Autor(a) Convidado(a)
É advogada familiarista há quase 40 anos, especialista em divórcio e alienação parental

Divórcio por liminar: entenda o que muda com decisão do STJ

Ao reconhecer a possibilidade de decretar o divórcio logo no início da ação, ainda em caráter liminar, mesmo sem citar a outra parte, o tribunal reafirma um princípio básico: ninguém deve permanecer casado contra a sua vontade

  • Flavia Brandão É advogada familiarista há quase 40 anos, especialista em divórcio e alienação parental
Publicado em 28/08/2025 às 14h48

O recente entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao autorizar o chamado “divórcio por liminar”, representa um avanço para o Direito de Família brasileiro e, sobretudo, para a vida prática de milhares de pessoas que enfrentam o doloroso processo de pôr fim a um casamento. Sempre defendi que a dissolução de um vínculo conjugal deve ser tratada com a máxima seriedade, mas também com a devida celeridade.

A Emenda Constitucional nº 66 de 2010 já havia deixado claro que o divórcio é um direito potestativo, ou seja, basta a vontade de uma das partes para que o vínculo se rompa. Mesmo assim, os juízes hesitavam em decretar o divórcio de forma imediata, permitindo que o processo se arrastasse e transformasse a vida das partes em um campo de batalha processual. É nesse ponto que a decisão do STJ merece ser saudada.

Ao reconhecer a possibilidade de decretar o divórcio logo no início da ação, ainda em caráter liminar, mesmo sem citar a outra parte, o tribunal reafirma um princípio básico: ninguém deve permanecer casado contra a sua vontade. Se uma pessoa decide encerrar o vínculo, não há justificativa para obrigá-la a esperar a conclusão de debates sobre partilha de bens ou guarda de filhos para que sua liberdade civil seja restituída. Isso, com frequência, traz ainda mais polêmicas processuais e acirra emocionalmente as partes envolvidas.

Podem argumentar que já existe no Congresso a proposta do chamado divórcio unilateral extrajudicial, a ser feito diretamente em cartório. Porém, enquanto essa possibilidade ainda depende de aprovação legislativa, a liminar judicial já se aplica agora, fruto da interpretação constitucional dada pelo STJ. Em outras palavras, não precisamos esperar a reforma do Código Civil: o Judiciário já pode e deve agir nesse sentido.

Os números ajudam a dimensionar a importância do tema. Em 2023, quase 500 mil casais se divorciaram no Brasil. Esse volume mostra que o divórcio deixou de ser exceção para se tornar um fenômeno social frequente. E o Judiciário não pode fechar os olhos. Prolongar artificialmente a manutenção do vínculo conjugal apenas porque o processo ainda não resolveu as questões de filhos, por exemplo, não se justifica.

Com a pandemia, cartórios passaram a realizar divórcios virtualmente, em alguns casos
Com a pandemia, cartórios passaram a realizar divórcios virtualmente, em alguns casos. Crédito: Divulgação

Mais que isso, é juridicamente incoerente com o que a Constituição já determina desde 2010. É evidente que o divórcio por liminar não resolve tudo. Questões como a divisão do patrimônio, a guarda dos filhos e a fixação de alimentos continuam a exigir análise cuidadosa, produção de provas e, muitas vezes, longas discussões.

Mas isso não diminui o avanço: trata-se de separar o que é direito de liberdade individual do que é direito de natureza patrimonial ou familiar, que demanda análise probatória. Que mais decisões assim possam surgir, para o bem de todos.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

A Gazeta integra o

Saiba mais
Direito Justiça Divórcio STJ Família

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.