos e governadores, as emendas Pix continuam sendo uma fonte atrativa de recursos. As principais vantagens do modelo são preservadas: transferência rápida, menor burocracia em comparação aos convênios tradicionais e caráter impositivo — ou seja, uma vez aprovadas, precisam ser executadas. No entanto, o novo marco legal exige mais organização dos gestores.
Nesse sentido, o Espírito Santo desponta como exemplo de boa prática nacional. Reconhecido como um dos estados com melhor gestão fiscal do país, foi um dos pioneiros a propor uma regulamentação local para organizar a execução desses recursos. A iniciativa, desenvolvida pela equipe de Consultores do Tesouro Estadual da Sefaz-ES, criou um fluxo estruturado de processos além de qualificação das equipes técnicas para adaptação às regras, demonstrando a importância do investimento em corpo técnico especializado para gerir esse tema.

O momento atual é crucial para os municípios que desejam acessar esses recursos em 2025. É hora de procurar parlamentares da bancada federal, apresentando projetos já com objeto definido. Dois pontos merecem especial atenção: além da previsão no orçamento federal, os municípios precisam incluir esses recursos em seus próprios orçamentos, e quando o dinheiro chegar, terão apenas 30 dias para apresentar o plano de trabalho — prazo que exige preparação prévia das equipes técnicas.
As emendas Pix deixam assim de ser um "cheque em branco" para se tornarem "transferências com destino certo". Para além do cumprimento formal das novas regras, o verdadeiro desafio será usar esses instrumentos para assegurar que recursos tão expressivos do orçamento federal não apenas sigam os trâmites corretos, mas efetivamente financiem intervenções que façam diferença na vida dos cidadãos.
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