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É advogado, pós-Doutor em Direito Penal (Goethe Universität) e em Criminologia (Universität Hamburg), professor da FDV

Criminalização do cyberbullying: limites e eficácia da nova lei

Enquanto a intenção de proteger as vítimas é louvável, há desafios inerentes à tradução do cyberbullying em termos criminais, exigindo uma avaliação equilibrada entre liberdade de expressão, responsabilidade individual e eficácia legal

  • Raphael Boldt É advogado, pós-Doutor em Direito Penal (Goethe Universität) e em Criminologia (Universität Hamburg), professor da FDV
Publicado em 07/02/2024 às 16h26

A criminalização do cyberbullying tem sido objeto de debates intensos em diversos contextos legais. No Brasil, recentemente foi sancionada a Lei 14.811/2024, que criou o art. 146-A e incluiu bullying e cyberbullying no Código Penal, com pena de até quatro anos de reclusão e multa para quem cometer o crime por meio virtual.

Enquanto a intenção de proteger as vítimas é louvável, há desafios inerentes à tradução do cyberbullying em termos criminais, exigindo uma avaliação equilibrada entre liberdade de expressão, responsabilidade individual e eficácia legal.

Uma crítica central à criminalização do cyberbullying reside na definição precisa do termo que, por sua natureza, é subjetivo e pode variar amplamente em intensidade e impacto. Estabelecer critérios claros para distinguir entre comportamentos ofensivos e criminosos é uma tarefa complexa, o que levanta preocupações sobre a possibilidade de criminalizar a expressão legítima e a livre troca de ideias, resultando em potenciais violações da liberdade de expressão.

Além disso, a criminalização do cyberbullying pode ter implicações desproporcionais em relação a outros meios de lidar com esse fenômeno. A utilização do direito penal geralmente implica processos criminais demorados e custosos, enquanto alternativas como a mediação, a conscientização e a educação podem ser mais eficazes na prevenção e resolução de conflitos online. A abordagem punitiva pode negligenciar a oportunidade de promover a compreensão e a mudança de comportamento.

Outro ponto crítico é a dificuldade de atribuir responsabilidade em um ambiente virtual, evitando, assim, o mero simbolismo da lei penal. Muitas vezes, o anonimato online protege os agressores, tornando desafiador identificá-los e responsabilizá-los de maneira eficaz. A legislação precisa, portanto, equilibrar a responsabilidade individual com a necessidade de proteger a privacidade e a liberdade de expressão na internet.

Além disso, a criminalização pode desviar recursos legais de questões mais prementes, como investigações de crimes cibernéticos graves. Concentrar a atenção e os recursos na persecução penal do cyberbullying pode criar uma sobrecarga no sistema judicial, sem garantia de resultados significativos na prevenção dos fatos criminalizados.

Tecnologia; crianças; internet; segurança; cyberbullying
Tecnologia; crianças; internet; segurança; cyberbullying. Crédito: Freepik

Em resumo, enquanto a criminalização do cyberbullying busca proteger as vítimas e criar um ambiente online mais seguro, é fundamental reconhecer as suas limitações. Alternativas à persecução penal deveriam ser consideradas como substitutos da abordagem puramente punitiva, privilegiando-se, assim, a ideia de ultima ratio do direito penal.

Embora o Código Penal já tenha sido alterado, permanece a necessidade de uma análise cuidadosa dos impactos do novo tipo penal sobre a liberdade de expressão, a eficácia legal e a alocação de recursos para garantir que a resposta ao cyberbullying seja equilibrada e adequada.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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