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É advogado e especialista em Direito Constitucional

Democracia é mais do que a mera garantia do voto

Não é sem propósito que o Código Eleitoral, recepcionado pela Constituição Federal, dentre vários crimes que enumera, estabelece quanto ao processo eleitoral, no Artigo 297, que é crime impedir ou embaraçar o exercício do sufrágio

  • Luiz Otávio Coelho É advogado e especialista em Direito Constitucional
Publicado em 04/01/2024 às 15h30

Tem sido intenso o discurso sobre a democracia, inclusive com propaganda institucional a respeito da garantia do direito de voto e com debates sobre a higidez, ou não, do processo de votação eletrônica.

Alinhamento ideológico à parte, parece que o embate está indo por um caminho no mínimo equivocado, já que democracia pressupõe aspectos muito mais profundos e densos do que a mera garantia de votar.

A base da democracia finca raízes profundas na liberdade, sob vários aspectos. Um deles diz respeito à liberdade que permita ao cidadão a livre formação de opinião que o conduza a escolher, conscientemente, um candidato ou o modelo de governança que, durante um determinado período, vai reger o Estado e as inter-relações

O sufrágio que se constitui na escolha consciente não pode, sob pena de destruir a democracia, ser influenciado por qualquer manipulação, imposta pela força ou por desconhecimento. O sufrágio deve ser um ato livre, formado a partir do igualmente livre processo de convencimento.

Qualquer processo artificial que leve a um resultado diverso daquele que reflita a vontade popular não pode ser chamado de democracia.

Não é sem propósito que o Código Eleitoral, recepcionado pela Constituição Federal, dentre vários crimes que enumera, estabelece quanto ao processo eleitoral, no Artigo 297, que é crime impedir ou embaraçar o exercício do sufrágio. A mesma norma também criminaliza procedimentos tendentes a influenciar artificialmente o livre exercício do sufrágio.

As violações à Constituição e à Legislação Eleitoral se agravam na medida em que sejam ou possam vir a ser perpetradas exatamente por quem tem o dever de garantir a liberdade de escolha do cidadão.

É importante ressaltar que não estou me referindo aqui a manifestações pessoais de preferência por um ou por outro candidato que partem de autoridades constituídas. Isso porque essas pessoas, antes de serem investidas em cargos públicos, têm, enquanto cidadãs, os mesmos direitos das demais, ainda que as manifestações possam ser reprováveis pelo tom ou por, de alguma forma, violarem a liturgia do cargo.

O voto de presos provisórios e adolescentes internados é garantido pela Constituição Federal
O voto de presos provisórios e adolescentes internados é garantido pela Constituição Federal. Crédito: Antonio Augusto/Ascom/TSE

Eu me refiro, sim, àqueles atos institucionais que, ainda que travestidos de legalidade, desequilibram a disputa.

Ganha especial contorno quando um exercente de um poder, sem pudores e publicamente, admite que os atos emanados daquele poder influenciaram decisivamente o resultado em favor de determinado candidato, confissão que, para além do crime eleitoral, por sinal gravíssimo - em razão de atingir toda a coletividade, ainda implica crime de prevaricação.

É preciso que a sociedade compreenda que a democracia requer liberdade. No campo do direito eleitoral, para a formação da vontade popular, a liberdade não pode encontrar limites, obstáculos ou manipulações, sob pena de não estarmos autorizados a falar em democracia.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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